E, de um lado, o Aterro da Praia de Iracema 'acende' com apresentações culturais, banhistas e comércio em diferentes momentos do dia; do outro, o espaço compreendido entre a saudosa Ponte dos Ingleses - interditada para reforma há mais de um ano - e o Centro Cultural Belchior só desperta com hora marcada, quando bares e restaurantes abrem as portas para receber o público. Antes disso, o ambiente assume um aspecto solitário e degradado. As propostas para reavivar o bairro como um todo vêm desde 2017, porém, alguns resultados ainda são aguardados.
A interdição da Ponte, gerida pelo Governo do Estado, foi iniciada em janeiro de 2018. A reforma teve um investimento de R$ 19 milhões e deveria ser entregue 10 meses depois, o que não aconteceu. Em dezembro de 2017, o Diário do Nordeste já havia mostrado a deterioração do local, ocasionada pela falta de manutenção, pelo vandalismo e pela maresia.
Para melhorar as condições estruturais, estavam previstos a troca do piso de madeira; a recuperação dos componentes físicos como bancos, plataformas e quiosques; a atualização tecnológica de iluminação pública; e o uso de materiais com maior resistência à corrosão nas estruturas do píer.
Na perspectiva de Rodolphe Trindade, dono do Pirata Bar, a intervenção da Ponte dos Ingleses e o ordenamento das vias são as principais carências do local. "O que deu uma grande 'parada' no movimento da praia foi a Ponte. Ela atraía gente. Um ícone turístico como esse estar fechado há tanto tempo é um absurdo. Deveria haver um esforço para a reforma ir mais rápido", afirma.
Há 33 anos administrando o empreendimento na Praia de Iracema, ele presenciou a ascensão do bairro, na década de 1990, e sua posterior 'decadência', como descreve. "Para dar um novo atrativo para o bairro, tem que fazer um ordenamento. É cheio de informalidade, ambulantes e, no sábado à noite, é um inferno".
Insegurança
Após oito anos trabalhando com aluguéis de bicicletas na Praia de Iracema, Maurílio Lima percebe que o movimento no local vem diminuindo cada vez mais nos últimos tempos devido à insegurança, à falta de luz em alguns postes, defeitos no piso do calçadão e também pela inatividade da Ponte dos Ingleses. O fato, diz, gera preocupação aos comerciantes, pois é dali que muitos deles conseguem dinheiro para sustentar a família.
"É com o que ganho aqui que eu pago aluguel, alimentação e o plano de saúde dos meus filhos. Estamos sem saber o que fazer. Temos que procurar outras coisas, porque já não dá mais. Antes, vinham muitas famílias; hoje, não. Todo fim de semana tem assalto, roubo de carro, e isso me impacta bastante. O pouco que tiro daqui dá para fazer alguma coisa, mas em breve não vai dar mais".
O professor do Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Design da Universidade Federal do Ceará, José Almir Farias, diz que a paralisia das obras realizadas na Ponte dos Ingleses, além de comprometer a logística de atividades do entorno, causa prejuízos enormes para a imagem da cidade.
"Como o calçadão é contínuo, as pessoas tendem a usar esse espaço no ir e vir. Há uma bruta mudança de qualidade, inclusive de segurança. Quando você ultrapassa o Aterro da Praia de Iracema, perto da Ponte dos Ingleses, a situação piora ainda mais", explica. Apresentado em dezembro de 2017, o Planejamento Estratégico da Praia de Iracema traçou um plano de trabalho para a requalificação da área, a partir de um conjunto de intervenções nas áreas do comércio, ordenamento urbano, segurança, cultura e eventos, moradores, mobilidade urbana, meio ambiente e turismo.
"Colocamos um cronograma de 12 meses para fazer ao longo de 2018. Foi 80% concluído. O ponto alto foi o incentivo fiscal, aprovado pela Câmara dos Vereadores em dezembro de 2018. Não entrou em vigor ainda porque depende de um decreto municipal, que vai para a pauta do Conselho de Desenvolvimento Econômico na próxima semana", explica o presidente do Conselho da Praia de Iracema, Erick Vasconcelos.
A proposta de incentivo fiscal incluída no pacote de intervenções para o bairro é voltada a quem deseja sediar empreendimento em um imóvel situado em uma das seguintes áreas: da Ponte dos Ingleses até o Centro Cultural Belchior, ou do Centro Cultural até a Rua João Cordeiro - os incentivos no segundo trecho serão destinados apenas a novos negócios em ampliação.
Os descontos garantidos pela proposta podem chegar até 65% do Imposto Sobre Serviço (ISS) e até 100% do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e do Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). A expectativa, segundo o presidente do Conselho, é de que o decreto municipal seja assinado pelo prefeito Roberto Cláudio até o fim deste mês. Dos aproximadamente 20 imóveis fechados no primeiro trecho contemplado pela proposta de incentivo fiscal, cinco já foram ocupados por empreendedores, e os demais estão sendo negociados.
"É tudo voltado para que a região se desenvolva através do trabalho. Já conseguimos alguns novos imóveis que foram ocupados, como o restaurante Mar de Rosas, na Rua dos Tabajaras, uma surf shop da Greenish. Também temos o hostel Boutique, que vai ser inaugurado esse mês", ressalta o presidente do Instituto Iracema, Davi Gomes.
Trabalho
Ele explica que a ideia de requalificação a partir do incentivo fiscal pretende tornar a Praia de Iracema um foco de público ativo durante todo o dia, e não apenas para atividades noturnas.
"No começo, a gente tinha essa ideia de captar mais bares e restaurantes, e hoje a gente pensa muito mais no trabalho". A captação de negócios para o bairro será voltada para a economia criativa. Davi Gomes afirma que um posto de atendimento aos empresários será montado no Centro Cultural Belchior, com informações e orientações.