A decisão da Justiça que suspendeu a taxa do lixo em Fortaleza tem caráter liminar. Ou seja, ainda precisa ter o mérito do pedido julgado pelos desembargadores do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) em decisão colegiada, o que ainda não tem data definida.
Enquanto isso, vale a medida cautelar do desembargador Durval Aires Filho relativa à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE). Mas ainda há outras ações em curso.
Ou seja, a Lei Municipal nº 11.323/2022, que estabelece a Taxa do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos de Fortaleza (TMRSU) não está valendo.
Entretanto, muitos fortalezenses já pagaram a taxa no fim de abril, a fim de garantirem um desconto de 10%, e outros que optaram pelo parcelamento pagaram a primeira parcela. Para estes, só resta esperar.
Pedido de restituição
A liminar não tratou de uma eventual devolução do dinheiro. Então, é preciso aguardar uma nova manifestação da Justiça sobre o caso.
Segundo especialistas ouvidos pela coluna, se a decisão desta segunda-feira (22) for mantida pelo órgão especial do TJCE, quem pagou vai precisar entrar administrativamente com um pedido de restituição na Secretaria de Finanças do Município (Sefin).
Contudo, mesmo que a suspensão seja mantida e a lei declarada inconstitucional, é preciso saber ainda se os desembargadores irão estabelecer algum critério de modulação como, por exemplo, manter os pagamentos já efetuados.
É preciso pagar a segunda parcela?
Desde a noite da segunda-feira, a página do site da Sefin relativa à TMRSU está fora do ar. De qualquer forma, mesmo que o contribuinte receba o boleto referente à segunda parcela, não há a necessidade de pagá-lo até que nova decisão sobre o assunto.
Também não é razoável supor que, caso a cobrança volte a valer após o vencimento previsto (próximo dia 28), seja cobrada alguma multa ou juros. A prefeitura já afirmou que devolverá os valores já pagos caso a lei seja definitivamente anulada.
Inconstitucionalidade
A ADI do MPCE foi protocolada pelo procurador-geral de Justiça (PGJ), Manuel Pinheiro, em 27 de abril, um dia antes do vencimento da taxa. A ação pede a suspensão imediata da Taxa do Lixo e a declaração de inconstitucionalidade do inteiro teor da lei em questão.
No caso, o MPCE alega que o dispositivo municipal viola os artigos 20, 154 e 191 (inciso II e §1º) da Constituição do Estado do Ceará.
Além disso, o órgão afirma que a lei da taxa do lixo fere o princípio da “referibilidade”, no qual o tributo é deve ser diretamente relacionado com o contribuinte.
Ou seja, a taxa deve ter seu valor calculado numa relação direta com o que o contribuinte produz, o que não é atendido pelos critérios estabelecidos na lei, conforme entendimento do MPCE aceito na liminar
A norma também deveria, ainda conforme o Ministério Público, indicar um referencial concreto de base de cálculo, para que o contribuinte pudesse mensurar o valor do tributo.
A decisão ainda intimou o Município de Fortaleza e a Câmara Municipal para ciência e cumprimento da decisão, bem como para fornecer informações à Justiça Estadual, no prazo máximo de 10 dias. Após este prazo, o procurador-geral de Justiça e procurador geral do Estado terão prazo de cinco dias para manifestação.
Resposta da Prefeitura de Fortaleza
Procurada, a Prefeitura de Fortaleza reforçou o caráter liminar da decisão, que “ainda será submetida ao colegiado do TJCE”.
“A Prefeitura Municipal de Fortaleza ressalta que a Taxa do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (TMRSU) atende à lei federal 14.026/2020 do Marco Legal do Saneamento Básico e já é cobrada em 23 capitais brasileiras”, respondeu em nota.
A gestão municipal ainda reforçou que "a lei prevê a isenção de até 70% dos contribuintes” e que “todo trâmite do processo legislativo para a aprovação e implantação da taxa foi rigorosamente observado pela Câmara Municipal e pelo Executivo”.
STF já decidiu por validade da taxa de lixo
Apesar de reconhecida a possibilidade de o Poder Público instituir taxas, o que já foi referendado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nas súmulas vinculantes nº 19 e n.º 29, o desembargador Durval Aires Filho afirmou quer era necessário caracterizar a referibilidade para que o tributo tenha validade.
De acordo com o magistrado, "não poderá haver taxa de serviço sem usuários certos, sobre quem se possa considerar serviços divisíveis. É uma questão de aritmética: serviços individualizados para ser contados, somados, contabilizados, permitindo que se identifique e que se avalie de forma isolada, afastado do complexo da atividade municipal, à parcela utilizada pessoalmente, assim, separados os custos da prestação para ser divididos com os contribuintes".
Serviços públicos e critério de isenção
Dentre os argumentos do PGJ citatos pelo desembargador para alegar a inconstitucionalidade estão o valor do contrato de coleta de lixo vigente, que é cerca de metade do informado pela lei; a realização de serviços públicos como capinagem e limpeza de canais; e ausência do prazo legal de 90 dias para a que a norma passasse a valer.
Outro ponto levantado contra a referibilidade, são as isenções "sem critério objetivo", o que leva, segundo o desembargador, a "incongruências constitucionais, como taxar escolas da rede pública e isentar, por exemplo, a Câmara Municipal".