A pouco mais de dois anos para o fim das gestões eleitas em 2020, municípios cearenses ainda passam por instabilidades políticas com a troca de prefeitos. Até novembro de 2022, sete cidades do Ceará já haviam mudado a gestão por conta de irregularidades confirmadas pela Justiça.
As instabilidades, inclusive, têm preço, e quem paga é a população. Além de trazer desgastes, elas ainda custam caro aos cofres públicos. De 2021 até novembro, já são R$ 350 mil gastos pela Justiça Eleitoral para custear eleições suplementares no Ceará.
O valor, inclusive, já abrange a cidade de Baixio, onde a eleição suplementar será realizada no próximo dia 11. Os dados são do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE).
Na maioria dos casos, chapas inteiras foram cassadas por abuso de poder político ou econômico no período eleitoral. Há casos, também, em que a desincompatibilização fora da janela partidária e abandono de cargo público culminaram na perda dos diplomas dos eleitos.
Já há previsão para mais duas eleições suplementares no Ceará, nas cidades de Pacujá e Iguatu. A Justiça Eleitoral marcou a nova votação para o dia 5 de fevereiro de 2023. O número de eleições suplementares no Ceará ainda pode aumentar, tendo em vista que ainda há casos que aguardam o julgamento no TRE-CE.
Sem prefeito e sem vice, quem assume o comando de cada uma das prefeituras é o presidente da Câmara Municipal, de forma interina. Ele fica no cargo até a população escolher um novo representante, em data determinada pela Justiça Eleitoral.
A exceção é quando a cassação ocorre no semestre final do mandato, quando são convocadas eleições indiretas para um mandato-tampão.
Além dos gastos do TRE-CE para realização dos pleitos, há ainda investimentos nas candidaturas dos postulantes – que são financiadas por doações de pessoas físicas e verbas do Fundo Partidário.
Custo por cidade
No próximo dia 11, é a vez da população de Baixio, na região Centro-Sul, voltar às urnas para escolher um novo representante. Lá, o prefeito reeleito, Zé Humberto (PDT), e o vice, Donizete Cavalcante (PDT), foram cassados por abuso de poder político ao utilizar canais institucionais da prefeitura em benefício da chapa.
A cassação foi confirmada pelo TRE-CE no primeiro semestre deste ano. Desde junho último, o presidente da Câmara Municipal da cidade, Raimundo Amaurílio Araújo (PDT), o Zico, está no comando da gestão.
A eleição suplementar de Baixio vai custar R$ 31 mil ao TRE-CE. De acordo com a Corte, o valor cobre o custo com alimentação e contratação de veículos para transporte das urnas no dia do pleito. Ao todo, 92 mesários foram convocados, segundo Tribunal.
Além de Baixio, já foram realizadas outras seis eleições suplementares no Ceará no ano passado por cassação dos gestores. São elas: Barro, com o custo de R$ 43 mil para o TRE-CE; Viçosa do Ceará (R$ 71 mil); Jaguaruana (R$ 54 mil); Pedra Branca (R$ 70 mil); Martinópole (R$ 29 mil); e Missão Velha (R$ 51 mil).
Os custos de um novo pleito variam de acordo com o eleitorado do município.
"Efeitos colaterais"
Para o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil secção Ceará (OAB-CE), Fernandes Neto, a alternância de poder provocada pelas ilegalidades de postulantes prejudica a população da cidade porque provoca descontinuidade de projetos a longo prazo. No entanto, ele reforça que a única forma de tentar evitar instabilidades é dando celeridade aos processos que tramitam na Justiça Eleitoral.
Mesmo reconhecendo que a Justiça Eleitoral é mais célere em relação a outras esferas do Poder Judiciário, ele reforça que faltam braços para dar conta da quantidade expressiva de processos e candidaturas que aumentam a cada pleito.
Além disso, Fernandes Neto reforça que a alteração no Código Eleitoral em 2015, para permitir a realização de eleições suplementares, foi um avanço para o processo democrático, mas com "efeitos colaterais ruins" – tendo em vista que eleições suplementares municipais só podem ser convocadas quando não há mais possibilidade de recurso na segunda instância e com aval do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"Essa medida é boa, mas com efeitos colaterais ruins. É boa porque evita que candidatos com baixíssimos percentuais de voto chegassem ao poder, como chegavam antes. Antes, o primeiro lugar era cassado. O candidato que tinha tirado 20% e ficado em segundo lugar era chamado para assumir sem a legitimidade do voto popular. Essa lei foi alterada para exigir novas eleições. Nesse aspecto, é bom. A consequência ruim é a demora da prestação jurisdicional da Justiça Eleitoral, que vai julgar o processo de registro de candidatura quando o candidato eleito e futuramente cassado já se encontra no exercício do Executivo"
A professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres, também corrobora com a opinião de Fernandes Neto e chama atenção para a mobilização que os candidatos eleitos, mesmo inaptos, têm perante o eleitorado.
"Independente de o candidato ter problema ou não na Justiça, o candidato vencedor mobiliza um grupo político ao seu redor. Ele constrói ao longo de um período essa aproximação com o eleitor. Quando você vê ali toda a mobilização e todo o recurso que é gasto no período eleitoral, não só do ponto de vista financeiro, mas também de apoio, de mobilização, de manifestação e envolvimento das pessoas, é como se não valessem de nada"
Valor das candidaturas
No Ceará, os gastos dos candidatos em eleições suplementares após o pleito de 2020 já somam R$ 1,1 milhão. O valor não contempla as despesas das candidaturas apresentadas em Baixio, porque lá os postulantes ainda não informaram quanto despenderam na campanha. Todavia, eles ainda estão dentro do prazo de envio da prestação de contas.
Em quase todos os casos, os candidatos gastaram um pouco menos ou igual ao valor que receberam para a campanha. A única exceção é o candidato Divaldo Soares (PDT), que saiu derrotado da disputa em Viçosa do Ceará, realizada em dezembro do ano passado.
Na plataforma Divulgacand da Justiça Eleitoral, ele informou ter recebido R$ 55 mil, enquanto gastou R$ 187 mil. Até o momento, consta que ele pagou R$ 51 mil em e teria ficado com uma dívida de campanha de R$ 136 mil.
Confira os gastos dos candidatos
Barro (eleição suplementar realizada em 05/12/2021)
- Dr. George (MDB) - eleito
Recursos recebidos: R$ 58.400
Despesas: R$ 48.776 - Vanda (PSD)
Recursos recebidos: R$ 29.000
Despesas: R$ 23.000
Viçosa do Ceará (eleição suplementar realizada em 05/12/2021)
- Franci Rocha (MDB) - eleito
Recursos recebidos: R$ 157.400
Despesas: R$ 149.421 - Dilvado Soares (PDT)
Recursos recebidos: R$ 55.900
Despesas: R$ 187.856
Despesas pagas: R$ 51.499
Dívida de campanha: R$ 136 mil
Jaguaruana (eleição suplementar realizada em 07/11/2021)
- Elias do Sargento (PCdoB) - eleito
Recursos recebidos: R$ 116.660
Despesas: R$ 114.392 - Roberto da Viúva (PDT)
Recursos recebidos: R$ 130.791
Despesas: R$ 124.676
Martinópole (eleição suplementar realizada em 01/08/2021)
- Betão do James Bel (PP) - eleito
Recursos recebidos: R$ 60.000
Despesas: R$ 60.000 - Junior Fontenele (PL)
Recursos recebidos: R$ 70.000
Despesas: R$ 70.000
Missão Velha (eleição suplementar realizada em 01/08/2021)
- Dr. Lorim (PDT) - eleito
Recursos recebidos: R$ 51.350
Despesas: R$ 43.510 - Fitinha (PT)
Recursos recebidos: R$ 195.500
Despesas: R$ 190.000
Pedra Branca (eleição suplementar realizada em 01/08/2021)
- Matheus Góis (PSD) - eleito
Recursos recebidos: R$ 105.300
Despesas: R$ 94.995 - Padre Antônio (PDT)
Recursos recebidos: R$ 78.718
Despesas: R$ 46.582