Falhas escancaradas no combate à pandemia: e agora?

Nenhuma agonia é apenas individual numa pandemia. Não há agonia distante. A angústia, o desespero, as perdas diante do colapso que tomou o sistema de saúde de Manaus, capital do Amazonas, nos últimos dias, escancara erros. Falhamos como sociedade quando impera o egoísmo, o negacionismo, a indiferença, porque a falta de cuidado consigo é falta de cuidado também com o outro; falha ainda mais o Governo, em distintos níveis.

Ouvir do vice-presidente da República, Hamilton Mourão, que não era possível prever o que aconteceria em solo amazonense é inadmissível. Os alertas, por parte de cientistas e outras autoridades sanitárias, foram constantes. O Ministério da Saúde foi avisado dias antes da iminente falta de oxigênio em unidades de saúde. 

Foi preciso o pior acontecer para surgirem notas, declarações de políticos, ações emergenciais. É triste, mas surpresa não foi. O vice-presidente também sustentou que, em âmbitos municipal e estadual, os gestores “deveriam ter tomado as medidas necessárias no tempo certo” quanto à conscientização da população sobre a pandemia. Faltou exigir o mesmo do Governo Federal. Que mensagem dá um presidente que minimiza recorrentemente a gravidade da Covid-19 em palavras e ações? 

A previsão de início da vacinação para esta semana, caso se confirme hoje a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para uso emergencial de pelo menos uma das duas vacinas sob análise, é um alívio, claro, mas não põe fim à crise. A nova cepa do novo coronavírus, apontada por especialistas como responsável pela explosão de casos em Manaus, preocupa pelo que tem causado na capital do Amazonas, mas também pelo risco de se espalhar pelo País. 

A cobrança por uma coordenação mais eficaz de ações por parte do Governo Federal, em conjunto com estados e municípios, é recorrente desde que a Covid-19 chegou ao Brasil, mas faltam ainda demonstrações concretas de disposição para isso. É urgente assumir a dianteira do enfrentamento da pandemia. Qualquer outra demora nas respostas pode custar ainda mais vidas.

Legislativo

O Congresso Nacional também precisa se posicionar de forma mais contundente frente à questão. Até a situação no Amazonas ganhar repercussão nacional pela gravidade, o debate sobre a pandemia estava claramente em segundo plano entre membros do Legislativo e a convocação extraordinária dos congressistas não parecia uma possibilidade real a ser colocada à mesa pelos políticos. A crise sanitária, agravada em plena campanha pelas presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, se impõe. 

Trabalho

Enquanto o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), aguarda resposta do pedido feito ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para a convocação da Comissão Representativa do Congresso Nacional, que reúne deputados e senadores durante o congresso para exercer atribuições urgentes do Congresso, parlamentares cearenses fazem coro a pedido do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) para que o Legislativo Federal seja convocado extraordinariamente para voltar aos trabalhos. Coordenador da bancada do Ceará, Eduardo Bismarck (PDT) é um dos apoiadores do pleito. Nas redes sociais, ele foi categórico: “Nada justifica a total desídia do Parlamento”. De fato, não há justificativa.

Enem

Em meio a tudo isso, parlamentares cearenses também devem estar atentos, hoje, ao primeiro dia de aplicação das provas do Enem. O adiamento do Exame chegou a ser solicitado pelos deputados estaduais da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa, pelo mandato coletivo Nossa Cara, da Câmara Municipal de Fortaleza, mas, mesmo assim, milhares de estudantes vão às salas de aula no Ceará. 

Fiscalização

O cumprimento das normas sanitárias, por parte de quem está envolvido no Exame, é fundamental. Era pouco provável que as pressões políticas locais surtissem o efeito pretendido diante do que vinha sinalizando o Ministério da Educação, mas é preciso que elas continuem existindo como forma de vigilância, inclusive porque, até a segunda etapa do Enem, riscos de disseminação da doença podem exigir a adoção de outras medidas.

*Equipe de Política redigiu a coluna.



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