Como a declaração de Sarto em apoio a Roberto Cláudio mexe com a disputa interna do PDT

O ex-prefeito de Fortaleza já foi tido como "candidato natural", mas crescimento de Izolda pôs em xeque a preferência

A declaração pública do prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT), de que apoia o ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT) como candidato ao Governo do Ceará em detrimento dos outros três pré-candidatos, marca um novo momento na disputa interna do PDT na sucessão de Camilo Santana (PT).

A cerca de quatro meses da definição das chapas, as afinidades, as preferências políticas e os cálculos de estratégias começam a ficar mais explícitos. 

O apoio direto de Sarto a Roberto Cláudio acontece em um cenário em que a vice-governadora Izolda Cela (PDT) ganha força e elogios públicos de lideranças do grupo, como o próprio governador. 

Além disso, a pedetista deve assumir o Governo do Estado a partir de 2 de abril, como a primeira mulher líder do Poder Executivo estadual, o que, por si, já tem potencial de engajar o eleitorado entorno de Izolda.  

Questionado nesta quinta-feira (3) sobre a preferência entre os quatro pré-candidatos do PDT, Sarto não titubeou: "Compreendo que, pelo contexto atual, pelo que representa hoje a política, que deve combater o ódio, deve ter muita tranquilidade. O nome que hoje representa, encerra e traduz, a meu juízo, o melhor nome do PDT, que tem juventude, experiência, conhece o Ceara, é o Roberto Cláudio".  

Depois, elogiou os outros nomes e ressaltou que é a conjuntura partidária, PDT e aliados, que escolherão o melhor nome. Mas é claro que o posicionamento público mexe com as intenções de escolha. 

O movimento de apoio a Roberto Cláudio estimulado por Sarto deve desencadear manifestações públicas de outros aliados, principalmente na Capital. O ex-prefeito foi peça fundamental no sucesso eleitoral não só de Sarto em 2020 e pode agora cobrar a reciprocidade daqueles que já ajudou.

O posicionamento acontece ainda poucos dias após encontro de Sarto com Roberto Cláudio e o irmão do ex-prefeito e senador suplente de Cid Gomes, Prisco Bezerra. O prefeito integra o grupo político há cerca de 30 anos, conhece os meandros das articulações internas e tem ciência de até onde pode ir com os movimentos públicos.

Força da Capital

Sarto, além de prefeito da Capital, que detêm 25% do eleitorado do Estado, movimenta ainda a base de vereadores e suas lideranças comunitárias. Eleito em uma disputa acirrada em 2020, o ex-presidente da Assembleia tem ciência do quanto a figura de Roberto Cláudio pesou a seu favor na disputa. 

O ex-prefeito terminou os oito anos de gestão com 52% de avaliação ótima/boa e 66% de aprovação, segundo pesquisa Ibope, divulgada pela TV Verdes Mares em novembro de 2020.

Ao deixar a Prefeitura, Roberto Cláudio era cotado como "candidato natural" à sucessão de Camilo entre boa parte dos aliados. No entanto, o crescimento de Izolda, as estratégias de fortalecimento da oposição e o engajamento de outros dois nomes na disputa afastaram supostas garantias.

No segundo semestre do ano passado, o PDT anunciou, além de Roberto, Izolda, o deputado federal Mauro Filho e o presidente da Assembleia Legislativa, Evandro Leitão.

Fator PT

Um dos principais entraves que Roberto Cláudio tem encontrado é a resistência de alas petistas, principalmente encabeçadas pela ex-prefeita Luizianne Lins, adversária política do ex-prefeito nas campanhas municipais desde 2012. 

Nos bastidores, o grupo de Luizianne tanto defende uma candidatura própria do PT como resiste à possibilidade de o candidato ser o ex-prefeito. 

O encontro inédito entre Luizianne Lins e Izolda Cela em fevereiro jogou mais peso no impasse e fortaleceu o nome da vice-governadora. A opositora de Roberto Cláudio tem eleitorado forte na Capital, principalmente nas áreas em que o pré-candidato da oposição ao Governo, Capitão Wagner (Pros), também atua. 

"Roberto tem capacidades que são extraordinárias para construir um diálogo. Também acredito que a maturidade deve pesar quando a gente pensar, por exemplo, em vetar alguém", disse Sarto nesta quinta. 

Roberto Cláudio tem evitado falar sobre resistências ao seu nome no PT. 

"Não ouvi de ninguém, estou ouvindo pela imprensa. Comentar alguma coisa que nunca foi lhe dito, que você não tem intimidade com o assunto é algo que não ajuda na construção. As preferências, a opiniões, os desejos são todos parte do processo de escolha política, mas deve ter um propósito motivador para nos unir", disse durante almoço com empresários no Lide, no mesmo dia do encontro entre Izolda e Luizianne.

Projeção de Izolda

Ainda que figure de forma tímida nas articulações partidárias, Izolda Cela foi alçada à política diretamente de Sobral, o berço dos ex-governadores Cid e Ciro. Ela é ex-secretária da Educação de Sobral e do Estado, pioneira de projetos de educação que resultaram na projeção nacional da educação básica cearense. A pauta é forte para uma disputa eleitoral.

Izolda também será a primeira governadora do Ceará a partir de abril. Além da máquina pública, terá contato direto com deputados e prefeitos. Na reta final do Governo Camilo, a vice tem acompanhado o governador em boa parte dos eventos pelo Estado.

Roberto Cláudio também está em campo. Tem feito palestras e visitado municípios, resgatando o diálogo com lideranças do Interior, algo que fez quando foi deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa. 

A mobilização discreta de Evandro Leitão

Mais novo do grupo político, o presidente da Assembleia Legislativa não parece ainda ser foco de paixões entre aliados. Afinal, está no segundo mandato como deputado estadual, com uma carreira precoce no grupo. Em menos de oito anos, foi líder do Governo e, em seguida, presidente do Legislativo.

No ano passado, quando assumiu o Governo do Estado interinamente na ausência de Camilo e Izolda, Evandro cumpriu agenda intensa pelo Estado ao lado de prefeitos e tem tentado manter os vínculos de olho nas possibilidades no PDT.

Na quarta-feira (2), ao lado do líder do Governo na AL, Júlio César Filho, reuniu pré-candidatos a deputado para articular chapa forte para o grupo político. 

Na queda de braço entre Izolda e Roberto Cláudio, não seria estranho se Evandro se sobressaísse. Em 2014, o PDT apresentou cinco nomes, mas não efetivou nenhum deles. Camilo Santana se tornou o candidato do grupo correndo por fora.

Mauro Filho

Um pouco mais longe dos holofotes na disputa pelo Governo, o ex-secretário do Planejamento segue articulando alianças com prefeitos e vereadores nos municípios. 

O movimento de Sarto em tomar partido na disputa pode mexer com outras peças na mobilização interna do PDT. É ver se outros nomes também tornarão explícitas suas preferências. Nome que ganha projeção também fica a mercê dos ataques. Mas a hora de testar as temperaturas antes das eleições de fato é agora.