A eleição de Evandro Leitão (PT) para a Prefeitura de Fortaleza marca, definitivamente, um redesenho das forças políticas do Ceará tanto a nível estadual quanto municipal.
Em um movimento que começou em 2022, com o racha do PDT e o fim da aliança da sigla com o PT, Camilo Santana (PT) passou a liderar um grupo político no Estado ao mesmo tempo em que seus aliados de primeira ordem, como o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) e o ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT), abriram uma nova frente de oposição.
Nomes mais alinhados à direita, como o ex-deputado Capitão Wagner (União), agora dividem espaço em outra linha oposicionista com o “bolsonarismo raiz”, representado pelo deputado federal e candidato derrotado à Prefeitura de Fortaleza, André Fernandes (PL).
O PontoPoder conversou com analistas políticos para mostrar quais nomes ganharam força e quais perderam influência com o resultado nas urnas na Capital. Uma das unanimidades apontadas por eles é a vitória simbólica de Camilo Santana. O petista foi o principal fiador da campanha de Evandro Leitão e agora colhe os louros de sua articulação local.
Bônus da vitória
A imagem do ministro, que deixou o governo em 2022 com aprovação recorde, foi explorada de forma massiva por Evandro. Esse resultado soma-se ao “currículo” de Camilo, segundo os pesquisadores, assim como a vitória do governador Elmano de Freitas (PT) no primeiro turno em 2022.
“Quem mais ganhou na disputa de Fortaleza foi, sem dúvida, o Camilo e o Elmano. Eles foram os fiadores da candidatura do Evandro Leitão, principalmente o Camilo, que teve a sua imagem bastante utilizada e teve um peso muito grande na reta final da disputa. Certamente isso vai ser mobilizado por ele para a próxima disputa, em 2026, como forma de reforçar o grupo e até mesmo, quem sabe, para a disputa nacional, já que ele é um nome cogitado para a Presidência da República”, avalia o cientista político Cleyton Monte, que também é professor universitário e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem) da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres destaca a importância das eleições municipais para consolidar um grupo político, já que a influência sobre os municípios é fundamental para as estratégias das eleições gerais.
“O Camilo aparece como esse nome de peso que aglutina forças, que organiza o grupo e tem sido importante cabo eleitoral nas eleições majoritárias. Quando a gente pensa em líder político, a gente está pensando não só na força de si, mas na sua capacidade de organizar e manter a coesão do grupo, de conseguir eleger e de transferir, em alguma medida, o seu capital político para outras lideranças”
Outro petista que teve a imagem muito usada na campanha em Fortaleza foi o presidente Lula. O chefe do Executivo nacional desembarcou no Ceará duas vezes em prol de Evandro. Na convenção, o político esteve no ato que lançou a chapa do PT Fortaleza. Já no segundo turno, o presidente voltou ao Estado para um ato na Praça do Ferreira. A vitória de Evandro nas eleições deste ano representou a única do PT em uma capital.
A professora aponta ainda o papel do senador Cid Gomes (PSB). Responsável por comandar o grupo político que mantinha uma aliança histórica entre PT e PDT, o parlamentar viu seus aliados se dividirem em 2022. De um lado, Camilo Santana, que manteve-se aliado de Cid, ganhou força naquele pleito; de outro, Ciro Gomes, seu irmão, perdeu força, influência e acumulou derrotas. Os irmãos, inclusive, romperam politicamente há dois anos.
O pleito deste ano colocou à prova a influência de Cid Gomes onde ele sempre se mostrou mais forte: na articulação dos prefeitos. E o senador do PSB novamente mostrou sua capacidade de articulação, segundo os analistas políticos. O partido de Cid conseguiu eleger 65 prefeituras, tornando-se a maior sigla do Ceará.
“Cid consegue manter sua força. A despeito dos reveses, ele ainda é relevante, tem um grupo político para chamar de seu e ainda consegue aglutinar. Esse esforço de eleger o maior número de prefeitos do PSB é uma demonstração de que ele ainda quer manter algum nível de influência estadual. Na próxima eleição, em 2026, é possível que ele concorra novamente a algum cargo, talvez tentar a reeleição para o Senado ou, pleitear outro cargo”, acrescenta Monalisa Torres.
“Camilo, Elmano e Lula saem fortalecidos como lideranças de esquerda, enquanto Cid Gomes provou, de maneira inquestionável, seu alto poder de articulação para a composição das Prefeituras no interior do Estado”
Ônus da derrota
Do outro lado da balança estão nomes que foram derrotados nas urnas ou apostaram em candidaturas que não conquistaram o Paço Municipal.
“E quem mais perdeu, na minha avaliação, foi o prefeito José Sarto e o Capitão Wagner. O Sarto por estar na Prefeitura (e ser derrotado), é um fato inédito, então isso, para a carreira política dele, é muito forte e marcante porque, além de perder, ele perdeu da forma que perdeu, com uma votação insignificante para quem está no exercício do cargo. Ele foi o grande perdedor dessa disputa, e o PDT em torno dele. E também o Capitão Wagner, como uma liderança da centro-direita, acredito que a capacidade dele de aglutinar para uma próxima disputa estará seriamente comprometida”, avalia Cleyton Monte.
Derrotados no primeiro turno, José Sarto e Capitão Wagner obtiveram 11,75% e 11,40% dos votos válidos. O pedetista foi o primeiro prefeito da Capital que disputou a reeleição e não conseguiu conquistá-la. Já o candidato do União Brasil amargou sua pior derrota em disputas majoritárias.
Para os cientistas políticos, o caso do PDT é o mais delicado. A sigla, que elegeu mais de 60 mandatários em 2020, contabilizou apenas cinco no pleito deste ano — perdendo inclusive a Capital. O partido ainda se viu novamente dividido, com uma ala da sigla apoiando a candidatura de Evandro, outro grupo apoiando André Fernandes, além de uma terceira ala que se disse neutra.
“Para Ciro Gomes e Sarto, o resultado não poderia ser menos animador, porque o apoio à candidatura de André Fernandes à revelia do presidente nacional da legenda consolidou, ainda mais, o panorama de terra arrasada para o PDT, evidenciando a fragmentação do partido. Para Roberto Cláudio, a lealdade às lideranças do PDT local, que justificaram o apoio a um projeto de governo completamente divergente da própria trajetória política, deixou uma impressão de descrédito e revanchismo contra o PT. Ao apostar todas as fichas na candidatura de André Fernandes, Roberto Cláudio enterrou o próprio discurso e tornou ainda mais complexo o diálogo com antigos apoiadores”
Monalisa Torres avalia ainda a situação de Ciro Gomes, que tem acumulado derrotas na sua carreira. Em 2022, ele ficou em quarto lugar na disputa pela Presidência da República, perdendo até no Ceará, onde ficou em terceiro lugar. No pleito deste ano, foi um dos principais defensores da candidatura à reeleição de Sarto. Já no segundo turno, ele não chegou a anunciar apoio explícito a André Fernandes, mas endossou a oposição a Evandro Leitão.
“O Ciro se encaminha para o ostracismo. Não que a derrota do André seja creditada a ele. A derrota do André é do André, a forma como ele construiu a campanha, se desvencilhando dos seus padrinhos, explica isso. Embora ele tenha recebido muitos aliados nesta reta final, a derrota é creditada a ele ou ao sucesso do Evandro muito mais do que uma derrota do Ciro, do Sarto ou do Roberto Cláudio”, aponta Monalisa Torres.
“É a mesma coisa em relação ao Wagner, a derrota dele foi no primeiro turno, não agora com o André. O que ele experimentou foi uma derrota como liderança política, ficou demonstrado ali que talvez ele precise se reciclar e repensar seus posicionamentos”, finalizou.