Qual o futuro da aviação regional no Ceará após o cancelamento de voos da Azul?

Azul Conecta suspendeu voos comerciais em Jericoacoara, Crateús, Iguatu, São Benedito e Sobral

A Azul Conecta, subsidiária regional da Azul Linhas Aéreas, anunciou que vai deixar de operar, a partir de 10 de março, voos entre o Aeroporto Internacional de Fortaleza — Pinto Martins e outros cinco aeroportos do interior do Ceará (Crateús, Iguatu, São Benedito, Sobral e Cruz-Jeri). Para especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste, por si só, a decisão já traz grandes prejuízos para a aviação regional no Estado.

Sobre a saída, a Azul informa que está sempre "avaliando as possibilidades e necessidades de mercado e, consequentemente, mudanças fazem parte do planejamento operacional". Inicialmente, a companhia informou que o aeroporto de Cruz continuaria com os voos, mas voltou atrás e, na sexta-feira (10), confirmou ao colunista do Diário do Nordeste Igor pires a suspensão também nesse destino.

Sendo assim, a companhia anuncia que irá suspender as operações nestas cidades "devido a uma série de fatores que vão desde o aumento nos custos operacionais da aviação, impactados pela crise global na cadeia de suprimentos e a alta do dólar, somadas às questões de disponibilidade de frota e de ajustes de oferta e demanda" (leia o posicionamento completo abaixo). 

Como era a operação no Ceará

Desde 2022, a Azul opera no interior do Ceará com a Azul Conecta, surgida após a compra da antiga companhia aérea TwoFlex. Inicialmente, eram seis destinos que contavam com voos: AracatiCrateúsIguatuCruz-JericoacoaraSão Benedito e Sobral.

Todas as praças ficam no Interior e interligavam as cidades e regiões vizinhas a Fortaleza utilizando a aeronave Cessna 208 Caravan, com capacidade para nove passageiros. Foi uma retomada consistente após a pandemia. Porém, a partir do segundo semestre de 2024, a situação começou a mudar.

Primeiro com a descontinuidade da ligação entre Aracati e Fortaleza, ocorrida em julho, mesmo mês em que a Voepass cancelou o último voo comercial para o aeroporto do litoral leste, e que atualmente só conta com operações da aviação geral (charter, táxi aéreo e aeronaves particulares).

Como fica o panorama da aviação comercial no Ceará?

Com a decisão foi de suspender os voos comerciais da Azul Conecta entre o interior do Ceará e Fortaleza, dos dez aeroportos regionais do Ceará, somente o Comandante Ariston Pessoa (Cruz-Jericoacoara) continuará com operações comerciais regulares da própria Azul (mas não da subsidiária Azul Conecta), da Gol e Latam, com voos para São Paulo e Belo Horizonte. Os demais seguirão somente com voos da aviação geral.

Oficialmente, o Estado conta com 12 aeroportos aptos para receber voos comerciais. Desses, dois (Fortaleza e Juazeiro do Norte) estão concedidos à iniciativa privada. Os outros dez estão, desde agosto de 2023, sob administração da Infraero.

A empresa pública federal esclarece que, conforme contrato firmado com o Governo do Estado do Ceará, realiza a gestão administrativa e operacional dos aeroportos regionais, englobando atividades de rotina, como fiscalização operacional, vistorias, inspeções, segurança aeroportuária e manutenções preventivas. As ações são para garantir a segurança das operações e a manutenção da infraestrutura necessária para a plena operacionalidade dos terminais.

"A Infraero destaca que a infraestrutura dos Aeroportos de Sobral, São Benedito, Crateús e Iguatu permanece disponível para novos voos regulares, dentro da capacidade instalada de cada terminal. A decisão de iniciar ou suspender operações cabe exclusivamente às companhias aéreas, de acordo com suas estratégias comerciais. Esses aeroportos continuarão atendendo normalmente a voos da aviação geral e de táxi aéreo".

Aeroportos públicos do Ceará sob a administração da Infraero:

  • Aeroporto Regional de Canoa Quebrada Dragão do Mar (Aracati);
  • Aeroporto de Camocim (Camocim);
  • Aeroporto de Campos Sales (Campos Sales);
  • Aeroporto de Crateús (Crateús);
  • Aeroporto Comandante Ariston Pessoa (Cruz-Jericoacoara);
  • Aeroporto de Iguatu (Iguatu);
  • Aeroporto de Quixadá (Quixadá);
  • Aeroporto Walfrido Salmito de Almeida (São Benedito);
  • Aeroporto Dr. Luciano de Arruda Coelho (Sobral);
  • Aeroporto Pedro Teixeira Castelo Regional Tauá (Tauá).

Sobre investimentos, próximas ações e sobre o cenário da aviação no estado do Ceará, a Infraero afirmou que este é um tema que cabe ao Governo do Estado.

O que diz o Governo do Estado

A Superintendência de Obras Públicas do Estado do Ceará (SOP) informa que os ajustes de estratégia da companhia Azul Conecta não representam descontinuidade de operação dos aeroportos regionais do Ceará.

Segundo a pasta, os aeroportos continuarão a receber todos os demais voos programados e os voos da aviação geral (particulares, táxis-aéreos, desportivos, institucionais e de segurança).

"A Infraero, dentro do contrato firmado para operar os aeroportos estaduais, vem prestando serviço em conformidade com o previsto. O trabalho para atração de voos no Ceará é realizado de forma permanente pela Secretaria do Turismo, de maneira a buscar parceiros para fomentar a economia local e promover o intercâmbio regional. Desta forma, o fortalecimento dos atrativos locais e suas infraestruturas é algo contínuo, ainda que muitos voos comerciais se coloquem como ofertas sazonais", diz em nota.

A reportagem questionou a Secretaria do Turismo (Setur) sobre a possbilidade dos aeroportos regionais receberem, novamente, voos regulares, não só os quatro em que a Azul deixará de operar agora, como também se há alguma expectativa de voos regulares para Aracati, Camocim, Campos Sales, Quixadá e Tauá, onde há outros cinco aeroportos regionais. Além disso, foi perguntado sobre como a pasta está atuando para atrair novos voos para o Ceará.

Em resposta, a Setur informa que "já há uma determinação do governador Elmano de Freitas de buscar novas rotas com destino ao Ceará. Portanto, através da lei que já foi aprovada pela Assembleia Legislativa de subvenção e dos incentivos fiscais dados pelo estado, faremos reuniões com todas as companhias aéreas para buscar o aumento da malha aérea aqui no Ceará".

Quem perde é o consumidor, diz especialista

"A gente tem uma baixa muito grande na aviação regional do Ceará com a saída desses voos regulares da Azul Conecta. Quem perde mais uma vez é o consumidor, os habitantes das cidade e a economia como um todo", frisa Viviane Falcão, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutora em Engenharia de Transportes.

Essa suspensão faz com que o Ceará volte a patamares observados somente no pré-pandemia, com somente três aeroportos operando regularmente voos da aviação comercial. 

"É muito importante que tenha um amadurecimento do governo estadual também, não só do governo federal, da importância da ligação aérea de determinadas cidades. A gente está falando de cidades importantes do interior do Estado, e se a gente compara com outros estados do Nordeste, como Pernambuco e Bahia, a gente vê o Estado do Ceará em defasagem quando fala de voos de Azul Conecta", define a especialista.

"Retrocesso grande"

O especialista em aviação e colunista Igor Pires critica duramente a suspensão de todos os voos. Para ele, o Ceará "demorou muito para ter voos para vários destinos" e, de repente, viu as operações da aviação regional praticamente desaparecerem. 

Ele recorda ainda que quatro dos cinco aeroportos com voos da Azul Conecta tinham frequentemente as piores ocupações dentre as praças aeroportuárias do interior do Nordeste. Somado a mudanças na questão financeira da própria Azul, a suspensão das rotas teve o custo-benefício como fator decisivo.

A Azul apontou explosão de aumento de custos: alta forte do dólar e problemas de suprimentos aeronáuticos, além de quê esses aeroportos todos tinham muito baixas ocupações. Só Jericoacoara não é ocioso, os outros vão ficar ainda mais do que já são. Acho que vamos voltar uns 5 anos no tempo por algum período, não tem quem invista. 
Igor Pires
Especialista em aviação e colunista do Diário do Nordeste

Para o especialista, a situação ainda é mais crítica em Aracati e Sobral que, juntos com Cruz-Jericoacoara, são os três aeroportos mais novos do Estado: "O aeroporto de Sobral custou R$ 80 milhões e nunca recebeu um voo comercial nacional, já vai para o terceiro ano de ociosidade. Se não fosse para receber, não precisava ter gasto tudo isso".

Viviane Falcão completa destacando ser "surpreendente" uma cidade como Sobral, maior cidade da região Norte do Ceará, não ter vingado as operações com uma aeronave pequena como o Cessna 208 Caravan.

"Muito provavelmente haverá incentivos para a Azul voltar a operar nesses aeroportos, mas me chama muito a atenção uma cidade como Sobral não conseguir manter um voo regular da Azul Conecta, que é uma aeronave de nove lugares. Vale a pena fazer um estudo e entender o que está acontecendo, se esse aeroporto está tendo uma competição", pontua.

Leia nota completa da Azul

"A Azul informa que está sempre avaliando as possibilidades e necessidades de mercado e, consequentemente, mudanças fazem parte do planejamento operacional.

Sendo assim, a companhia anuncia que irá suspender as operações nestas cidades "devido a uma série de fatores que vão desde o aumento nos custos operacionais da aviação, impactados pela crise global na cadeia de suprimentos e a alta do dólar, somadas às questões de disponibilidade de frota e de ajustes de oferta e demanda". 

Importante ressaltar que os Clientes impactados receberão a assistência necessária, conforme prevê a resolução 400 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).  

A Azul reforça, ainda, que mesmo diante da suspensão, segue operando no Estado do Ceará com voos regulares em Juazeiro do Norte, Jericoacoara e Fortaleza, de onde os Clientes poderão se conectar com mais de 8 destinos em voos diretos".

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