Desde o racha de PT e PDT, Cid Gomes demonstrou insatisfação com hegemonia do PT no Ceará; relembre

Há pelo menos um ano, senador criticava possível concentração de poder nas mãos de lideranças petistas

A insatisfação do senador Cid Gomes (PSB) com a concentração de cargos pelo PT no Ceará atingiu o ápice neste final de semana, quando ele anunciou o rompimento com o governador Elmano de Freitas (PT). A 'gota d'água' foi a indicação do deputado estadual Fernando Santana (PT) para a sucessão da presidência da Assembleia Legislativa do Ceará (Alece). 

Com isso, o PT passaria a ter, a partir de 2025, o comando do Governo do Ceará, da Prefeitura de Fortaleza, da Alece, além de ocupar uma das três cadeiras do Ceará no Senado Federal. A todos esses cargos, soma-se a presidência da República, sob comando do presidente Lula (PT). Contudo, não é recente a demonstração de incômodo por parte de Cid Gomes, que começou há, pelo menos, um ano. Conforme a deputada estadual Lia Gomes (PDT), irmã do senador, falou ao colunista Wagner Mendes, a indicação de um petista para a presidência da Alece é apenas "mais um fato" que culminou no rompimento entre Cid e Elmano. 

Uma das primeiras demonstrações do incômodo aconteceu ainda em outubro de 2023. Na época, Cid Gomes tentava manter o comando do PDT Ceará, que enfrentava racha interno causado pelas eleições de 2022. Em entrevista na Live PontoPoder, o ex-governador ainda defendia a manutenção da aliança entre PT e PDT, mas afirmava não ser "razoável" que o PT tivesse a candidatura para a Prefeitura de Fortaleza. 

"O PT tem a presidência da República, tem o Governo do Estado, eu não acho razoável que eles tenham também a Prefeitura de Fortaleza — ou ganhem, porque eles não têm a Prefeitura de Fortaleza — e fique com todos os três poderes. Não é bom para a democracia", disse durante a entrevista. 

Na época, o agora prefeito eleito de Fortaleza, Evandro Leitão (PT), tinha conseguido anuência para sair do PDT — em carta assinada por Cid Gomes —, mas ainda não tinha se filiado ao PT, o que viria a acontecer apenas em dezembro do ano passado. 

Chegada ao PSB e o 'compartilhamento de poder'

Após meses de crise interna entre o grupo liderado por Cid Gomes e aquele ligado ao ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio (PDT) e ao ex-ministro Ciro Gomes (PDT), a ala cidista resolveu deixar o PDT e migrar para o PSB — partido que já tinha acolhido o grupo político liderado pelo senador em anos anteriores. 

No dia 4 de fevereiro de 2024, no evento de filiação do senador e de 40 prefeitos cearenses ao PSB, o senador criticou novamente a possibilidade de um único partido comandar o Executivo nas instâncias federal, estadual e federal.

"Não acho que é certo você querer tudo, ser dono de tudo. (...) Não é bom para política. Não é especificamente o PT, não é bom para a política do Ceará, que nos últimos anos tem sido uma política que várias forças se somam, ter uma força só, um partido só com as três principais posições", disse durante coletiva após a filiação. 

Pouco mais de um mês depois, houve nova crítica sobre a concentração de poder em lideranças do PT. Na época, a sigla petista já vivenciava a disputa interna para definir a candidatura a Prefeitura de Fortaleza — incluindo os nomes de Evandro Leitão e da deputada federal Luizianne Lins (PT), que acabariam polarizando a disputa dentro do PT. 

Durante evento para novos filiados do PSB, realizado em março, Cid Gomes reforçou que a aliança com o PT era "inquestionável", mas que era necessário haver "compartilhamento de poder". 

"Não sou dono da verdade e nem sou radical, mas eu acho que o exemplo que temos aqui no Ceará de compartilhamento de poder, de não-concentração, de não-hegemonização da política, acho que é algo bom, portanto eu tenho defendido com lealdade que a gente possa ter um candidato que não necessariamente seja do mesmo partido que já tem a Presidência da República e que tem o Governo do Estado", disse na época. 

O senador chegou a levantar a possibilidade de uma candidatura própria do PSB para a Prefeitura de Fortaleza, ao dizer que tentaria "credenciar o PSB para que possa ter alternativas". A ideia acabou não vingando e o PSB ficou de fora inclusive da chapa que concorreu a Prefeitura de Fortaleza — o PSD acabou ficando com a candidatura a vice-prefeita, com a deputada estadual Gabriella Aguiar (PSD).

'Não nos achamos onipotentes, onipresentes'

A ausência do senador Cid Gomes na campanha eleitoral de Fortaleza foi indicada, nos bastidores, como um possível sinal da insatisfação de lançar um candidato do PT para disputar o comando do Paço Municipal.

O ex-governador, no entanto, entrou na campanha no 2º turno da disputa, quando participou de atos ao lado de Evandro Leitão e organizou uma reunião entre o então candidato e todos os prefeitos eleitos pelo PSB em 2024 — o partido elegeu 65 gestores municipais, sendo o partido que mais conquistou prefeituras no Ceará.

Ao comentar sobre o desempenho do PSB nas eleições municipais, justamente no evento feito em apoio a Evandro Leitão, no dia 21 de outubro, Cid voltou a falar de "entendimentos com outros partidos", mas sem citar diretamente o PT. 

"Saímos das eleições com 65 prefeitos e 56 vice-prefeitos. Isso mostra de um lado que nós somos, individualmente, a maior força política do Estado e, por outro lado, mostra também a disposição que nós temos de fazer entendimentos com outros partidos para nos apoiar, mas também para apoiarmos os outros partidos", disse.

Ele reforçou que o número de vice-prefeituras conquistadas pelo PSB mostra que as lideranças do partido não se acham "donos da verdade, onipotentes, onipresentes. E acreditamos que alianças são fundamentais para que a gente possa ter o maior número de gestões comprometidas com o projeto", completou. 

Nesta terça-feira (19), está prevista uma reunião da Executiva estadual do PSB Ceará. Conforme o presidente da legenda, Eudoro Santana, o encontro deve ocorrer na sede do partido, ainda sem hora marcada.