Quais os impactos do incêndio no Parque do Cocó a animais, à vegetação e à população de Fortaleza

Biólogos apontam que efeitos ambientais ainda são “incalculáveis”, e que foco agora é impedir avanço da devastação

A queimada de hectares de floresta do Parque Estadual do Cocó, em Fortaleza, desde essa quarta-feira (17), tem angustiado a população e preocupado pesquisadores: os efeitos vão além da fumaça que invade a cidade. Mas, afinal, quais os possíveis impactos ambientais do maior incêndio recente que já atingiu o Cocó?

O biólogo Bruno Guilhon, pesquisador da fauna do parque, afirma que, “no momento, é difícil mensurar as perdas de animais e plantas” – mas que o cenário da vida animal no Cocó, “já bem impactada pela fragmentação ecológica, que ocorre pelo corte de várias avenidas”, deve ser agravado.

Durante o percurso de fuga do animal, ele se cansa, desidrata, queima o corpo. A fauna vem a óbito porque não consegue escapar da linha de fogo, porque o chão está em chamas.
Bruno Guilhon
Biólogo e pesquisador

Em relação à flora, o biólogo pontua que Fortaleza conserva menos de 3% da cobertura vegetal original, e que, desde ontem, “no mínimo 20 hectares de flora foram carbonizados, fazendo com que, agora, haja uma mancha cinza dentro da nossa cidade” – unida à poluição diária por carros, termelétricas e queimadas de lixo.

[Atualização às 18h45]

Na tarde desta quinta-feira, o Corpo de Bombeiros confirmou que não foram 20 hectares de terras atingidos pelo fogo. Mas os incêndios ocorreram dentro de um polígono de 20 hectares, um espaço que, portanto, não foi totalmente atingido pelo fogo.

“A filtração do ar já é complicada de se realizar, e com a carbonização da matéria vegetal, que gera fumaça, a poluição aumenta exponencialmente, numa velocidade muito rápida”, lamenta Bruno, ressaltando que, em Fortaleza, “o desmatamento é um dos principais causadores da emissão de gases poluentes”.

“É uma área muito rica”

A diversidade de espécies vegetais no Parque do Cocó – o maior em área urbana do Norte/Nordeste e 4º da América Latina – é tamanha que, em todo o Ceará, algumas são encontradas somente lá. 

De 346 espécies arbóreas, arbustivas e palmeiras mensuradas pelo Inventário Florestal Nacional (IFN), 7 foram identificadas exclusivamente no Cocó.

“A vegetação típica deste ambiente é responsável por produzir a matéria orgânica que oferece condições ideais para o desenvolvimento de inúmeros organismos que buscam este ecossistema para procriação”, acrescenta o texto do IFN sobre o Cocó.

919 árvores
Somente as 10 espécies vegetais mais abundantes no Parque Ecológico do Cocó concentram mais de 900 árvores por hectare, conforme o IFN. 

O levantamento, realizado pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) em parceria com o Serviço Florestal Brasileiro e divulgado em 2019, apontou ainda que “vestígios de caçadores e evidências de incêndios” são os principais impactos ambientais na região – ambos causados pela ação humana.

Hugo Fernandes, biólogo e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) que tem atuado no local do incêndio, nesta quinta-feira (18), alerta que “ainda é muito cedo para avaliar os impactos ambientais” do desastre, embora frise que “é uma área muito rica, com centenas de espécies de árvores, dezenas de espécies de mamíferos, répteis e anfíbios”.

A área mais impactada nesse momento é um campo aberto, que não guarda uma diversidade tão alta quanto as áreas mais densas. Mas existem espécies de flora e fauna no local. Já encontramos animais mortos, sobretudo anfíbios e peixes.
Hugo Fernandes
Biólogo e professor da Uece

O biólogo destaca que “a prioridade, agora, é apagar os focos, salvaguardar as vidas, impedir que uma área maior seja afetada e cuidar de animais passíveis de resgate”. Só depois será realizado o trabalho de perícia e a medição dos impactos concretos deixados pelo fogo.

O biólogo Bruno Guilhon acrescenta que é indispensável fazer a recuperação das áreas degradadas, por meio do plantio de novas árvores, e trabalhar “pesado” em medidas de educação ambiental – principalmente para evitar descarte irregular de lixo na cidade.

“É o mínimo que pode ser feito. Que as pessoas evitem jogar lixo, não façam fogueiras em áreas verdes. Uma pequena garrafa de vidro pode causar uma fagulha, gerando um incêndio maior”, lamenta o pesquisador.