"Jamais, jamais, haverá da parte da Presidência qualquer interferência no seu trabalho!” Foi o que disse, sexta-feira, 20, com a solenidade que a frase exigia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao economista Gabriel Galípolo, futuro presidente do Banco Central, organismo independente responsável pela gestão da Política Monetária do país, ou seja, dono da tarefa de fazer subir ou descer a Selic, que é a taxa básica de juros da economia brasileira.
Usando um chapéu do tipo Panamá que cobria sua cabeça e escondia as marcas da recente cirurgia que o livrou de uma hemorragia intracraniana, o presidente Lula – no momento em que fazia aquela promessa – segurava com as duas mãos a mão direita de Galípolo, gesto que, do ponto de vista político, reforçava o compromisso publicamente assumido.
Cinco dias antes, em São Paulo, feliz com o resultado do seu procedimento cirúrgico, Lula foi incisivo durante entrevista ao Fantástico:
“A irresponsabilidade é que aumenta a taxa de juros, não o Governo Federal. A única coisa que está errada nesse país são os juros, mas nós vamos cuidar disso, também” disse ele. No dia seguinte, sua declaração mandou o dólar para cima e a Bolsa para baixo.
Hoje, segunda-feira, 23, o mercado financeiro, cujas operações sempre começam às 10 horas, deverá mandar sinais de como reagiu não apenas às díspares opiniões do presidente a respeito do Banco Central e de sua política monetária, mas, igualmente, sobre o que decidiram – no último minuto da sessão Legislativa deste ano – o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, que, simplesmente, desidrataram o pacote de corte de gastos do governo e, como se isso não bastasse, injetaram mais despesa no Orçamento. E, de quebra, transferiram para fevereiro – quando o Parlamento retornará às suas atividades – a aprovação da Lei de Meios de 2025.
Por tudo o que aconteceu na semana passada, quando o dólar chegou a ser negociado a R$ 6,60 e a Bolsa desceu aos 120 mil pontos, ficou exposta a opinião dos operadores do mercado: eles desconfiam da política fiscal do governo, temem que haja interferência da política no comando do Banco Central e receiam que a inflação – resistindo aos tratamentos da política monetária – avance mais do que está avançando. Essa desconfiança poderá ser ratificada ou não nesta segunda-feira.
(Parêntesis: Por falar em inflação: o IPCA de 0,39% medido m novembro pelo IBGE disse uma coisa, mas a amarga e real inflação medida no mesmo mês pelo consumidor nos supermercados e feiras livres disse outra coisa. Muito mais do que o 0,39% do IPCA de novembro, dispararam os preços da carne, do café, do leite, das frutas e verduras.)
Há uma crise financeira castigando e afligindo o governo, parte do qual – mais precisamente a equipe dos ministérios da Fazenda e do Planejamento – trabalha para combatê-la por meio do corte de gastos, algo de que não quer ouvir falar o partido no poder, o PT.
O pior desta crise é a questão cambial: a disparada do dólar eleva o custo dos produtos importados – principalmente o trigo, os princípios ativos dos medicamentos, os fertilizantes e até o aço e as roupas que vêm da China – o que alimenta a inflação, que eleva os juros.
Neste momento, as projeções para a economia brasileira em 2025 e 2026 são pessimistas, e o Boletim Focus – que sempre às segundas-feiras (e hoje é segunda-feira), às 8h30, é divulgado – vem reforçando essa tendência para o pessimismo.
Hoje, a economia está aquecida, operando acima de sua capacidade, e é em momentos assim que a indústria, o comércio e o setor de serviços costumam repassar para os preços a valorização do dólar e a desvalorização do real. Na semana, os cabeleireiros de Fortaleza aumentaram o preço dos seus serviços. Eu posso informar que, nos salões chamados de Classe A, os preços de um corte de cabelo masculino subiram de R$ 90 para R$ 100. No primeiro semestre do ano, esse preço estava em R$ 80.
No próximo dia 27, será divulgado pelo IBGE o IPCA-15, espécie de prévia da inflação oficial de dezembro. Será um bom parâmetro para comparar o que se passou em 2024 com o que se projeta para o exercício de 2025.
Mas não apenas as causas endógenas agitam o mundo da economia brasileira. As exógenas, também, e muito fortemente.
Nos EUA, o Federal Reserve, o Banco Central de lá, já disse que será moderado na redução de suas taxas de juros. Isto tonificou o dólar e desviou investimentos dos mercados emergentes – o Brasil no meio – para os títulos do Tesouro norte-americano.
Aqui no Basil, por causa da política fiscal, da instabilidade cambial e das altas taxas de juros, o brasileiro que investia em ações já está optando pela renda fixa que oferece IPCA mais 8% ao ano. Ótimo para quem vive da especulação.
Quem tem dívida em dólar e quem importa está sofrendo; quem não tem dívida cambial e exporta, está a celebrar – mesmo assim com muito cuidado, porque tudo demais é veneno.