Como é feita a atualização das vacinas contra a Covid-19 para garantir aumento na proteção?

A ocorrência de variantes gerou medo que as vacinas escapem às mutações. Diante disso, é preciso produzir uma nova geração de vacinas?

A produção das primeiras vacinas da Covid, e a chegada ao mercado, em alguns países, ainda em 2020, trouxe esperanças de controle da gravidade da pandemia. Com o surgimento das variantes, veio o medo de que elas resistam à proteção, e fabricantes e pesquisadores investigam a efetividade dos produtos diante desses cenários.

Mas, o que determina que uma nova geração de imunizantes precisa ser disponibilizada? Como é feita a atualização das vacinas contra a Covid? 

Os imunizantes disponíveis no Brasil têm se mostrado eficazes contra o coronavírus. Conforme projetado, de modo geral, conseguem evitar o agravamento de casos, e conter internações e mortes.

Contudo essas vacinas foram produzidas a partir da cepa original do vírus. Com o surgimento de variantes, é preciso observar as consequências e avaliar a necessidade de modernização

O processo de atualização das vacinas é diferente conforme a tecnologia usada na produção de cada imunizante. Logo, as vacinas da Pfizer, por exemplo, passam por procedimentos distintos da Coronavac. O mesmo ocorre com as da Astrazeneca e da Janssen. Todas estão em aplicação no Brasil atualmente. 

Na atualização, assim como no desenvolvimento inicial, o sequenciamento genético do próprio vírus, que gera conhecimento sobre a identidade em si e, no caso atual, sobre as variantes, é primordial. Isso envolve a identificação e o isolamento das linhagens. 

Compartilhamento de informação

No mundo todo, cientistas documentam e compartilham em bancos de dados informações sobre sequenciamento genético do vírus justamente para viabilizar e aprimorar, dentre outras pesquisas, a produção de imunizantes. 

Além disso, “atualizar uma vacina é mais fácil que desenvolvê-la do zero”, ressalta o biomédico e microbiologista, Samuel Arruda.

“Depois que a vacina já está pronta, atualizar é só trocar os antígenos mais antigos, das variantes que mais circulavam anteriormente, pelas a que estão circulando mais no momento. Ou no caso da Pfizer, o RNA. Esse processo de troca ocorre durante a produção mesmo”.
Samuel Arruda.
Biomédico e microbiologista

Das vacinas já em uso, a Pfizer anunciou que um imunizante específico para a variante Ômicron estará pronta em março. A farmacêutica chinesa Sinovac também já afirmou que deve disponibilizar a atualização da Coronavac, considerando a variante Ômicron, em até três meses.

Como é a atualização das vacinas conforme cada tipo?

O docente da disciplina de imunologia do curso de Biologia da Fafidam da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Charles Ielpo Mourão, explica cada processo conforme cada vacina.  

Pfizer e Moderna - a vacina usa tecnologia de RNA mensageiro. 

Via de regra, explica ele, “é mais rápido e mais fácil fazer uma atualização para uma vacina Pfizer do que uma Coronavac, por exemplo”. “Na tecnologia de RNA mensageiro eu pego uma sequência genética que sirva para fabricar a proteína spike (utilizada pelo SARS-CoV-2 para infectar as célula) do coronavírus, insiro algumas informações e ensino bactérias a produzirem um código genético que vai servir para o meu corpo produzir uma proteína e atacá-lo”, diz. 

Como atualizar? 

Quando há atualização da vacina, diz ele, “é como se eu programasse um novo código, inserisse as informações das novas variantes, ensinasse essas bactérias a produzir novas proteínas para o corpo reconhecer. Em geral é mais rápido e fácil fazer isso”. 

Astrazeneca e Janssen - usam a tecnologia de vetor viral

Nesse caso, é utilizado um vírus respiratório que causa doença em humanos ou em outras espécies e é alterado o código genético desse vírus. “Para que ele produza a informação que eu preciso”, completa o professor.  O vírus modificado é incapaz de se replicar dentro do organismo humano e causar doença, e essa versão “enfraquecida do vírus” dá instruções às células para geração de proteção. 
 
Como atualizar?
Essas vacinas integram material genético nas células, contudo, são “conduzidas” em um vírus diferente do coronavírus. Assim como no caso da Pfizer, é preciso “trocar” o código genético que ensina as células humanas a fabricar a proteína S por uma versão mais aproximada ao que se observa na variante que possa “escapar” da versão anterior da vacina. 

Coronavac - a vacina usa tecnologia de um vírus inativado. 

Nesse caso, utiliza-se, segundo Charles “um vírus, que normalmente é um vírus respiratório, atenua esse vírus, ou seja, a empresa faz com que o vírus perca a capacidade de infectar novas pessoas. E ensina esse vírus a produzir a proteína spike que vai ser reconhecida pelo sistema imunológico. Então, o vírus inativado ou partes desse vírus são produzidas, e nosso corpo passa a entender isso como invasor”. 

Como atualizar?

Em vacinas como a Coronavac, diz ele, “primeiro eu preciso ter acesso a informações genéticas que vão servir para atualizar a vacina. Depois eu preciso inserir essas informações do vírus de modo que elas fiquem estáveis para a partir daí o vírus ser replicado com a nova informação”. 

Quais critérios definem que uma vacina precisa ser atualizada?

“No começo da pandemia nós tínhamos o coronavírus em uma variante alfa e, a medida que esse vírus vai se propagando, mudanças genéticas vão acontecendo”, explica o professor Charles Ielpo Mourão. De acordo com ele, é necessário avaliar por, pelo menos, 30 dias, após identificada, a evolução que uma variante pode causar.  

Conforme o professor, é preciso observar duas condições para a atualização da imunização, se a variante é:

  • Infecciosa - se observa a taxa de infecção causada por ela
  • Patogênica - na qual se observa quanto das pessoas contaminadas desenvolveram sintomas. 

“Em geral, hoje temos ainda as vacinas produzidas no início da pandemia. Essas vacinas produzem efetividade de resposta imunológica. A ômicron foi descoberta em novembro e temos pouco mais de três meses de estudos com essa variante. Temos dados que ainda não são suficientes para justificar a mudança da vacina”. 
Charles Ielpo Mourão
Docente da disciplina de imunologia

O biomédico e microbiologista, Samuel Arruda, acrescenta que os critérios adotados são epidemiológicos. “Se verifica qual a variante circula mais na população e a efetividade da atual vacina frente a ela. Havendo uma necessidade de aumentar sua efetividade, essa atualização é feita”. 

O processo de atualização é semelhante ao das vacinas contra influenza?

Para o docente da disciplina de imunologia do curso de Biologia da Fafidam da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Charles Ielpo Mourão, a  grande diferença entre o coronavírus e os vírus da influenza, é que os últimos tem uma alta mutabilidade. “eles se modificam mais rapidamente. O coronavírus ainda não”, explica. 

De acordo com Charles, o coronavírus tem algumas mutações, principalmente na proteína S, “mas, essas mutações ainda não permitem dizer que ele fica um vírus diferente. E não permitem ao vírus fugir das vacinas como acontece com as vacinas da gripe”. 

O biomédico e microbiologista, Samuel Arruda, indica que a tomada de decisão sobre a atualização é semelhante a do influenza, “podendo inclusive ser utilizado o mesmo sistema de vigilância e unidades sentinelas”. Mas, quanto a tecnologia, o influenza, diz ele, usa uma vacina de vírus inativado, já as vacinas para Covid usam de tecnologias diferentes.