É curioso observar como os políticos se apropriam do humor, dos memes, do assunto da vez nas redes sociais para demarcar posição num território que está constantemente em disputa. Do Big Brother Brasil (BBB), terminado há algumas semanas, à CPI da Covid-19, comentada em tempo real por milhares de espectadores na internet, fica evidente como a busca por engajamento é, cada vez mais, uma estratégia política valiosa.
A agenda política brasileira, marcada por sucessivas crises ao longo dos últimos anos, tem feito sessões do Supremo Tribunal Federal (STF), votações no Congresso Nacional e outros acontecimentos serem consumidos como programas de TV.
Diante de audiências expressivas, as redes sociais convertem-se, com frequência, em uma espécie de segunda tela: ao abrigarem repercussões instantâneas e os desdobramentos delas, são também termômetros dos fatos.
Numa lógica de comunicação direta muitas vezes ilusória, entre representante e representado, elas podem ser usadas como instrumentos de pressão, de prestação de contas - além de muitas outras apropriações.
Sendo uma arena de debate público, contudo, não apenas opiniões estão em jogo ali. O alcance dos memes é também balizador de afetos. Sabe o discurso bastante ouvido, vindo de políticos, de que uma eleição é uma disputa por mentes e corações? Acontece o tempo todo entre um post e outro. Até mesmo quando quem vê nem percebe.
Cearenses aderem aos memes
Para ficarmos nos memes, basta lembrar que o fenômeno Juliette, grande vencedora do BBB 21, chegou também a políticos cearenses: os deputados federais Domingos Neto (PSD) e Eduardo Bismarck (PDT) são alguns dos que levaram a estética dos cactos e dos chapéus de couro, adotada pela torcida da campeã do reality show, para as redes sociais.
O pedetista, aliás, assim como o vereador de Fortaleza Júlio Brizzi (PDT), aproveitou a viralização do novo single da cantora Anitta, “Girl from Rio”, e se rendeu aos memes que fazem referência ao trabalho da funkeira.
Quem lembra quando o vereador Carlos Mesquita (PDT), decano da Câmara Municipal de Fortaleza, entrou na onda dos vídeos do “TikTok” dançando e apontando “fatos sobre mim” durante a campanha eleitoral de 2020? Isso só para citarmos alguns exemplos.
Interações na CPI
As aproximações que publicações do tipo são capazes de provocar também são buscadas a partir de outras ferramentas. Na CPI da Covid-19, que tem tido estrondoso alcance nas redes sociais, muitos senadores têm feito questão de interagir com seus seguidores sobre os trabalhos.
Nesta semana, um dia antes do depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), pediu no Instagram perguntas que a população gostaria de fazer ao militar. No dia seguinte, durante o interrogatório, leu algumas, dando destaque ao fato de terem sido feitas por “internautas”.
Cada depoimento rende uma enxurrada de comentários, memes, reposts, todos acompanhados atentamente pelos parlamentares – ou melhor, por suas equipes. Algumas menções, devidamente respondidas, chegaram até mesmo a pautar abordagens durante a CPI.
Diferentemente de outros casos, os senadores não embarcam no entretenimento que também tem sido levado às redes sociais a partir da Comissão Parlamentar de Inquérito. De fato, não cabe a nenhum deles fazer isso. Tem ficado por conta dos espectadores.
Linha tênue
Não é que o humor não tenha a capacidade, na internet, de dar visibilidade a temas importantes na política e até de aproximar certas discussões de outros públicos.
Isso existe e precisa existir, mas também pode ser tênue, em algumas situações, a linha entre o uso como elemento agregador ao debate público e a espetacularização capaz de mais prejudicar do que beneficiar a forma como certas agendas devem ser encaradas.
Esta é, contudo, ainda uma seara repleta de questões em aberto. Daí a importância de que a curiosidade, aquela presente ainda no início deste texto, esteja sempre presente. Os modos como todos nós podemos nos posicionar diante de tais estratégias são também determinantes para que, afinal, sejam úteis à democracia.