Romeiros lotam ruas apesar de fiscalização

Segundo organizadores do evento, pelo menos 100 mil pessoas deixaram de comparecer neste ano

Juazeiro do Norte. Com menor número de romeiros do que as romarias anteriores e maior rigor na fiscalização dos caminhões paus de arara, terminou ontem a maior manifestação religiosa do ano em Juazeiro do Norte, a Romaria de Finados. A estimativa da Igreja é que tenham passado neste ano pela cidade nos últimos cinco dias cerca de 400 mil pessoas.

A média que se estabelece a cada ano durante essa romaria é de mais de 500 mil. Ontem pela manhã, foi realizada missa campal em intenção do Padre Cícero defronte à Capela do Socorro, onde se encontram os restos mortais do sacerdote, falecido aos 90 anos, no ano de 1934.

Homenagens foram prestadas durante o dia inteiro em locais como a Capela do Socorro e Santuário dos Franciscanos. Milhares de pessoas rezaram diante do túmulo do Padre Cicero e depositaram objetos e flores. Alguns se emocionam com a possibilidade de poder tocar o túmulo do "padrinho".

Centenas de romeiros foram impedidos pela fiscalização, durante a 2ª etapa de Operação Romaria Segura, iniciada no último dia 30, de chegar até o Juazeiro em caminhões do tipo pau de arara. Na última sexta-feira, sete deles foram retidos e os romeiros tiveram que percorrer, pela BR-116, quase 60 Km para chegar a pé em Juazeiro do Norte, onde a maioria já estava com o rancho alugado para o período da romaria. Pelo menos 20 adultos com algumas crianças seguiram a pé, já que não tinham mais dinheiro para fretar um transporte o até o destino. Grande parte dos veículos apreendidos na localidade vinha da Paraíba.

O pároco da Basílica de Nossa Senhora das Dores, Joaquim Cláudio, disse que a Romaria atrai um número maior de religiosos com menor poder aquisitivo de localidades do sertão pernambucano, de Sergipe e Alagoas. Alguns deles não têm condições de obter um transporte melhor que o pau-de-arara.

Susto

A agricultora Severina Santos afirma que há dois anos deixou de vir para as romarias de caminhão. Ela disse que na última viagem teve um grande susto, já que a lona que cobre a carroceria saiu do lugar e o caminhão desceu uma ribanceira. "Não houve nada grave, mas tivemos que percorrer uns 2 Km a pé para aguardar numa sombra o conserto".

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) chegou a fiscalizar até o último dia 31, 73 veículos que transportavam 1.179 romeiros de forma irregular e 54 motoristas foram notificados. Segundo o órgão, o transporte de romeiros em paus de arara é considerado multa gravíssima.

Grupo realiza dança em reverência aos mortos

Juazeiro do Norte. A Romaria de Finados não tem a mesma característica recreativa da festa de Nossa Senhora das Dores, que ocorre em setembro, e é realizada em menos tempo. Desde o início da semana, a cidade não parou de receber romeiros de vária partes do Nordeste e do Brasil, mesmo o evento sendo aberto oficialmente apenas no último dia 29.

De uma forma mais contida, os fiéis fazem visitações nos principais centros de oração e acendem velas em locais comunitários para fazer reverência aos mortos. Desde o último dia 22, que o Grupo de São Gonçalo das Almas realiza a dança para os mortos. Uma forma de oração.

O grupo é reconhecido como patrimônio imaterial pelo Estado do Ceará, segundo o músico que acompanha e registra as ações dos seus integrantes, Di Freitas.

Padre Cícero

Após a Missa das Seis Horas, na Praça do Socorro, os senhores e senhoras tomam o espaço, diante de uma enorme cruz de frente à Capela, onde estão os restos mortais do Padre Cícero, para realizar o que eles não chamam de uma manifestação cultural, mas religiosa.

Antes, a mesma homenagem foi realizada no Cemitério do Socorro, com o som de instrumentos como pandeiro, rabeca, um violão e um adufe, pandeiro de sonoridade diferenciada de origem árabe, que ajuda a encaminhar os passos.

Tradição

O mestre Joaquim Pedro da Silva diz que esse é um trabalho para os irmãos que já morreram. Ele e os outros integrantes dos estados de Alagoas, Sergipe e Bahia se unem para realizar a reverência. O grupo perdeu um dos seus integrantes importantes, o mestre Leôncio, responsável pela capela no Horto, onde se reúnem todos os integrantes do grupo. Ele morreu esse ano preocupado em perder o seu ganha pão. Com a retirada de vendedores ambulantes das ruas, ficou também sem o seu carrinho.

Os homens e mulheres da dança de São Gonçalo tiram as sandálias e, de pés descalços, arrastam no chão os passos de fé. Todos anos, a tradição, que para eles é uma missão, segue rumo ao Horto, onde fazem os trabalhos de forma mais reservada. No Dia de Finados, eles se encaminham para a praça com suas vestes brancas e os rosários no pescoço para expandir a fé num culto secular aos mortos.

Elizângela Santos
Colaboradora