Cartão corporativo de Bolsonaro teve gastos de R$ 27 milhões; custo em hospedagens lidera
Valores totais podem ser maiores, uma vez que um relatório do TCU apontou R$ 21 milhões com o cartão da Presidência apenas nos dois primeiros anos de mandato
Os valores gastos com o cartão corporativo da Presidência da República durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) vieram a público revelando ao menos R$ 27,6 milhões em despesas. Entre os gastos estão valores com hotéis de luxo a consumos pessoais com sorvetes e cosméticos.
As informações foram obtidas pela agência Fiquem Sabendo, especializada em dados públicos, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Um pedido solicitado em 18 de dezembro foi respondido na noite dessa quarta-feira (11), indicando um link em que constam os dados dos gastos do cartão corporativo de todos os presidentes da República desde 2003, início do primeiro mandato de Lula. Esse modelo de transparência não foi usado em gestões anteriores. Por exemplo, as despesas de Michel Temer só vieram a público a partir de um pedido feito via LAI.
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- Fornecimento de alimentação - R$ 5.511.790,53
- Gêneros de alimentação - R$ 4.783.581,22
- Serviços de apoio administrativo, técnico e operacional - R$ 1.538.381,15
- Locação de bens móveis de outra natureza e intangíveis - R$ 699.775,01
- Combustíveis e lubrificantes automotivos - R$ 668.824,56
- Material de limpeza e produtos de higienização - R$ 207.975,15
- Locação de imóveis - R$ 69.097,25
- Locação de máquinas e equipamentos - R$ 64.058,50
- Material de copa e cozinha - R$ 50.394,26
Conforme Luiz Fernando Toledo, um dos fundadores da agência Fiquem Sabendo, foram feitos mais de dez pedidos via LAI para ter acesso aos gastos do cartão corporativo da Presidência durante a gestão Bolsonaro - e todos foram negados usando o argumento de que revelar as despesas poderia colocar em risco o presidente e familiares.
Em todos os casos, a justificativa foi de que as informações seriam divulgadas depois do fim do mandato, baseado no inciso segundo do artigo 24 da LAI. O Estadão também tentou obter os dados sobre o cartão corporativo da Presidência e levou o caso à Justiça.
Os últimos lançamentos de notas fiscais datam de 19 de dezembro, referente à compra de comida. Se ocorreram gastos posteriores, pagos com cartão corporativo, ainda não constam no sistema. A reportagem da agência foi feita com base nos dados oficiais e em checagem de informações, como CNPJ e endereço, em bases públicas disponíveis na internet.
Hotéis de luxo
Ao todo, constam no sistema 22 CPFs de servidores responsáveis pelas compras, mas apenas dois concentram a metade das notas fiscais. Dos 59 tipos de despesas feitas com o cartão, os gastos com hotel foram os que mais consumiram recursos. Pelo menos R$ 13,6 milhões foram desembolsados em hospedagem: muitas vezes em locais de luxo.
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Na lista de endereços que receberam altas quantias está o Ferraretto Hotel, em Guarujá (SP), onde o agora ex-presidente costumava passar momentos de descanso. Ao longo dos quatro anos, o estabelecimento recebeu R$ 1,46 milhão. Consultas na internet mostram que as diárias variam de R$ 436 (em promoção) a R$ 940. Assim, considerando um valor médio de R$ 500, o montante seria suficiente para mais de 2,9 mil diárias.
Marmitas
As dez maiores notas fiscais de despesas no cartão corporativo são de hospedagem, variando entre R$ 115 mil e R$ 312 mil. Mas chama a atenção na lista de gastos expressivos a presença de um acanhado restaurante de Boa Vista, em Roraima.
Há uma nota de R$ 109 mil no Sabor de Casa, estabelecimento que fornece marmitas e também faz entregas. A nota fiscal é de 26 de outubro de 2021, quando Bolsonaro estava na cidade para verificar a situação de refugiados vindos da Venezuela. O mesmo local recebeu dois pagamentos - de R$ 28 mil e R$ 14 mil - em setembro do mesmo ano.
Também em panificadoras os gastos em vários estabelecimentos passavam de R$ 10 mil - quase oito salários mínimos de uma única vez. Por 20 vezes, ao longo do mandato de Bolsonaro, foram realizados gastos significativos em uma das filiais da padaria carioca Santa Marta. As notas fiscais variam de R$ 880 (menor valor) a R$ 55 mil (maior valor), com média de R$ 18 mil. Ao todo, o estabelecimento recebeu R$ 362 mil do cartão corporativo da Presidência. Um dos gastos - de R$ 33 mil - foi no dia 22 de maio de 2021, na véspera de uma motociata realizada no Rio de Janeiro.
Despesas com motociatas
A divulgação dos dados do cartão corporativo da Presidência deve jogar luz sobre as reais despesas com as motociatas. Por exemplo, entre os dias 9 e 10 de julho de 2021, Bolsonaro esteve na Serra Gaúcha e em Porto Alegre - onde foi seguido de moto por apoiadores. Nesses dois dias, foram gastos R$ 166 mil no cartão corporativo, em 46 despesas concentradas em hospedagem, alimentação e combustível.
Aparentemente, os gastos em viagens internacionais não estão na base de dados. É o caso das despesas entre 18 e 19 de setembro, em Londres, durante o funeral da Rainha Elizabeth.
Comparativo com outros governos
Ainda é cedo para dizer se os gastos de Bolsonaro com o cartão corporativo são maiores ou menores que os feitos pelos antecessores. Os dados agora divulgados apontam para R$ 27,6 milhões em despesas nos quatro anos, mas os valores totais podem ser maiores, uma vez que um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou R$ 21 milhões com o cartão da Presidência apenas nos dois primeiros anos de mandato de Bolsonaro.
Segundo a mesma base de dados publicada, no primeiro mandato, Lula gastou R$ 22 milhões - considerando os valores da época, sem correção inflacionária. Se o montante fora atualizado com base no IPCA, índice geralmente usado para aferir as oscilações de bens de consumo, os mesmos R$ 22 milhões somados ao fim de 2006 significariam hoje R$ 55 milhões. Os gastos de Lula no segundo mandato também somam R$ 22 milhões.
Já Dilma Rousseff, na primeira gestão, registrou R$ 24,5 milhões no cartão corporativo da Presidência. O período subsequente de quatro anos, dividido entre Dilma e Temer, totalizou R$ 18 milhões nesse tipo de gasto.
Gastos com cartão corporativo (corrigidos pela inflação):
Lula (1º governo) – R$ 59.075.679,77
Lula (2º governo) – R$ 47.943.615,34
Dilma(1º governo) – R$ 42.359.819,13
Dilma (2º governo) – R$ 10.212.647,25
Temer – R$ 15.270.257,50
Bolsonaro – R$ 32.659.369,02