Os Jogos Olímpicos de 2024 acontecerão em Paris, na França. A principal bandeira que a Cidade Luz quer fincar junto à opinião pública mundial é a da sustentabilidade. Para tanto, traçou-se o mais audacioso projeto, o de tornar o Rio Sena próprio para as práticas esportivas e, por consequência, depois das Olímpiadas, disponível para o lazer náutico dos franceses e de seus visitantes.
Esse feito, indiscutivelmente louvável e invejável, está orçado em algo próximo a 1,4 bilhão de euros ou 7,5 bilhões de reais. É um custo elevadíssimo até para sociedades capitalistas europeias. Fica evidente que ainda se tratando de cidades mundiais, com dinâmicas econômicas superiores e processo de urbanização muito mais antigo, as inadequações da urbanização, igualmente centenárias, criam um passivo ambiental e econômico insustentável.
Tomemos agora os casos brasileiros e comecemos por estados mais potentados da federação, Rio de Janeiro e São Paulo. Há anos se fala do quanto a Baía de Guanabara encontra-se poluída. Toneladas de lixo e volumes impensáveis de esgoto são lançados in natura na Baía. À época dos preparativos dos Jogos Olímpicos Rio 2016, instigou-se como meta a despoluição da Guanabara que ainda está pelo caminho.
Na última notícia, no ano passado, falava-se da necessidade de investimento na casa dos 2,7 bilhões de reais. Imagino que tal quantia não chega perto do mínimo necessário para corrigir os problemas históricos de falta de saneamento nas dezenas de municípios que contribuem para a poluição desse ambiente.
No Estado de São Paulo, a “locomotiva” econômica do Brasil, e na cidade de São Paulo, sua capital, a urbanização fez tábua rasa dos seus dois principais rios: Pinheiros e o Tietê. O Estado sempre apresenta planos de despoluição da Bacia Hidrográfica do Tietê, mas até agora, mantêm-se aquelas imagens famosas (e tristes) das espumas tóxicas sobre o rio agonizante.
Na capital, o Rio Pinheiros passa por uma sequência de intervenções e tentativas de incorporação sustentável à vida dos paulistanos. As atualizações mostram que já foram utilizados cerca de 3,5 bilhões de reais em obras no Pinheiros, há avanços, contudo o projeto continua por concluir.
Aqui em Fortaleza, situada em estado incomparavelmente mais pobre que os casos anteriores, os desafios são proporcionalmente grandes. O projeto das margens do Maranguapinho segue lento e tenta superar as inúmeras “áreas de risco” produzidas pela pobreza urbana e pela desigualdade social.
Nas informações da Secretaria das Cidades do Estado do Ceará tal projeto é orçado em mais de meio bilhão de reais, dados de 2017. Quem passa pelos limites municipais de Caucaia e Fortaleza, enxerga paisagem nada sustentável ao olhar para os afluentes do Rio Ceará. Em certos trechos, o rio parece agonizar sufocado por tanto lixo.
O Rio Cocó, estrela hídrica da nossa cidade, em seu longo curso é outro que carece de muito recurso público para produzir intervenção ambiental e socialmente adequada. Antes de chegar nos bairros onde o Parque do Cocó é mais conhecido, o recursos hídrico serpenteia bairros da capital severamente afetados pela ausência de estruturas próprias de esgotamento sanitário.
E as nossas praias? A cidade de Fortaleza vibra com os dados de visitantes e se coloca como principal destino de sol e mar do Nordeste, todavia, ironicamente as zonas de praia da urbe (galinhas dos ovos de ouro), encontram-se, em vários de seus trechos, impróprias para o banho dada a poluição.
Tudo isso fruto de um modelo de urbanização intolerante aos limites legais e indisposto a seguir recomendações dos estudos que relatam as fragilidades ambientais existentes no seu sítio natural. E as causas são muitas. Elas vão da ganância dos incorporadores imobiliários, passando pela irresponsabilidade de governos e também tem contribuição das formas mais precárias de uso do território como instinto de sobrevivência.
Nas últimas semanas, a Prefeitura Municipal de Fortaleza anunciou intervenção para corrigir os alagamentos da famosa Avenida Heráclito Graça, sítio onde encontram-se antigos córregos que formam o Riacho Pajeú. Como noticiou este Diário, serão necessários, a priori, 23 milhões de reais para produzir alternativa artificial ao que era feito antes gratuitamente pelos sistemas naturais.
Parece que vivemos em looping e não aprendemos. Se todos os projetos da nossa e de outras tantas cidades contabilizassem os dados ambientais de fato ou utilizassem os recursos necessários para “imitar as funções naturais” veríamos, provavelmente, que no transcorrer da história da produção de nossas cidades tais ações são inviáveis. Elas se fazem porque os custos acabam sendo postergados para o futuro, provavelmente absorvidos pelos cofres públicos, e quando acontecem as catástrofes, geralmente, os mais pobres pagam com suas vidas.