O presidente Jair Bolsonaro (PL) chega ao Ceará nesta quarta-feira (23) para inauguração de central de abastecimento de água em Quixadá. Essa é a segunda vez que o mandatário desembarca no Estado apenas em 2022 - esta será a sexta visita ao Ceará desde que o presidente tomou posse.
Com a disputa estadual ganhando contornos mais definidos e com o fortalecimento da oposição no Ceará, especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste apontam que podem haver ganhos para a candidatura de Bolsonaro, diante de um cenário eleitoral desafiante para o mandatário no Estado.
O presidente irá participar, em Quixadá, da cerimônia de lançamento do programa "Força Tarefa das Águas", a partir das 15 horas, na Praça José Linhares da Páscoa, no centro da Cidade.
Na ocasião, haverá a inauguração de central de abastecimento no município, construída com recursos da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). A unidade deve servir de projeto-piloto para o programa, que será ampliado para os outros estados nordestinos e para Minas Gerais.
Oposição no Estado
O presidente chega ao Ceará em um cenário de fortalecimento da oposição. Na terça-feira (22), a Justiça Eleitoral oficializou a presidência do União Brasil com o deputado federal licenciado e pré-candidato ao Governo, Capitão Wagner. Com o partido, a oposição desenha o melhor cenário de disputa eleitoral em 15 anos no Estado.
O foco em reunir, no entanto, uma ampla base na oposição já fez Wagner dar declarações de que o palanque cearense pode não ser exclusivo do presidente.
"Nosso palanque é amplo de oposição, cortando o Estado do Ceará. Todo apoio que vier, à nível nacional, será bem-vindo. Havia uma dúvida de que 'o Capitão vai estar com o candidato A, com Moro, com Bolsonaro'. À nível estadual, nosso palanque vai permitir, por exemplo, se o MDB vier, que peça voto para o candidato deles à presidência; se o Podemos, já confirmado que vai pedir voto para Moro, vai pedir tranquilamente; se o PL for pedir voto para Bolsonaro, será muito bem recebido. Não teremos radicalismo para dizer que o candidato do bloco é Y", disse Wagner, durante evento do União Brasil.
O apoio do PL a Wagner no Ceará ainda não está definido. O partido avalia lançar chapa própria no Estado.
O deputado, contudo, têm sido presença constante nas agendas do presidente no Estado e deve estar em Quixadá nesta quarta-feira. "É importante que a gente esteja presente em toda e qualquer circunstância em que o Governo Federal traz um benefício para o nosso Estado, não só pra agradecer, mas pra tentar, junto com os ministros que acompanham essa visita, novos benefícios", disse o pré-candidato ontem, em evento na Assembleia Legislativa.
Na última visita ao Ceará, em fevereiro de 2022, Wagner chegou a fazer o discurso de abertura do evento. Em outra ocasião, ele recebeu o apoio do presidente à pré-candidatura ao Palácio da Abolição. “Eu não acho, eu tenho certeza. Assim como o Brasil tem um capitão, o Ceará terá brevemente um capitão também”, disse durante entrega de casas do Programa Verde e Amarelo em Juazeiro do Norte, em agosto de 2021.
A cientista política Carla Michele Quaresma aponta que a postura "dúbia" de Capitão Wagner quanto ao apoio a Bolsonaro deve continuar durante toda a campanha eleitoral.
"Wagner transita pelo eleitorado de vários partidos. Ele conseguiu ter voto, na disputa do segundo turno da Prefeitura (de Fortaleza) de pessoas que estariam propensos a votar na Luizianne (Lins). Ele tem essa capacidade de transitar por diversos perfis de eleitorado. O apoio (a Bolsonaro) poderia comprometer isso".
Um eventual apoio de Wagner a Bolsonaro seria mais benéfico ao presidente, que contaria com apoio da principal liderança de oposição no Estado, completa Quaresma. "O posicionamento do Capitão Wagner acaba sendo sempre dúbio. É um apoio em algumas circunstância e desde que não atrapalhe outras alianças que ele tem", afirma.
Lideranças bolsonaristas
Apesar disso, o professor da Universidade Estadual do Ceará, Emanuel Freitas, lembra que o palanque de Capitão Wagner "é bolsonarista".
"Grandes nomes do bolsonarismo no Ceará estão com Wagner, os partidos da base do presidente estão com Wagner, exceto o PL. Por mais que, suponhamos, ele tenha uma postura bolsonarista mais tranquila, faz com que a campanha dele seja a do Bolsonaro no Estado".
O fato de deputados estaduais e federais, além de pré-candidatos bolsonaristas, que devem estar presentes na agenda de Bolsonaro em Quixadá, serem apoiadores do Capitão Wagner para a disputa acaba por fortalecer a ligação entre os dois nomes.
"O Capitão Wagner não manifesta claramente o apoio, mas certamente é um fortalecimento dessa relação que só tende a fortalecer o presidente, porque ele cria essa marca forte. Há uma tentativa de fortalecimento dessa relação, porque isso é muito bom para o presidente Bolsonaro", completa Carla Michele.
Apoio nos estados nordestinos
A estratégia é comum a outros estados nordestinos. Única região em que perdeu nas eleições de 2018, Bolsonaro continua com índices altos de rejeição no Nordeste. As disputas estaduais são um dos caminhos do presidente para tentar reverter a situação.
Assim como no Ceará, outros estados da região devem ter eleições acirradas para os respectivos governos estaduais. "Estados importantes governados pela esquerda vão passar por eleições mais competitivas. Podemos citar o Ceará, a Bahia, o Maranhão e o Piauí", afirma Emanuel Freitas.
Nestes casos, o governador em exercício está no segundo mandato e a oposição tem se fortalecido para o pleito de outubro. Na Bahia, por exemplo, o vice-governador João Leão (PP) rompeu com o PT e deve apoiar a candidatura do ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (União Brasil), para o governo estadual.
"Com as mudanças de ciclos estaduais, pode ser o momento de reverter a rejeição com a ligação a esses candidatos que podem derrotar quem está no poder".
Resultado das medidas federais
No Ceará, no entanto, o cenário é mais difícil para Bolsonaro. Além dos ex-presidente Lula - que lidera as pesquisas de intenção de voto nos outros estados nordestinos -, a candidatura do ex-ministro Ciro Gomes também tem muita força no estado. Contudo, Freitas aponta que a nova visita de Bolsonaro vem em um contexto em que o Ceará "começa a colher os frutos de uma série de ações do governo federal na economia".
Ele cita como exemplo o Auxílio Brasil, criado no final de 2021. "O Ceará é um dos estados mais dependentes deste tipo de benefício", afirma. Ainda é previsto 'pacote de bondades' na economia, como programa de crédito para pequenas e médias empresas.
Além disso, a vinda dele ao estado será para a cerimônia de lançamento da "Força Tarefa das Águas", programa de abastecimento de água que deve ser estendido para toda a região Nordeste, além do norte de Minas Gerais.
Demanda histórica da região, as agendas do presidente no Nordeste costumam estar ligadas à questão hídrica - das seis visitas ao Ceará, quatro tiveram essa pauta. "Ele vai poder discursar em cima dessas ações", completa Freitas.
Candidaturas de ministros
A presença constante também serve para fortalecer a imagem do mandatário na região.
"O governante precisa ter essa demonstração de que está próximo do povo, que entende as necessidades da população. Principalmente nesses territórios que há dificuldade de encontrar base de apoio, a presença do governante é essencial. É uma estratégia comum".
A estratégia eleitoral engloba, inclusive, outros integrantes do governo federal. Dos dez ministros que deixam, neste mês, o governo federal para tentar vaga nas eleições em outubro, quatro devem tentar candidaturas em estados nordestinos.
O ministro da Cidadania, João Roma (Republicanos), disputará o Governo da Bahia, enquanto o ministro do Turismo, Gilson Machado (PSC), tentará cadeira no Senado por Pernambuco. No Rio Grande do Norte, os ministros do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho (PL), e da Comunicação, Fábio Faria (PSD), ainda devem decidir qual tentará Senado e qual tentará o governo estadual.
Alguns deles, como Rogério Marinho, costumam estar presentes nas agendas de Bolsonaro nos estados da região.
“É fundamental (essa presença), porque a qualidade do governo está muito ancorada na qualidade das pessoas que circundam o presidente. Por exemplo, mesmo quem tem rejeição ao presidente Bolsonaro, concorda que houve avanços importantes na transposição. Trazer esses ministros para o palanque no momento da visita, garante o fortalecimento da imagem do governo”.