O Ministério Público Eleitoral denunciou o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) por violência política de gênero contra a senadora em exercício Janaína Farias (PT). A promotora eleitoral Sandra Viana Pinheiro, da 114ª Zona Eleitoral em Fortaleza, argumenta que Ciro "constrangeu e humilhou, através de palavras, detentora de mandato eletivo (Senadora da República), utilizando-se de menosprezo à condição de mulher da parlamentar, com a finalidade de dificultar o desempenho de seu mandato eletivo".
A ação foi protocolada no último dia 3 de maio pelo Ministério Público Eleitoral, após pedidos feitos pelo Ministério Público Federal e pela Advocacia do Senado Federal. Como Ciro Gomes não é detentor de mandato, a ação irá tramitar na primeira instância da Justiça Eleitoral no Ceará.
Através de nota, a parlamentar declarou à reportagem que “as ações na Justiça Eleitoral e na Justiça Comum têm como objetivo buscar a punição do responsável pelo crime, mas também reparar a injúria cometida". Ela diz ainda que "é preciso que pessoas que atentem contra a honra de qualquer um sejam obrigadas a pagar criminal e financeiramente pelo que fazem".
"Na ação, impetrada no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, solicitamos também que qualquer eventual nova agressão acarrete também uma indenização adicional no valor de 100 mil reais. Mulheres na política não podem se calar diante de agressões como essas e o melhor caminho é o de ir à justiça para garantir toda e qualquer punição que seja possível. Só assim podemos demonstrar à sociedade que atos machistas, misóginos, desrespeitosos e criminosos como os cometidos por esse senhor não valem a pena. É sempre bom lembrar que a maior vítima da violência política de gênero é a democracia!”, encerra a nota.
O Diário do Nordeste entrou em contato com a assessoria de Ciro Gomes para saber qual o posicionamento dele quanto à denúncia feita pelo Ministério Público Eleitoral. Quando houver resposta, a reportagem será atualizada.
Em abril, Ciro Gomes proferiu ataques contra Janaína Farias logo após a petista assumir cadeira no Congresso Nacional — ela é a segunda suplente do ministro da Educação, Camilo Santana (PT). Na denúncia, são citados três episódios.
O primeiro deles é entrevista do ex-ministro ao portal de notícias 'A notícia do Ceará', no qual Ciro questiona o "preparo" de Farias para assumir como senadora. "Qual é a obra, qual é a realização, qual é o preparo, que a Dona Janaína tem para ser Senadora da República na marra?", disse. Na sequência, insinua que Janaína "fez serviço particular do Camilo, e serviço particular, assim, é o harém sabe?".
Poucos dias depois, em evento do PDT em Fortaleza no dia 4 de abril, Ciro Gomes voltou a atacar Janaína Farias, chamando a senadora de "assessora para assuntos de cama do Camilo Santana", conforme publicado pelo Diário do Nordeste. Em nova entrevista, desta vez na Rádio Jangadeiro Band News, no dia 24 de abril, ele disse que Janaína Farias teria "qualificação nenhuma" para chegar ao Senado e voltou a atacá-la, inclusive ressaltando que teria usado palavra "moderada" nas declarações anteriores.
"Eu usei uma palavra mais moderada, eu falei que era 'assessora para assuntos de alcova'. Caramba! Caiu o mundo em cima de mim. (...) Pois bem, em vez de ser assessora de alcova, agora vou substituir, ela é simplesmente a pessoa que organizava as farras do Camilo Santana. É disso que estou dizendo e, assim, o que eu tenho a ver com a vida particular de Santana? Nada! E a vida particular dela? Nada! Agora, botar no Senado? A voz do Ceará no Senado? A mulher cearense representada no Senado por uma cortesã? Isso é machismo?", disse Ciro durante entrevista.
Na denúncia, o Ministério Público Eleitoral reforça que as declarações de Ciro Gomes caracterizam o crime de violência política de gênero, tipificado desde 2021.
"Em razão da situação de preconceito, humilhação e constrangimento impostos à vítima em questão, empossada como parlamentar federal, tendo sido desmerecida no exercício do mandato em razão de seu gênero, por insinuações verbalizadas pelo Denunciado de cunho misógino nas entrevistas concedidas", descreve o documento.
Pedidos do MPF e do Senado Federal
A denúncia feita pela promotora eleitoral Sandra Viana responde a pedidos feitos pela procuradora da República Raquel Branquinho, coordenadora do GT (Grupo de Trabalho) Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero do Ministério Público Federal.
A senadora Janaína Farias também está sendo representada pela Advocacia do Senado Federal, que encaminhou pedido à Procuradoria Regional Eleitoral do Estado para investigação contra Ciro Gomes.
No pedido feito pelo Senado, foi incluído relatório da Coordenação de Polícia de Investigação e Judiciária da Secretaria de Polícia do Senado Federal, no qual é ressaltado que o órgão realizou a preservação das mídias na qual foram registradas as declarações do ex-ministro Ciro Gomes.
O procurador regional eleitoral, Samuel Miranda Arruda, declinou da competência para realizar a denúncia "visto que a pessoa indicada como sendo autora das ofensas (Ciro Gomes) não ocupa cargo com foro por prerrogativa de função". Com isso, a atribuição passou para a 114ª Zona Eleitoral em Fortaleza.
A promotora eleitoral Sandra Viana pediu à Justiça Eleitoral o recebimento da denúncia contra Ciro Gomes e a instauração do processo contra o ex-ministro. Também deixa de oferecer acordo de não-persecução penal "por entender que não se admite a celebração de acordo de não persecução penal" neste caso.
"O instituto não é aplicável 'nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor'. Some-se a isso a repercussão gerada e a gravidade do delito, praticado em desfavor da condição de mulher parlamentar, ora vítima", encerra o documento.