O ano eleitoral já começou agitado na política de Iguatu. Mal sentou novamente na cadeira de prefeito, após o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) restituir seu mandato por liminar, Ednaldo Lavor (PSD) passou a fazer acusações a Ronald Bezerra (Republicanos), retirado do comando interino do município e reempossado presidente da Câmara recentemente.
Os atritos são um preâmbulo do que pode se tornar a disputa eleitoral de outubro com a última reviravolta e com os nomes que estão à disposição no momento.
Diante do atraso no salário dos servidores, que não receberam o pagamento de dezembro, o gestor disse, em transmissão ao vivo pelas redes sociais, que Bezerra deixou os cofres públicos quase zerados para esse fim.
“Para a nossa surpresa, não existe dinheiro para pagar o servidor efetivo da Prefeitura de Iguatu, muito menos os temporários e os contratados. Pegaram dinheiro do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) e gastaram, pegaram dinheiro do Fundo Geral e gastaram”, disse Lavor.
“Lamentavelmente, o ex-prefeito interino Ronald Bezerra decidiu pagar outras prioridades, deixando os cofres do município com quase nada para pagar o servidor”, denunciou, ainda.
Em sua defesa, o vereador explicou que, em 28 de dezembro, o município recebeu mais uma parcela da recomposição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), mas o valor que caiu nas contas da gestão veio com desconto relativo a “empréstimos de administrações passadas”, no valor de R$ 677 mil.
Assim, no fim, Iguatu ficou com R$ 1,76 milhão do aporte que, junto a outras fontes de receitas, foi direcionado prioritariamente para o pagamento do 13º salário no município.
“Com relação ao Fundeb, quando deixamos a Prefeitura de Iguatu, existia na conta a importância de aproximadamente R$ 1,5 milhão. Com a parcela que entrou de R$ 337 mil reais, existe na conta da Prefeitura e do Fundeb mais de R$ 1,8 milhão. Por isso, o que foi dito aí pelo prefeito cassado é a pura mentira, é uma enganação, está querendo ludibriar os funcionários do município de Iguatu”, completou.
O ex-prefeito interino também registrou um Boletim de Ocorrência (B.O.) contra Lavor por calúnia. Ao Diário do Nordeste, o gestor disse que não chegou a ser intimado e defende-se das acusações de Bezerra. “Ele só corrobora com o que eu havia dito. Eu disse que recebi o município apenas com R$ 1,3 milhão, mas como paga uma folha de R$ 13 milhões com isso?”, questiona.
Depois de toda essa confusão, os salários foram pagos, mas o assunto ainda tem potencial para reverberar em outras frentes, como o próprio Ministério Público. Enquanto isso, a rivalidade segue.
Contratempo em Iguatu
As movimentações em torno do pagamento dos servidores têm ganhado um tom político, sobretudo na última semana. Um reajuste de 8% nos salários pagos pela Prefeitura chegou a ser apreciado pela Câmara Municipal, o que imporia mais um desgaste à atual gestão. Contudo, a Mesa Diretora retirou o projeto de pauta devido à falta de consenso entre servidores, abrindo diálogo para a construção de um novo texto.
É o mesmo que faz o prefeito Ednaldo Lavor. Ao Diário do Nordeste, ele informou que vai se reunir com as entidades trabalhistas para discutir o reajuste em um modelo adequado aos dois lados. “Não podemos ser irresponsável de inflar a folha pagamento e não ter como pagar”, disse.
Quem também entrou no embalo pela atenção dos servidores de Iguatu foi Ilo Neto (PSB), filho do deputado estadual Agenor Neto (MDB) e possível candidato à Prefeitura. Pelas redes sociais, o engenheiro informou que protocolou uma manifestação junto ao Ministério Público sobre o assunto, solicitando uma investigação sobre o atraso no pagamento dos salários.
“Não podemos admitir que uma briga política entre aliados prejudique a vida de centenas de famílias que precisam de seus salários para que possam honrar os seus compromissos”, disse Ilo.
Segundo o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), por meio da 5° Promotoria de Justiça de Iguatu, há duas notícias de fato sobre o assunto em andamento. Uma protocolada pelo Sindicato dos Servidores Públicos de Iguatu e outra por vereadores locais.
Em consulta aos autos, o Diário do Nordeste constatou que os parlamentares são Francisco Benigno de Sales Neto (Louro da Barra, do SD), Lindovan Silva Oliveira (PSB), Pedro José de Araújo (PSB) e Marciano Lima Macedo (Marciano Baião, do SD).
Prévia eleitoral
O embate entre o presidente da Câmara e o prefeito mostra uma divisão mais nítida de forças no município do Centro-Sul cearense a poucos meses das eleições de outubro. Como Ilo deu a entender, Bezerra e Lavor nem sempre foram adversários.
O primeiro chegou ao comando do Legislativo com o apoio do prefeito no fim de 2022, em estratégia para manter um aliado no Executivo após a destituição promovida pela Justiça Eleitoral. Antes disso, a própria primeira-dama de Iguatu, Eliane Braz (PSD), comandou o município, já que era a presidente da Câmara à época da cassação do marido.
A amizade virou rivalidade em meados de julho do ano passado, relata Bezerra. Segundo ele, a falta de “alinhamento” foi o motivo. Àquela altura, o prefeito interino já chegava a quase metade da sua gestão, enquanto Lavor amargava mais um mês de afastamento das funções.
Com mandatos restabelecidos, ambos ganham fôlego para a disputa nas urnas, já que o vereador é pré-candidato à Prefeitura pelo Republicanos. Ele informou ao Diário do Nordeste que ainda não há aliados definidos, o que deve ser acertado entre março e abril. Até lá, o diálogo está aberto com o PT, cujo diretório municipal anunciou o empresário Sá Vilarouca como pré-candidato, e com o PDT, que até o momento abriga parte da família Sobreira.
Já Ednaldo finaliza, em 2024, o segundo mandato seguido no Executivo, o que requer a indicação de um sucessor. Na quinta-feira (11), ele encontrou o presidente estadual do PSD, Domingos Filho, ocasião em que trataram sobre eleições.
Em contato com a reportagem, ele repetiu o que outros políticos de Iguatu têm declarado sobre o pleito: o cenário ainda é incerto. A única certeza que deu é que o PSD terá candidatura própria na cidade.
Impasse no Governo
Em Iguatu, ao menos duas fortes famílias tentam voltar ao poder. Uma é representada pelo deputado estadual Marcos Sobreira, pelo seu pai e ex-prefeito Marcelo Sobreira e pela sua mãe, a ex-deputada Mirian Sobreira. Outra é pelo deputado estadual Agenor Neto, filho do ex-deputado e ex-prefeito de Quixelô – também no Centro-Sul – José Ilo Dantas, falecido no ano passado. Este também fez carreira política em Iguatu como secretário municipal.
O problema para os dois grupos esbarra numa incógnita: o apoio do Governo do Estado na cidade. Deputados da base de Elmano de Freitas (PT) na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), naturalmente, eles querem contar com esse capital político nas eleições, mas são adversários em Iguatu.
Eles não são os únicos pleiteando a atenção do Governo em Iguatu: o próprio PSD de Ednaldo Lavor busca um entendimento nesse sentido, em busca de repetir a aliança constituída a nível estadual.
Além disso, há outro entrave nessa relação: a posição do PT municipal sobre o pleito. Em agosto do ano passado, o diretório lançou o empresário Sá Vilarouca como pré-candidato à Prefeitura. Segundo ele, a escolha é definitiva, falta apenas definir os partidos aliados.
“A gente já tem naturalmente a aliança com o PCdoB e o PV, estamos também muito afinados com o Psol. [...] Estamos conversando com vários outros partidos porque entendemos que a eleição de Iguatu precisa comportar uma aliança ampla, a gente não vai ter essa coisa de estar escolhendo parceiros, a ideia é que a gente dialogue muito com todos as forças políticas no sentido de que a nossa proposta seja trabalhada”, diz.
Já o MDB não quer andar ao lado do PT na condição de candidato a vice-prefeito, mas não descarta aliança em Iguatu. Segundo o presidente estadual do partido, Eunício Oliveira, a intenção é lançar um nome próprio, podendo ser Agenor Neto ou o seu filho, Ilo Neto, que é filiado ao PSB atualmente. Este, inclusive, intensificou a agenda política no município por ser a aposta para a eleição suplementar, que não chegou a acontecer devido à suspensão demandada pelo TSE. A investida, então, segue fresca para outubro de 2024.
Os dois fazem acenos intensos ao PT estadual, nas figuras de Elmano e do ministro Camilo Santana, e ao nacional, representado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Diante do impasse, chegou-se a especular que o Governo escolheria um nome comum aos diversos grupos políticos da região, a fim de atender as demandas e evitar desgaste com aliados.
Questionado sobre essa possibilidade, mais especificamente em relação ao clã Sobreira – sobretudo com a provável migração de Marcos ao PSB, que já abriga Ilo –, Eunício foi enfático. “Marcos é do PDT do Roberto Cláudio… E o PT lá é menor que MDB e deveria compor conosco, como vamos fazer em vários municípios, inclusive Fortaleza”, disse.
Para o deputado estadual, o apoio do PT nos últimos pleitos pode se repetir neste ano. “Sou da base do Governo. O PT esteve aliado comigo nas últimas quatro eleições municipais. Possivelmente estaremos juntos novamente nesse ano com o PT de Iguatu. O apoio do Governador é uma coisa pessoal dele, mas lutaremos por isso. É muito importante”, disse Marcos Sobreira.
Por isso, segue em conversas com petistas no município e com o Republicanos por meio do presidente da Câmara, Ronald Bezerra. Também aguarda a conclusão de processo judicial sobre a sua desfiliação do PDT. Caso teve aval da Justiça para tal, o parlamentar pode seguir para o PSB, presidido por Eudoro Santana no Ceará e legenda que passará a acomodar o grupo político ligado ao senador Cid Gomes a partir de fevereiro.
Quanto a Lavor, mesmo com cenário incerto sobre alianças, ele afirma ser necessário ouvir Camilo Santana e Elmano para chegar a um denominador e definir com quem vai caminhar em outubro deste ano.
“O Agenor faz oposição aqui, o Marcos Sobreira não sei qual o posicionamento que terá, até porque o PDT vai perder muita gente e aqui no PSB tem o Ilo Neto. Eu não sei se essa água vai se misturar com esse vinho, não”, calcula.
Com o passar dos meses, as dinâmicas eleitorais em Iguatu se tornarão mais nítidas. Em agosto começa o período de convenções partidárias, mas antes disso, em abril, acaba o prazo de filiação de pré-candidatos. Até lá, alguns chaveamentos já devem ter discussões mais avançadas.