Especialista em energia, consultor de empresas, sócio e diretor da Cactus Energia Verde, que tem projeto para a produção de Hidrogênio Verde no Complexo do Pecém, o engenheiro José Carlos Braga chama a atenção para a existência de um poderoso lobby que trabalha em Brasília com o objetivo de retardar a regulação do H2V e da geração de energia eólica offshore (dentro do mar).
Esta coluna ouviu-o ontem sobre o assunto e, do muito que ele falou, elaborou o seguinte resumo, com base em suas palavras:
“A propósito do grande interesse das empresas petroleiras em projetos alinhados ao carbono neutro e, também, como offtakers do H2V/Amônia, conclui-se, inapelavelmente, que os combustíveis fósseis serão os grandes financiadores e alavancadores da transição energética. Serão os seus donos que determinarão a velocidade dessa transição, na medida em que também se beneficiem proporcionalmente da nova matriz.
“Em outras palavras: o poder dos petrodólares continuará dando as cartas, de fato, por muitos anos, ainda!
“Tudo isto tem influenciado os lobbies no Congresso Nacional, notadamente os vindos de ‘fogo amigo’, notadamente da turma do gás, fantasiados de ‘cordeirinhos progressistas’, mas retardando a liberação das regulamentações necessárias ao destravamento dos processos do H2V, das eólicas offshore e dos créditos de carbono, sugerindo esperar pela ordem dos mandatários.
“Do ponto de vista do interesse cearense, a bem da verdade, o governador Elmano de Freitas tem trabalhado bastante, ao lado de outros líderes do Nordeste Setentrional, pela regulação do H2V e da energia offshore. Sabe-se, porém, que a balança econômica pesa muito da Bahia para baixo, e pesou bastante no encerramento deste ano de 2023: a regulação, por enquanto, não saiu do papel.
“Sendo assim, temo que aquela euforia ainda latente de transmutação da terra cearense para um sítio próspero e abundante possa minguar paulatinamente, caso a fila pela regulação continue a mover-se a passos de tartaruga.
“É fato que o Complexo do Pecém e a ZPE-Ceará continuam trabalhando para que em 2027/2028 o H2V/Amônia inicie seu trânsito rumo a Roterdã, por meio de navios acima de 50 toneladas, movidos também a amônia, assim como a infraestrutura portuária (amôniodutos, tancagem, subestações, berços etc) e tudo sendo devidamente providenciado.
“A água de reuso da Cagece a ser consumida pelas primeiras plantas eletroquímicas também está na pauta da evolução, caracterizando a iniciativa cearense ainda em cotação prioritária.
“Por definição, o ponto de equilíbrio (ou em inglês Break-Even Point – BEP) na economia e nos negócios é aquele em que o custo total e a receita total são iguais, ou seja, uniformes. Não há perda ou ganho líquido, e o equilíbrio se dará entre os combustíveis fósseis e verdes mais cedo do que preconizam as estimativas petrolíferas. Em no máximo dez anos, creiam.
“A partir daí, o H2V inverterá a curva para lucros e superará geometricamente os fósseis, beneficiando quem tiver estoques verdes em abundância porque estes darão as cartas novamente.
“Reflexão final: como conseguir assento geopolítico nesse banquete, com voz e vez para também usufruir das benesses e dos subprodutos industriais desse grande cartel que se está formando à nossa frente, beneficiando-se dos nossos sóis, ventos e águas, assim como sempre o fizeram com os nossos minérios, com o nosso café, com a nossa cana-de-açúcar, com a nossa soja, com a nossa agropecuária, com a nossa biomassa, e até com o nosso óleo bruto? Reagiremos ou permaneceremos eternamente deitados neste berço esplêndido?”
É inexplicável o fato de o Congresso Nacional ainda não ter votado a proposta de regulamentação da atividade de produção do Hidrogênio Verde nem a da geração de energia dentro do mar. A provável descoberta de petróleo na chamada Margem Equatorial, que se estende de Roraima até o Rio Grande do Norte, está atiçando o interesse da Petrobras, mas jogando para escanteio – ou, no máximo, retardando – o sonho de o Brasil, usando as energias renováveis, tornar-se um player mundial na produção do Hidrogênio Verde.