Em live convocada com o argumento de comprovar fraude nas urnas eletrônicas, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assumiu que não tem provas de irregularidades, mas apresentou o que chamou de "fortes indícios".
Durante cerca de duas horas de transmissão, ele mostrou vídeos e teorias das redes sociais - já desmentidos por agências de checagem - e até uma simulação indicando que urnas poderiam ser fraudadas.
"Não tem como se comprovar que as eleições não foram ou foram fraudadas. São indícios. Crime se desvenda como vários indícios", declarou o chefe do Executivo Nacional, que levou para a exibição dos indícios uma pessoa identificada apenas como Eduardo, que seria um "analista de inteligência".
O analista apresentou vídeo que supostamente mostra que é possível fraudar o código-fonte das urnas, gerando erros como mudança de votos para nulo e candidatos recebendo votos errados. O vídeo circula na internet desde 2018 e já foi desmentido por agências de checagem.
Na gravação, um homem que se apresenta como desenvolvedor de sistemas, apresenta o que chama de "simulador simplificado da urna eletrônica". O programa que ele mostra, porém, não tem qualquer relação com o sistema usado nas urnas desde 1996 - que é aperfeiçoado periodicamente.
"Isso aconteceu largamente em 2018. Tem vários vídeos demonstrando exatamente isso aí. E agora? Vamos deixar isso acontecendo? Acabando as eleições, vamos judicializar. E quem vai julgar? Os mesmos que tiraram o Lula da cadeia e contam os votos na sala secreta", disse Bolsonaro.
Reportagens jornalísticas, checadores e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já mostraram, diversas vezes, que esses tipos de fraudes não são possíveis, e que os vídeos que circulam na internet não indicam qualquer tipo de irregularidade ou que alguma urna tenha sido corrompida.
Checagem do Projeto Comprova, divulgada pelo TSE no Twitter, na noite desta quinta-feira, durante a live de Bolsonaro, mostrou que o sistema usado no vídeo apresentado para simular fraude não é o mesmo das urnas eletrônicas.
"Fortes indícios" na internet
A pessoa apresentada como Eduardo, que aparece ao lado de Bolsonaro para denunciar os "fortes indícios" fraudulentos, citou que o brasileiro que desconfia das eleições "viu alguma coisa na internet ou na TV".
"Há uma desconfiança de boa parte da população sobre nossas urnas eletrônicas. O brasileiro não se sente confortável. Queremos demonstrar que as urnas precisam de melhorias. Vamos mostrar fatos, acontecimentos, alguns que até a maioria da população já viu na internet", pontua.
Embora tenha prometido provas, em determinado momento da transmissão, o presidente transferiu para a responsabilidade de mostrar fatos concretos a quem defende o sistema:
"Será que esse modo de se fazer eleições é seguro, é blindado? Os que me acusam de não apresentar provas, eu devolvo a acusação. Me apresente provas [de que] não é fraudável", desafiou.
Ataques ao TSE
O presidente repetidamente afirmou que o TSE e o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, incentivam a derrocada do processo democrático e se utilizam de "salas secretas" para contar os votos das eleições.
"Por que o presidente do TSE quer manter suspeição das eleições? Quem ele é? Por que ele fica interferindo por aí, com que poder? Não quero acusá-lo de nada, mas algo muito esquisito acontece", disse Bolsonaro.
Logo após as declarações, o TSE respondeu nas redes sociais e publicou uma peça no estilo "fato ou boato" afirmando que "resultado da eleição não é apurado de forma secreta".
"Apuração dos resultados é feita automaticamente pela #UrnaEletrônica ao encerramento da votação. Os dados criptografados são transmitidos ao TSE, que checa a autenticidade/integridade e faz a totalização, em processo público e auditável", informou o órgão.
Bolsonaro e o voto impresso
O presidente abriu o evento com um discurso de cerca de 40 minutos, sem abordar especificamente as provas que havia prometido. Tratou de remédios sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19, novamente criticou governadores e prefeitos que promoveram isolamento social e mencionou políticas de seu governo
Bolsonaro também criticou, por diversas vezes, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O presidente então repetiu a mentira de que a contagem das eleições hoje seria secreta e de que quer uma apuração pública, algo que não faz sentido, pois atualmente o processo de totalização dos votos já pode ser auditado, inclusive com um registro impresso, que é o boletim da urna.
Os boletins de urna são distribuídos aos partidos políticos e afixados nos locais de votação em cada seção eleitoral. A impressão e publicidade dada aos boletins de urna impressos às 17h em cada seção eleitoral garantem a auditoria e impedem fraudes na totalização, pois uma diferença entre os números impressos e os totais podem ser identificados.
A proposta do voto impresso em debate no Congresso e defendida por Bolsonaro não provocaria alterações na contagem dos votos.