Hidrogênio Verde: veja 4 entraves que persistem após a regulamentação no Brasil

O marco legal do Hidrogênio Verde (H₂V) é considerado um passo à frente para descarbonizar a economia brasileira, mas ainda há, pelo menos, quatro desafios postos. São eles: aprimorar a certificação, fixar critérios dos benefícios fiscais, articular uma governança compartilhada e estabelecer o percentual de matéria-prima local na produção desse combustível. 

A listagem parte da análise da economista e advogada Maria João Rolim, que participou diretamente da elaboração do conjunto de leis.

“A regulamentação é um grande avanço para fazer essa nova indústria sair do papel, mas ainda há esses pontos importantes a serem regulamentados”, ponderou em entrevista à coluna, durante o Proenergia Summit 2024, na manhã desta quinta-feira (12), em Fortaleza. 
Maria João Rolim
Economista e advogada

O projeto que institui o marco legal do H₂V foi sancionado pelo presidente Lula (PT) em agosto deste ano, no Complexo do Porto do Pecém, na Região Metropolitana de Fortaleza. A escolha do lugar não foi à toa: o Ceará saiu na frente na corrida pela produção desse combustível, com o maior número de projetos no Brasil. 

"O hidrogênio não é a solução para tudo, mas faltava para a descarbonização porque nossa matriz elétrica é limpa, mas a energética não é. Tem a área do transporte, o uso da terra e fertilizantes, por exemplo. Tudo isso precisava de algo para descarbonizar, e o hidrogênio é essa peça", avaliou Rolim. 

Entenda antes de seguir a leitura

O que é o Hidrogênio Verde?

O Hidrogênio Verde (H₂V) é um gás já usado como fonte de energia para transportes e para a indústria. As duas formas mais consumidas desse elemento químico são a marrom (gerado por carvão) e a cinza (gerado por metano). Ambas são extremamente poluentes e vão de encontro à descarbonização da economia. Já a terceira é o H₂V, produzido a partir de fontes renováveis. A geração via energia eólica, solar ou de biomassa garante um processo limpo e sustentável para reduzir as emissões de gás carbônico de diversos setores econômicos que utilizam a substância. Diferenciando-se dos demais, portanto, por não utilizar combustíveis fósseis (não renováveis) na sua produção. Por esse motivo, o hidrogênio verde é considerado a “energia do futuro”, atraindo os olhares de diversos mercados, sobretudo, o externo.

O que é descarbonização?

Descarbonização é o esforço de mitigar as mudanças climáticas provocadas pela emissão de gases do efeito estufa (GEE).

Qual a diferença entre matriz energética e matriz elétrica?

A matriz energética são todos os recursos energéticos para atender à demanda de todas as energias, incluindo todos os combustíveis e tipos de fontes de energia. Já a matriz elétrica concentra todas as fontes apenas para produzir energia elétrica, como a hídrica, solar, eólica, biomassa e fontes não renováveis (gás natural, petróleo e carvão mineral).

Abaixo, entenda cada ponto dos quatro desafios. 

Aprimorar certificação para exportação 

O texto do marco legal já prevê a certificação. O documento vai assegurar, por meio de uma autoridade competente, que todo o processo produtivo atendeu às exigências para caracterizar um hidrogênio totalmente verde ou de baixo carbono. 

Segundo Rolim, contudo, a certificação precisa respeitar a matriz do Brasil, mas precisa ter operabilidade com a Europa em razão da exportação. Pontos sobre todos os critérios para a certificação ainda não foram definidos.  

Condicionantes para os benefícios fiscais 

A redação também prevê créditos fiscais (compensação de impostos pagos) aos investidores. Os valores são de até R$ 1,7 bilhões em 2028, R$ 2,9 bilhões em 2029, R$ 4,2 bilhões em 2030, R$ 4,5 bilhões em 2031 e R$ 5 bilhões em 2032, totalizando R$ 18,3 bilhões de benefícios fiscais em cinco anos. 

Para Rolim, ainda falta desenvolver condicionantes para quais projetos terão prioridades, como aqueles estruturantes para alavancar a indústria no Brasil. Conforme a economista, a Reforma Tributária não será problema porque é compatível com esses benefícios fiscais. 

Governança compartilhada

A legislação já prevê governança para a certificação, sendo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) responsável por regular o mercado do hidrogênio com interação com as agências Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e de Águas (Ana). 

Nesse contexto, aponta Rolim, todos os órgãos precisarão estar alinhados. “Nada pior para o investidor do que ficar perdido no meio de muita gente”, diz, frisando a importância de uma governança.

Ela pondera, todavia, que o Ministério de Minas e Energia já tem articulado com outras pastas para alinhar esse ponto. 

Determinar percentual da indústria local

Outro desafio para a especialista é garantir que toda a cadeia à produção do Hidrogênio Verde já seja do Brasil. “Precisamos desse ponto, mas como é uma indústria imatura, ainda não temos muito conteúdo local. Hoje, o eletrolisador é importado”, exemplifica.

Por isso, acrescenta, esse é um ponto sensível e deve ser avaliado um percentual gradativo para o cumprimento desse objetivo no Brasil. 

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4 pontos que você precisa saber

O que é ESG?

ESG é a sigla, em inglês, para Ambiental, Social e Governança (Environmental, Social and Governance). O conjunto de práticas visa reduzir os impactos ambientais provocados pelas empresas e desenvolver um sistema econômico justo e transparente. Por isso, pode contribuir para a descarbonização da economia, termo usado para a redução da emissão de dióxido de carbono (CO₂), principal gás responsável pelo efeito estufa. ESG surgiu em um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2004, e também está atrelado aos Objetivos de Desenvolvimento da ONU.

Por que o ESG é importante para o consumidor?

O ESG é importante para toda a sociedade, considerando que o País é marcado por assimetrias socioeconômicas, herança do período colonial, escravista e de uma cultura patriarcal. Por isso, pode promover mudanças de equidade no mercado de trabalho, além de reduzir os impactos ambientais dos negócios, sobretudo em um contexto de crise climática. Compreender a importância da agenda ESG ajuda a tomar decisões de consumo baseadas em práticas ambientais e sociais, pressionando os negócios a se adequarem.

O que é a Agenda 2030?

A Agenda 2030 é um compromisso global firmado pelos 193 Estados-membro da ONU, com o objetivo de gerar desenvolvimento sustentável nas dimensões econômica, social e ambiental, considerando as prioridades de países e localidades. Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são parte da Agenda 2030

O que é o Acordo de Paris?

O Acordo de Paris é um pacto internacional voltado para conter o aquecimento global, aprovado como lei doméstica por 194 países e pela União Europeia, em 2015. Pelo tratado, a meta era manter o aquecimento abaixo de 2ºC e, na medida do possível, 1,5ºC.