Lula, Bolsonaro, Ciro e Tebet: saiba qual o cenário de pré-candidatos para vice-presidente em 2022

Especialistas avaliam que a escolha do segundo na linha de sucessão deve seguir diferentes critérios neste ano

A menos de 100 dias para pleito de outubro e com as convenções partidárias batendo à porta, o cenário da disputa pela vice-presidência da República ainda segue nebuloso, com poucas definições até o momento.

Entre os principais pré-candidatos apresentados, apenas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem o vice da chapa definido - Geraldo Alckmin, ex-governador de São Paulo, que trocou o PSDB pelo PSB para a eleição. 

Enquanto isso, o presidente Jair Bolsonaro (PL), a senadora Simone Tebet (MDB) e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) ainda não bateram o martelo sobre o segundo na linha de sucessão na chapa, apesar de flertes com alguns nomes. 

Histórico de rupturas

Figura emblemática e de extrema importância, apesar de não ter funções institucionais estabelecidas pela Constituição, o vice-presidente, por vezes, veio a concluir mandatos no Brasil desde a redemocratização.

De seis governos eleitos desde o início da Nova República (1985), em metade vice-presidentes assumiram e finalizaram mandatos de titulares. Além disso, momentos conturbados entre vices e presidentes constantemente ganham evidência ao longo das gestões.

Eleito na redemocratização do Brasil, Tancredo Neves (PMDB, hoje a sigla é MDB) faleceu antes de assumir. Seu vice, José Sarney (PMDB), foi empossado no cargo, ficando quatro anos no poder.

Em 1990, Fernando Collor de Melo (do extinto PRN) foi eleito presidente do País, mas permaneceu por apenas dois anos. Ele renunciou em meio a desgastes econômicos - principalmente após o confisco da Poupança - e diante da ameaça de impeachment. O restante do mandato foi terminado por seu vice, Itamar Franco (PMDB).

A terceira presidente a não concluir o Governo foi Dilma Rousseff (PT), que sofreu impeachment no segundo mandato, em agosto 2016, em um momento de baixa popularidade devido à crise econômica que assolava o País. Seu vice, Michel Temer (MDB), é apontado por especialista como parte do 'golpe' que a tirou do Poder. Na época, supostos crimes de responsabilidade fiscal justificaram o processo.

Todavia, até hoje as chamadas 'pedaladas fiscais' na edição de decretos suplementares dividem especialistas, que divergem sobre a prática de um crime de improbidade. Apesar do impeachment, os direitos políticos de Dilma não foram suspensos.

Dos eleitos, apenas os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (PSDB, gestão 1995-2002), Lula (gestão 2003-2010) e Bolsonaro (2019 até o momento) não perderam o assento para o vice, ainda que com rusgas com o banco de reserva.

Diante desse cenário, especialistas avaliam que a escolha do segundo na linha de sucessão deve seguir diferentes critérios neste ano, conforme a personalidade e desafios que os cabeças de chapa querem superar.

Para o cientista político Cleyton Monte, também pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem) da Universidade Federal do Ceará (UFC), o vice não pode ser "maior que o candidato principal" e deve "agregar elementos que o candidato a presidente não dispõe em um primeiro momento".

"O vice é a figura dentro do Governo que não pode ser demitida. Você pode demitir um ministro, mas não um vice, porque ele foi eleito. Por isso, ele pode se aproveitar muitas vezes de uma crise e angariar apoio para chegar no Poder. É uma figura muito controvérsia, exige muito cuidado na escolha", explica Monte.

Cenário atual

No cenário atual, as articulações para escolha do vice ainda estão ocorrendo. O presidente Bolsonaro, por exemplo, tem feito fortes acenos ao seu ex-ministro Walter Braga Netto, também general do Exército assim como Hamilton Mourão (Republicanos), atual vice. Mourão, inclusive, já é figura descartada para Bolsonaro.

Essa será a primeira vez, desde a redemocratização, que um presidente muda o candidato a vice em busca de reeleição. 

Na última sexta-feira (1º), Netto deixou a assessoria especial da Presidência da República, fortalecendo os indícios em torno da confirmação de seu nome como vice de Bolsonaro. Antes, aliados do mandatário tentavam emplacar a ex-ministra Tereza Cristina (PP-MS) na chapa, por ser mulher e ter bom trânsito com empresários, além de ser ligada ao Centrão. 

Para Pablo Ortellado, professor de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), a estratégia de Bolsonaro está mais voltada para a escolha de um nome "seguro", que não represente uma ameaça no futuro. Enquanto os demais tentam escolher um perfil que agregue na composição de alianças, atingindo diferentes públicos na arrecadação de votos, o atual presidente tem preferido 'alguém do mesmo espectro'.

"Ele está mais preocupado em não ter um vice que conspire contra ele, mais ou menos como o Temer conspirou contra a Dilma. Então, ele tem buscado um vice que seja não apenas do mesmo campo (ideológico), mas que sobretudo seja uma pessoa fiel - para que na eventualidade de uma doença ou de uma ameaça de impeachment, o vice não fique ajudando a derrubar o presidente que está exercendo o mandato"
Pablo Ortellado
Professor de Gestão de Políticas Públicas da USP

Na contramão da estratégia de Bolsonaro, o vice escolhido para compor a chapa do ex-presidente Lula surge com uma alternativa para ampliar o eleitorado a ser atingido. Os esforços, que inclui aliança com um adversário histórico, buscam construir uma grande coalização entre grupos progressistas para derrotar o presidente. 

"O Lula, por exemplo, tem usado essa função simbólica de composição de alianças para mostrar que a candidatura dele tem um arco amplo de apoios. Então, ele chamou o Alckmin, que vem do PSDB (hoje, está no PSB), que foi um adversário histórico do PT por uns bons 20 anos, para mostrar que ele é uma candidatura de amplo espectro, que simboliza uma grande coalizão contra o Bolsonaro. Então, ele está trabalhando esse aspecto simbólico", explica Ortellado.

Por isso, para tentar penetrar em setores resistentes ao seu nome, como o do empresariado, ele se antecipou na escolha do vice, que tradicionalmente é definida no último momento do lançamento da chapa. 

"São costuras muito difíceis, não são fáceis, porque envolve contemplar aliados. E sempre alguém vai ficar magoado, porque ficou de fora, porque não era o que queria. Por isso, muitas vezes (a escolha do vice) é última coisa que vai ser feita para fechar a chapa. O Lula escolheu logo seu vice pela necessidade em buscar apoio em outras regiões, outros setores, como com os empresários"
Cleyton Monte
Cientista Político e Pesquisador do Lepem

Terceira via

Na chamada terceira via, especialistas avaliam que as tratativas a passos lentos para definição de um vice podem sinalizar uma possível desistência de um dos "players" apresentados. Enquanto Tebet aguarda a confirmação do apoio do PSDB à sua candidatura, Ciro segue flertando para a emedebista compor sua chapa como vice e disse que um nome será apresentado até a convenção para oficializar a sua candidatura, marcada para 23 de julho.

O PSDB nacional quer o nome do senador Tasso Jereissati como vice na chapa de Tebet, mas as discussões internas ainda estão caminhando e o martelo não foi batido oficialmente - principalmente por conta do impacto que a aliança entre MDB-PSDB pode ter na candidatura de Eduardo Leite (PSDB) ao Governo do Rio Grande do Sul. 

Tasso é apontado como alguém capaz de estreitar laços com o clã Ferreira Gomes, numa possível tentativa de uni-lo à candidatura. 

Todavia, Ciro descarta abandonar a postulação para ser vice na chapa de Tebet, mesmo que o cenário de alianças para ele não esteja tão favorável diante da polarização de forças entre a candidatura de Lula e Bolsonaro.

Além disso, o PSDB já sinalizou apoio a emedebista. Quem ficar com o apoio oficial dos tucanos leva também a aliança com o Cidadania, tendo em vista a federação partidária formada entre as duas legendas.

Nas últimas pesquisas eleitorais, Tebet tem variado entre 1% e 3% das intenções de votos, enquanto Ciro segue na terceira posição, sem ultrapassar a casa de um dígito. 

"No caso dos postulantes da chamada terceira via, acho que eles estão em um passe de espera para ver se eles vão ter candidaturas concorrentes e, provavelmente, terminar com uma votação muito inexpressiva ou se eles vão conseguir articular uma espécie de composição, juntando todas as forças. Por exemplo, se for Ciro na cabeça e Simone de vice, ou alguma outra composição do tipo, eles se fortaleçam mutuamente e conseguem ultrapassar a barreira de um dígito. O Ciro está perto, está com 8%, mas ele está muito atrás, realmente são coadjuvantes na disputa eleitoral".
Pablo Ortellado
Professor de Gestão de Políticas Públicas da USP

Para Cleyton, o cenário de alianças ainda nebuloso na terceira via aumenta a possibilidade uma possível união entre as candidaturas de Ciro e Tebet.

"Seria muito interessante para o Ciro se unir a Tebet, principalmente pelo perfil dela. É uma política qualificada, mulher, é da região Centro-Oeste, tem um bom trânsito com os empresários. O melhor para o Ciro seria uma mulher, fora do Nordeste. Esse perfil somaria mais para a candidatura dele", acrescenta.

Convenções

Enquanto as tratativas ocorrem, Ciro já anunciou a data da convenção do PDT Nacional para oficializar a sua candidatura à Presidência. O encontro será no dia 23 de julho. Já o MDB ainda não anunciou uma data, mas a reunião deve ocorrer neste mês.

O PT definiu sua convenção para 21 de julho, para o lançamento da chapa Lula. Já o PSB agendou sua convenção para o dia 29 de julho, para oficialização da chapa Lula-Alckmin. O PL, partido de Bolsonaro, marcou a sua convenção para o dia 23 de julho.

As convenções partidárias, onde são definidos os candidatos que serão lançados ao pleito, podem ser realizadas até o dia 5 de agosto, conforme determina a Justiça Eleitoral.