Idosos criticam falta de segunda dose da CoronaVac na Capital: 'Sentimento de revolta e frustração'

Devido à falta de vacinas suficientes, muitas pessoas enfrentaram filas em busca de se vacinar, mas sem sucesso. Idosos temem que imunização seja prejudicada

Em meio à falta de vacinas suficientes da CoronaVac para garantir a aplicação da segunda dose da imunização contra a Covid-19 no Ceará, multiplicam-se os relatos de idosos insatisfeitos com a vacinação. 

Até o início da tarde desta quinta-feira (29), faltavam 41.000 doses do imunizante para a aplicação da chamada D2 somente em Fortaleza, conforme estimativa da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa). O déficit se deve a um atraso de repasse do Governo Federal, justificou a secretária de Saúde de Fortaleza, Ana Estela Leite, em entrevista ao Sistema Verdes Mares. 

Socorro Alencar, de 65 anos, está entre os idosos impossibilitados de concluir a imunização. O nome da advogada, cujo prazo de vacinação da segunda dose se encerrou ontem, não estava na lista de agendados.

Ela também não recebeu nenhuma notificação dos órgãos oficiais, mas diz ter sido orientada pelo Telesaúde 24h (0800 275-1475) - sistema implantado pelo Governo do Estado – a se dirigir a um dos locais de vacinação da cidade, pois seria exigido apenas o cartão e documento de identificação.  

No entanto, ao chegar ao Centro de Eventos, enfrentou uma longa fila até receber a notícia de que não poderia ser imunizada, pois as doses seriam direcionadas apenas aos agendados.Já o Telesaúde seria uma ferramenta do governo estadual e não da Prefeitura de Fortaleza. 

Meu sentimento é de revolta e frustração. A validade da vacina é de 28 dias e eu tomei a primeira dose no dia 1º [de abril]. E aí, como fica a minha situação? Vamos ficar com a saúde comprometida?"
Socorro Alencar
Advogada

Para a idosa, faltou organização na logística de distribuição da vacina e isso pode prejudicar a saúde de muitas pessoas. “No cartão de saúde tem assim: ‘a segunda dose é tão importante quanto a primeira. Não deixe de tomar'. Eu procurei pra tomar a segunda dose e o ente público está me negando o meu direito à saúde’.

Socorro Alencar relata que não tem sido fácil viver esse momento, pois a família já enfrentou recentemente outra “luta” para conseguir um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em um hospital público da Capital para a cunhada, ainda em estado grave por complicações da Covid-19. 

"A pior sensação possível"

O supervisor de transporte, José Humberto Carneiro Pinheiro, de 65 anos, relata ter vivido a mesma frustração de Socorro. Mesmo aguardando durante três horas em uma fila no Centro de Eventos, não conseguiu tomar a segunda dose da vacina. Seu nome não estava na lista de agendados, mas ontem era o último dia para receber a D2 da CoronaVac. 

Estou sentindo a pior sensação possível. A gente trabalha, paga impostos e não tem direitos garantidos. Isso é muito ruim"
José Humberto Carneiro Pinheiro
Supervisor de transporte

Apesar da frustração, o idoso garante não ter perdido a esperança de que cheguem doses suficientes para os que precisam. E não pretende ficar parado. “Eu vou mover o que eu puder, mesmo que seja uma ação na Justiça. Vou atrás dos meus direitos”. 

Cuidado permanente

Maria Odete de Melo Medeiro, de 64 anos, deveria receber a segunda dose da CoronaVac nesta sexta-feira (30). Porém, como a própria Prefeitura de Fortaleza anunciou, hoje, a vacinação continuará somente com a aplicação de imunizantes da AstraZeneca, devido à escassez de estoque do imunizante do Butantan. Ainda assim, a dona de casa se mantém otimista. 

Estou esperançosa que vai chegar uma nova remessa, se Deus quiser. Se não, fazer o quê né?! Eu fico triste, mas é esperar que [a vacinação] seja agendada novamente”
Maria Odete de Melo Medeiro
Dona de casa

Embora projete que a imunização lhe trará menor temor da doença e mais confiança no dia a dia, a idosa atenta para a importância de manter as medidas de proteção contra a Covid, mesmo após a segunda dose. “A gente não fica com tanto medo como está, mas não pode descuidar”.  

Desamparo

Professora universitária, Talita Guimarães acompanhou a mãe, a aposentada Sônia Guimaraes, de 66 anos, para tomar a segunda dose da vacina no Drive-Thru do Shopping RioMar Kennedy. Certas de que o processo ocorreria tranquilamente, como na primeira vez, foram surpreendidas pela lotação e o anúncio de que as doses disponíveis seriam apenas para agendados.

Ontem foi a data limite para que a idosa recebesse a segunda dose da vacina. Mas ela voltou para casa sem nova data prevista. Talita e a mãe enfrentaram uma fila de duas horas e, agora, “ultra frustradas”, vivem a preocupação de que a imunização fique comprometida. O temor é ainda maior porque Sônia é hipertensa.  

“A gente saiu de lá no escuro e ela [mãe] ficou desamparada”, constata Talita. Ela diz entender que o momento é complexo e exige muito de todos, mas considera “surreal” ver pessoas como sua mãe não ter acesso à segunda dose da vacina. Assim como Socorro, a idosa chegou a buscar informações e receber orientações semelhantes no Telesaúde 24h. 

“Ela [Sônia] está presa porque não pode tomar outra [vacina] e, ao mesmo tempo, a gente não sabe se a imunidade vai ser consolidada como deveria por causa do número de dias. É uma situação muito louca”.

15 municípios sem vacinas suficientes

Pelo menos 15 municípios do Ceará, incluindo Fortaleza, estão sem vacinas suficientes da CoronaVac, do Instituto Butantan, para aplicação da segunda dose da imunização contra a Covid. O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) confirmou nove cidades nesta situação, em nota enviada ao Diário do Nordeste na tarde dessa quinta (29). Levantamento da reportagem apontou outros seis.