A primeira-dama ocupa um espaço não apenas simbólico, mas prático na administração pública. No Ceará, apesar de não existir de forma oficial, muitas mulheres que ocuparam esse posto tiveram protagonismo dentro da gestão - sendo responsável por iniciar políticas públicas ou mesmo pela mediação com setores da sociedade.
Um protagonismo que, em 2022, apareceu ainda durante o processo eleitoral para escolher quem será o próximo a ocupar a cadeira de governador do Ceará. Na disputa estadual, as companheiras dos candidatos ao Governo têm sido presença constante em atos eleitorais e partidários, mesmo antes do início da campanha em agosto.
Entre elas, apenas Dayany Bittencourt é candidata a uma cadeira na Câmara Federal. O nome de urna, Dayany do Capitão, faz referência direta ao marido e candidato a governador, Capitão Wagner (União Brasil).
Carol Bezerra e Lia Freitas, por sua vez, não concorrem a cargos eletivos. Apesar disso, têm sido presença constante nos atos a favor das candidaturas dos maridos, Roberto Cláudio (PDT) e Elmano de Freitas (PT), respectivamente.
Uma participação que traz consigo uma "mobilização de seus capitais, de suas trajetórias" em favor dos respectivos candidatos ao Governo, explica a coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem/UFC), Monalisa Soares.
"Elas não são exclusivamente companheiras, hoje elas fazem política também. Estão ali para mobilizar, para contribuir no processo de eleição dos maridos. Trazem algo para agregar e que pode mobilizar essa representatividade simbólica delas. Elas não são apenas esposas, (mas) tem uma trajetória, a partir da qual se colocam".
Atenção à Primeira Infância e juventude
Ex-primeira-dama de Fortaleza, Carol Bezerra tem atuação com foco na Primeira Infância. Pauta que pretende voltar a levantar caso Roberto Cláudio seja eleito para o Governo do Ceará. Ela diz que é importante ampliar essa atuação: "a gente precisa olhar muito para a juventude", afirma.
Outras bandeiras que afirma que pretende levantar é a "causa das mulheres", além de dizer que tem dialogado com "o movimento LGBT e de igualdade racial". Ela admite que, em alguns casos, leva algo que escuta nas ruas para a equipe que elabora o Plano de Governo.
"Mas eu estou muito na rua", ressalta. Os atos, afirma, "são sem parar, quase o dia todo". Além da Capital, ela também tem participado de eventos no Interior, que incluem inauguração de comitês de candidatos ao Legislativo, caminhadas e reuniões com lideranças.
"Mas o tanto que a gente puder trabalhar, estar nas ruas, a gente está, porque eu acho que, em uma campanha, o importante é ouvir. Ouvir o que as pessoas estão precisando, ouvir a dor do povo, olhar no olho e a gente gosta disso".
O Diário do Nordeste acompanhou o ato de Carol Bezerra na Comunidade do Dendê, no bairro Edson Queiroz, em Fortaleza. Acompanhada de Lívia Saboya, filha do candidato à presidência, Ciro Gomes (PDT), e de lideranças da região, ela conversou com moradores e entregou panfletos da candidatura de Roberto Cláudio.
Por mais de uma vez, ela falou sobre a gestão do pedetista à frente da Prefeitura de Fortaleza (entre 2013 e 2020), ressaltou a experiência e pediu a "oportunidade" de estender a atuação para todo o Estado. Além disso, aproveitou para falar de Ciro Gomes e entregar panfletos com as propostas do candidato a presidente.
Candidatura à Câmara Federal
Candidata a deputada federal pelo União Brasil, Dayany Bittencourt foi a única que não concedeu entrevista ao Diário do Nordeste. A assessoria de imprensa da candidata enviou as respostas dela sobre a participação nesta campanha.
Ela teve participação intensa na pré-campanha, tanto em eventos do União Brasil para filiação de novos candidatos ou nos encontros regionais partidários, como em eventos voltados à candidatura de Wagner antes mesmo dele assumir o comando do partido no Ceará.
"Acompanhei meu esposo durante os 184 municípios do estado. Foram longos dias de visitas intensas, conversando, escutando e conhecendo as demandas do nosso povo", ressalta a candidata. Em muitas ocasiões, durante os discursos, ressaltou a trajetória do casal quando Wagner começou na vida pública.
Contudo, pouco depois do início da campanha, ela precisou se afastar das ruas, devido a uma cirurgia de urgência de endometriose. Ela disse que, por conta do processo de recuperação, não pode "acompanhar o ritmo intenso da agenda do Capitão Wagner".
Apesar disso, nas últimas semanas ela tem feito alguns atos junto ao candidato, além de visitar municípios no Interior do Ceará para atos da própria candidatura, apoiada por lideranças municipais. Durante o período de recuperação, ela continuou a fazer publicações sobre a candidatura - em uma delas, respondeu a fala do senador Cid Gomes sobre o marido.
"Como candidata, venho firmar meu compromisso com o povo e dar continuidade às bandeiras de Capitão Wagner. Luto em defesa da vida e da família; dos valores cristãos levantando a bandeira conservadora; pela causa animal e das pessoas com deficiência", cita Dayany.
Foco na na Capital e Região Metropolitana
Mestre em Planejamento e Políticas Públicas, Lia Freitas tem tido como principal foco os atos e eventos na "frente" de Fortaleza e da Região Metropolitana, como define. Ela afirma ainda que esteve em alguns municípios do Interior, como Russas, cidade natal dela.
Nesta reta final da campanha, o Diário do Nordeste acompanhou caminhada feita por ela no bairro José Walter, em Fortaleza. Ao lado da candidata à suplência do Senado, Augusta Brito (PT), ela percorreu as ruas da região, parando rapidamente para conversar com alguns moradores que esperavam na porta de casa.
Rápida, a conversa envolvia uma apresentação de quem é o candidato e a entrega do panfleto com as propostas de Elmano para o Estado. Era comum que os próprios moradores mencionassem o ex-presidente Lula, pedissem bandeira ou já estivessem com os adesivos dos candidatos petistas.
Lia afirmou que pretende "ajudar o Elmano a cuidar do povo" - o candidato tem sempre feito referência a "cuidar do povo" como um dos principais objetivos, caso seja eleito governador. Ela cita a trajetória - "18 anos de serviço pública, fazendo trabalho e discussões sociais em Igrejas" - como algo a "somar" na candidatura petista.
Enquanto nas ruas, o importante é levar as propostas, reuniões temáticas e com setores específicos da sociedade tem servido como forma de contribuir com o plano de governo. "A gente tem construído um programa de governo coletivo. É um programa em construção, que escuta, que dialoga e que vai construir junto", ressalta.
Indagada sobre em quais pautas gostaria de atuar caso Elmano de Freitas seja eleito, ela cita principalmente a assistência social. "Assistência às mulheres, aos idosos, às pessoas com deficiência, as crianças com doenças raras, transtornos do autismo. A gente quer ter um olhar sensível a essas questões que necessitam urgentemente de um atendimento", ressalta.
Representatividade feminina
Monalisa Soares ressalta que, a exemplo do que ocorre também a nível nacional, tem ocorrido um "recrutamento" das esposas dos candidatos para uma atuação mais marcante na campanha eleitoral. Para a cientista política, essas mulheres carregam uma "representação simbólica", que pode ser importante para atrair a atenção do eleitorado feminino.
Em um contexto de pouca representatividade feminina na disputa estadual - em que nenhuma mulher na disputa o Governo do Ceará e apenas uma disputa a vice-governadoria - a estratégia para tentar conquistar o voto feminino é essencial para quem tentar chegar à cadeira de governador.
Ainda mais em um cenário onde as eleitoras são as mais indecisas sobre o voto: 39% não soube ou não quis responder em quem irá votar para governador no próximo domingo (2) na pesquisa espontânea. O dado é da terceira rodada do Ipec Ceará, divulgada na última quinta-feira (22).
A 'representação simbólica' da qual fala Soares pode servir como forma de criar identificação com eleitorado e aproximar as candidaturas das eleitoras, mostrando, por exemplo, que as esposas dos candidatos ao Governo são "valoradas pelos companheiros" e, assim, se "valorizam as esposas, podem valorizar as mulheres".
Apesar disso, destaca a cientista política, as companheiras dos candidatos "não são representantes políticas das mulheres", já que não são elas que concorrem ao comando do Executivo estadual.
"Elas não foram eleitas, o Governo não é delas. Elas não podem sequer estar na gestão. No limite, é uma parceria, mas elas não são representantes políticas", explica Soares.