A quatro meses do prazo limite para promover mudanças nas regras eleitorais que possam valer já para as eleições de 2022, parlamentares correm contra o tempo em busca de um consenso no Legislativo. Deputados da bancada cearense enxergam com cautela as mudanças propostas - que incluem até nova data para o pleito - e criticam as articulações a pouco mais de um ano da nova disputa nas urnas.
Há cerca de um mês, a Câmara dos Deputados instalou uma comissão especial para debater a chamada PEC da reforma eleitoral. Entre os assuntos discutidos, o grupo avalia a realização de pleito único para todos os cargos eletivos, a implantação do “distritão”, a reserva de vagas para mulheres e até mudanças nas datas das eleições.
Para o deputado federal José Guimarães (PT), o momento político não é favorável às mudanças. “Essas reformas de meia tigela só atrapalham o processo eleitoral. Por três anos de mandato ninguém faz discurso de ampla e profunda reforma, mas, quando a eleição se aproxima, querem mudar por interesse próprio”, critica.
“Não vamos aceitar alteração, não dá para tratar isso de uma hora para outra, é uma marmota o que querem fazer.”
Manobra na Câmara
A própria implantação da Comissão é resultado de uma manobra na Câmara, já que os deputados resgataram uma PEC apresentada em 2011 – que já passou pela Comissão de Constituição e Justiça, e tratava sobre a proibição de eleições em data próxima a feriados nacionais – para tentar “encurtar o caminho” da tramitação.
Liderada pelo deputado Luis Tibé (Avante-MG), a comissão tem como relatora a deputada Renata Abreu (Podemos-SP). Ao todo, o grupo é formado por 34 membros titulares e 34 suplentes. A comissão realizará até 40 sessões e apresentará um parecer sobre as mudanças. A ideia dos parlamentares é incluir outras regras além da restrição a pleitos próximo a feriados.
Uma delas prevê a adoção do chamado “distritão”, que passa a eleger parlamentares que receberem o maior número de votos em cada estado, independentemente do partido.
Outra proposta de mudança mais polêmica avalia a adoção do voto impresso, para que um comprovante do voto passe a ser depositado em uma urna física, paralelamente ao registro digital. Todas essas propostas dividem os parlamentares.
Sem perspectiva
“Não creio que vá haver nenhuma mudança significativa, talvez uma ou outra mudança mais pontual, mas essa questão do distritão, por exemplo, acho uma possibilidade muito remota”, avalia o deputado federal André Figueiredo (PDT).
Para ele, ainda que haja empenho dos parlamentares, o tempo é curto para aprovação. Por se tratar de uma emenda à Constituição, essas mudanças precisam ser aprovadas em dois turnos, tanto na Câmara quanto no Senado, antes de outubro deste ano.
Para o deputado Heitor Freire (PSL), o prazo é apertado, mas não é o maior empecilho. “Depende mais de empenho e vontade política do que de tempo para aprovarmos a reforma eleitoral já para as próximas eleições”, aponta.
Mesmo integrando o grupo de suplentes da Comissão da reforma eleitoral, o deputado federal Danilo Forte (PSDB) também compartilha dessa avaliação.
“No Congresso, quando se quer votar, vira-se noite, acha-se espaço, mas é preciso ter uma construção consensual para isso. Neste caso, acho difícil construir grandes mudanças com uma reforma feita na véspera da eleição."
O tucano ressalta ainda que, mesmo em propostas mais discutidas entre os deputados, como o distritão, não há consenso.
“Tem o distritão, mas também tem o distrital misto, que se adequa melhor à proporção de cada região. De todo jeito, vamos ter muita dificuldade porque cada um quer fazer conforme seu interesse, pensando na própria reeleição”, critica.
No sistema distrital misto, metade das cadeiras seria ocupada pelo mais votado em cada estado e a outra metade eleita no sistema proporcional: uma votação em lista fechada de candidatos, feita pelos próprios partidos.
Sem coligação partidária
Em meio a essas incertezas e impasses, os parlamentares terão de enfrentar para o próximo ano novas regras eleitorais já aprovadas ao longo dos últimos quatro anos.
Será a primeira vez, por exemplo, que os deputados também irão disputar eleições sem que haja coligação partidária. Assim, os candidatos somente poderão disputar o cargo por meio de chapa única dentro do partido ao qual estão filiados.
Outra proposta já em vigor desde o pleito de 2018 é a cláusula de barreiras. Pela regra, os partidos precisam conseguir um número mínimo de votos nas eleições para ter acesso a recursos do Fundo Partidário e ao tempo de propaganda em rádio e TV.
A intenção da regra é reduzir o número de partidos políticos no País.
No caso da cláusula de barreira, alguns parlamentares tentam flexibilizá-la quatro anos após sua implantação. A alternativa é criar uma “federação partidária” que estabeleceria uma aliança entre dois ou mais partidos por, pelo menos, quatro anos.
Assim, eles poderiam somar os desempenhos para atingir a cláusula de barreira.
Veja algumas mudanças em análise na Comissão:
Distritão
Como é: as vagas são distribuídas proporcionalmente ao número de votos que candidatos e partidos recebem.
Como pode ficar: as eleições parlamentares passariam a ser majoritárias, assim os candidatos que recebessem mais votos estariam eleitos.
Unificar eleições
Como é: a cada dois anos, são escolhidos, de forma alternada, vereadores e prefeitos (em uma eleição) e deputados governadores, senadores e presidente (em outra eleição).
Como pode ficar: a cada quatro anos, haveria eleição para escolher todos os cargos.
Voto impresso
Como é: o voto é registrado de forma eletrônica nas urnas eleitorais.
Como pode ficar: além do registro digital, o voto também seria registrado em papel e deixado em uma urna.
Data da eleição
Como é: o primeiro turno das eleições ocorre no primeiro domingo de outubro do ano respectivo.
Como pode ficar: seriam adiadas eleições marcadas para data próxima a feriado.
Vagas efetivas para mulheres
Como é: não há vagas reservadas para mulheres, elas disputam com todos os candidatos.
Como pode ficar: haverá um percentual de cadeiras no Legislativo destinado para candidatas.
Federação partidária
Como é: cada partido disputa vaga com seus próprios candidatos, sem coligações.
Como pode ficar: alguns partidos podem formar grupos com vigência de quatro anos.