Iguatu, no Ceará, e Patos, na Paraíba são municípios que apresentam certas similaridades. População e renda per capita, por exemplo, são alguns pontos semelhantes entre as duas cidades do interior do Nordeste.
Cidade/População/Renda per capita/Distância à cidade polo
Iguatu/98 mil/1,6 salário mínimo/154,2 km (Juazeiro do Norte)
Patos/103,1 mil/1,9 salário mínimo/178 km (Campina Grande)
Ambas as cidades também possuem cursos de medicina, por exemplo, e possuem voos comerciais. Patos concentra produção de energias renováveis, como eólica e solar, e Iguatu é um polo moveleiro para o Nordeste.
Os aeroportos das cidades possuem pistas de 30m de largura, com leve vantagem para Patos, que possui 1.600m de comprimento de pista; Iguatu possui 1.410m. Se dependesse apenas do comprimento de pista, ambos os aeroportos permitiriam operações de aeronaves regionais como o ATR-72, porém Patos possui uma pista com menos resistência ao peso de aeronave: PCN 6; Iguatu PCN 30 (Pavement Classification Number).
Na aviação comercial, as coincidências acabam aí.
Patos é a cidade com a segunda maior oferta de assentos comerciais da Azul Conecta, até mais que Fortaleza. A cidade paraibana tem voos 6 vezes por semana e, em agosto, conseguiu ocupações de até 50% em seus voos, maior que a média nacional da Conecta, que é de 33%.
Em agosto, Patos teve 225 assentos de partida para serem comercializados. Os voos da Azul Conecta se iniciaram em agosto de 2021 e terminaram o ano com 78% de ocupação, o que realmente marca a cidade como prodígio para a companhia sub-regional.
Já Iguatu acumula um dos piores resultados da aviação comercial da Conecta no Brasil. Em agosto, por exemplo, teve 54 assentos de partida sendo vendidos e comercializou apenas 4.
Os voos de Iguatu para Fortaleza são vendidos com escalas em Crateús, desde setembro, justamente, numa tentativa de otimizar as fracas operações. Até agora, não houve bons resultados.
Assim, o que pode explicar cidades de perfis econômicos, demográficos e de localização tão parecidos, mas com resultados de voos comerciais tão distintos?
Voos comerciais têm direta correlação da riqueza de uma localidade.
Acredito que, se fôssemos posicionar as cidades num ranking de prosperidade, Patos e Iguatu não estariam tão distantes. Por outro lado, temos insumos suficientes para depreender que o mercado consumidor de Patos é maior, daí entendemos que seria natural ter mais voos na cidade paraibana.
Quais seriam, entretanto, as razões que explicam um resultado tão gritante em diferença de passageiros transportados?
Operação/Cancelamento de voos
Em Patos, houve sistemático respeito aos consumidores e os voos lá eram operados conforme previsão da Azul. Assim foi em 2021, 2022 e 2023.
Os voos em Iguatu são de uma leva de voos iniciada em novembro de 2022, de forma que a experiência da Conecta na cidade é mais de um ano menor que em Patos.
O que se viu em 2022 e 2023, na cidade cearense, foi o contrário: desrespeito ao consumidor, com cancelamento de voos em massa, inclusive para outras cidades do interior, como noticiamos algumas vezes.
José Enilson Couras Neto, franqueado de agência de turismo de Iguatu, informa que tem evitado vender esses voos: “muitas vezes o cliente chegava ao aeroporto e o voo não acontecia. Gera desgaste para nós que vendíamos o voo”, explicou.
Portanto, como fazer um voo voltar a ser considerado pela população?
Perguntamos à Azul o que a companhia espera fazer de diferente para 2024. “A Azul informa que condições climáticas adversas e questões técnicas podem afetar os voos programados entre os aeroportos de Iguatu e Fortaleza, mas esclarece que os Clientes recebem toda a assistência necessária, conforme prevê a Resolução 400 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A companhia lamenta eventuais transtornos causados aos Clientes, mas ressalta que medidas como essas são necessárias para conferir a segurança de suas operações”, respondeu a Azul.
Quando perguntamos se havia procura pelos voos, Couras Neto explica que “sim, havia procura, sempre havia pessoas que perguntavam pelos voos, mas aí nós explicávamos que poderia haver o cancelamento, e sugeríamos que o cliente comprasse direto do site da Azul”, explicou o empresário.
Couras explica que 70% das passagens aéreas que vende na agência são de pessoas que vão até Juazeiro do Norte para voar. “A distância rodoviária entre Iguatu e Juazeiro é de pouco mais de duas horas, e permite que as pessoas embarquem facilmente pelo Cariri”.
A Azul, detentora de benefícios fiscais no Ceará, precisa retrabalhar a imagem desses voos para que estes se tornem mais úteis à população e ao estado.
Preços caros e conexões demoradas
Voos para Patos são provenientes diretamente de Recife, grande hub da Azul. Os voos de Iguatu são para Fortaleza, com poucas saídas diárias nacionais da companhia.
Essa diferença faz impactar bastante no preço das conexões e na duração das viagens com baldeação nas respectivas capitais. Assim, há uma diferença enorme de preços para quem deseja sair de Iguatu para Campinas e de Patos para Campinas, por exemplo.
A coluna fez as pesquisas por passagens aéreas em 8 de outubro.
Um voo entre Patos e Campinas é realizado por coerente valor de R$ 1.156,90. A viagem dura 6h, o que é bastante razoável. Nesse período, o viajante mal chegaria em João Pessoa de ônibus. Em Recife, há diversas saídas diárias para Campinas e São Paulo. A hora que o voo sair de Patos, o passageiro consegue realizar rápidas conexões em Recife.
De Iguatu para Campinas, o preço é de R$ 1.842,98, 60% mais caro, para um mesmo dia de operação e a duração do voo se torna de exaustivas 17 horas, ou seja, as conexões em Fortaleza são muito ruins, sobretudo por falta maior de voos nacionais.
Nas operações acima, o cliente terá que ir até Recife para voar até o Sudeste.
Sobre o preço, a companhia respondeu que “Com relação à tarifa, a Azul esclarece que os preços praticados variam de acordo com alguns fatores importantes, como trecho, sazonalidade, compra antecipada, disponibilidade de assentos, entre outros. Fatores externos, como a alta do dólar e o preço do combustível, são elementos que também influenciam nos valores das passagens”.
Assim, é melhor ir para Fortaleza de ônibus e rumar a Campinas. O preço é mais barato que o de Patos.
Ou ainda, é melhor ir a Juazeiro do Norte e voar para Campinas, mais barato.
Nessa ótica, os voos da Conecta para Iguatu não estão fazendo sentido, a não ser se a população desejar ficar na própria capital do Ceará.
Os preços são bons (R$ 269,97) para voar em dezembro, por exemplo.
E por que, mesmo com preços bons não há mais passageiros?
Pouca divulgação
Uma vez que se resolvam os problemas 1 e 2, os voos da Conecta em Iguatu, carecem de melhor divulgação. Não apenas em Iguatu, mas no Ceará todo.
Os preços do trecho entre Iguatu e Fortaleza, são mais caros que os rodoviários (obviamente), mas são preços coerentes, como R$ 269 reais o trecho (para voar em dezembro). Faz todo sentido trocar 7 horas de ônibus por 2h de avião.
Imaginem, se em Campina Grande, a 2ª maior cidade do interior do Nordeste, o trade realiza divulgação para mostrar à população que há voos comerciais na cidade, que dirá da necessidade que a população de Iguatu tem de tomar conhecimento da Conecta.
Os voos na cidade são às terças e sábados. A aeronave não faz muito ruído sobre a cidade, de forma que o povo necessita de divulgação.
São Benedito-CE, cidade com metade da população de Iguatu, movimenta mais passageiros e com maior taxa de ocupação nos Caravans da Conecta. Lá, a divulgação é realizada por entes privados do turismo.
A Azul não nos respondeu que ações de divulgação realiza para os voos da Conecta. Já quando perguntamos à Secretaria de Turismo do Ceará como avaliava o conhecimento da população a respeito dos voos da Conecta, a pasta nos respondeu que:
“Nossos terminais aéreos desempenham um papel estratégico na expansão do turismo cearense. Muitos deles, inclusive, são porta de entrada para destinos importantes, como, por exemplo, Jericoacoara. Com a chegada do Aeroporto na cidade de Preá, a vila se desenvolveu social e economicamente”.
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*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.