É possível que, nos últimos dias, você tenha lido e/ou ouvido os seguintes destaques: “Roberto Cláudio critica Elmano por caso Guararapes e atiça oposição da ala do PDT no Ceará” ou “Capitão Wagner assume Secretaria da Saúde de Maracanaú”. É a volta ao noticiário dos ex-candidatos ao Governo do Ceará, após derrota na inesperada disputa de 2022, com as respectivas nuances dos planos que preparam para 2023.
A derrota de 2022 não foi apenas eleitoral, foi política, considerando um sentido mais profundo da palavra, para além do número de votos. Capitão Wagner chegou à disputa com conquistas importantes: a presidência do União Brasil – partido grande e com recursos, o apoio do então presidente da República, Jair Bolsonaro, a aliança com partido e lideranças políticas tradicionais no Estado, como o PL, de Acilon Gonçalves; e o primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto. Foi suficiente? Não. Nem mesmo para levar a disputa para o 2° turno.
Roberto Cláudio deixou a Prefeitura de Fortaleza em 2020 como amplo favorito para a sucessão de Camilo Santana (PT), bem avaliado nas gestões no Executivo, com o apoio do prefeito da Capital, José Sarto (PDT), com uma ampla base de vereadores no maior colégio eleitoral e com uma aliança com um então presidenciável, Ciro Gomes (PDT). Foi suficiente? Também não. Nem mesmo para se manter em segundo lugar durante o primeiro turno.
Ambos começam 2023 sem um mandato eletivo, o que dificulta a presença em espaços de voz e de poder. Roberto Cláudio teve mandato por 14 anos, desde 2006 até deixar o Executivo municipal, em 2020. Wagner, desde que se elegeu vereador de Fortaleza, em 2012, ocupou sucessivamente novas vagas no Legislativo a cada dois anos.
O que está em jogo é a bagagem política acumulada até aqui. Capitão Wagner já lidou com outras derrotas. Roberto Cláudio, não. As estratégias que ambos indicam apostar para virar o jogo fogem completamente da atuação que exerceram até agora.
Vamos a elas:
Capitão Wagner secretário da Saúde de Maracanaú
Dá para dizer: por essa ninguém esperava. O policial militar da reserva, professor, ex-vereador de Fortaleza, ex-deputado estadual e recém-ex-deputado federal foi oficializado, na quarta-feira (1º), como secretário da Saúde do município com a quarta maior população do Estado, Maracanaú.
Para Wagner, a nova função é parte do seu plano de assumir o Poder Executivo um dia, seja numa prefeitura, seja no Governo do Estado, e não esconde que busca experiência na área.
"A gente tem a referência de um tripé na gestão pública: saúde, segurança e educação. Tive uma experiência muito bacana na Segurança, e na sala de aula, como professor. Faltava essa experiência na Saúde. Então o convite do prefeito Roberto Pessoa caiu como uma luva”
No dia em que me concedeu essa entrevista, Wagner estava em Brasília, tinha saído havia pouco de uma reunião na Secretaria Nacional de Atenção Básica do Ministério da Saúde, onde, segundo ele, foi buscar recursos para os projetos traçados para a nova missão. Os planos, especialmente se considerarmos de que falamos da Saúde, não são simples.
“Minha principal meta é melhorar os indicadores do Município. Estamos passando por um processo de informatização da saúde. Vamos melhorar os serviços prestados, já temos a programação de um concurso para agente comunitário de saúde e agente de endemias. A gente vai ampliar a saúde bucal, reformar os postos de saúde, ampliar atendimento no Caps...”, pontua Wagner.
Se bem sucedido na missão, ele reforça o discurso político em área sensível para a população. Desde que entrou na política, impulsionado pela atuação no motim da polícia de 2011/2012, um dos desafios de Capitão Wagner é se descolar, em partes, da temática da segurança.
Em paralelo, ele se cerca de outras estratégias políticas que mantenham viva a articulação partidária e a presença em espaços de decisão política. Em 2022, o União Brasil elegeu quatro deputados federais e quatro estaduais – um número que dá ao partido certo poder de barganha nas relações de poder.
Capitão Wagner seguirá à frente do partido e terá como braço de articulação a esposa, a deputada federal Dayany do Capitão. “Ela vai ampliar o mandato dela. Sem dúvida, vai me ajudar na condução e aproximação com o partido em Brasília”, ressalta.
Agora é dar tempo ao desenrolar das estratégias para ver quais expectativas se efetivarão. Ter trabalho positivo para mostrar na saúde é um sonho para muito político. Não há dúvida, no entanto, de que gerir a área é como andar no fio de uma navalha.
Nesse ponto, a situação de Roberto Cláudio não é muito diferente...
Roberto Cláudio na oposição ao Governo
Nesse caso, dá para dizer: é uma decisão que não surpreende. A tirar pela postura da ala do PDT ligada a Roberto Cláudio a partir segundo semestre de 2022, era de se esperar que os desgastes com o PT seriam difíceis de serem superados.
Após ficar em terceiro lugar na disputa pelo Governo, enfrentando crise com ex-aliados, como os ex-governadores Camilo Santana (PT) e Cid Gomes (PDT), o ex-prefeito de Fortaleza passou meses reclusos. A primeira entrevista após o período eleitoral foi durante as reuniões do PDT, em dezembro, para definir ao apoio à gestão petista.
Já ali, Roberto Cláudio defendia uma “oposição construtiva” do PDT a Elmano, “por coerência”. A posição do presidente municipal da sigla pouco ecoou nas tratativas estaduais. Há pedetistas ocupando cargos no governo, na liderança do petista na Assembleia e na base aliada do Legislativo.
Pouco mais de um mês depois, o ex-candidato decidiu levar a perspectiva da oposição da teoria para a prática. Nas redes sociais, acusou o Governo Elmano de "conformismo” e “apatia” no caso do fechamento da fábrica da Guararapes, que resultou na demissão de duas mil pessoas. O governador respondeu, dizendo que se preocuparia pouco com o debate político e mais com as ações da gestão sobre o caso. Foi o primeiro ataque.
Roberto Cláudio desde 2006, vivia na política uma situação favorável: foi eleito deputado estadual defendendo a campanha de Cid Gomes ao Governo, foi líder de Cid na Assembleia, presidente da Casa e duas vezes prefeito de Fortaleza. “Essa é uma tarefa nova”, reforça Roberto Cláudio sobre atuar na oposição.
“O papel de quem se apresenta para uma disputa política e não ganha é de exercer o papel que a democracia impôs: fazer uma oposição construtiva, que possa ora criticar eventualmente os erros e se posicionar nesse exercício de simbiose entre governo e oposição. É bom para a democracia. As democracias que têm longevidade se fizeram com bons governos e boas oposições. É o que vou fazer”
Lidando ainda com a crise interna do PDT, Roberto Cláudio tem ciência das dificuldades que é exercer a oposição fora de um mandato. A aposta para driblar é “construir uma relação próxima com a sociedade civil organizada, com as universidades, com o setor produtivo, os movimentos sociais, e tentar representar esse pensamento (de oposição) quando eventualmente existir alguma frustração”.
E as eleições de 2024?
Ultimamente, é possível que você tenha visto outras duas declarações: “Capitão Wagner quer disputar Prefeitura de Fortaleza em 2024: 'ganhamos em 2022 na Capital'” ou “Roberto Cláudio descarta candidatura em 2024 e defende gestão Sarto”.
Ambos já disputaram a Prefeitura de Fortaleza em mais de uma ocasião e foram adversários em 2016. Com que força chegarão ao cenário político de 2024 é uma grande incógnita, mas, seja ser candidato novamente, seja garantir a reeleição do atual prefeito, as expectativas são ambiciosas, principalmente com o fortalecimento político entorno do PT no Estado – que não pode ficar de fora dos cálculos.
Uma coisa é certa: é preciso se arriscar. As últimas eleições mexeram com o equilíbrio de forças política no Estado, foram um divisor de águas, e quem quiser nadar contra a corrente vai precisar adotar estratégias fortes o suficiente para enfrentar o fluxo.