Um projeto aprovado na Câmara Municipal de Fortaleza, na quarta-feira (1º), criou o serviço “Buggy-Turismo” na cidade. A ação regulamenta os passeios de buggy em praias, dunas, lagoas e sítios de valor histórico e cultural da Capital. Mas, a norma não detalha as áreas que serão percorridas.
Conforme a proposta, a Secretaria Municipal de Turismo irá estabelecer os roteiros. A permissão gerou debate nas redes sociais, pois há temor de uma liberação irrestrita de circulação de buggys em áreas protegidas.
A lei estabelece que a Secretaria, que irá regular o funcionamento da atividade, é a responsável “por definir as áreas geográficas onde será desenvolvido o serviço de Buggy-Turismo”.
A delimitação dos espaços deverá constar em um decreto, a ser enviado pela Prefeitura à Câmara, caso o projeto recém aprovado seja sancionado pelo prefeito.
Mas, segundo a própria pasta, já há restrição de tráfego nas praias da Capital, e áreas como dunas e lagoas têm controles específicos a depender do tipo de proteção ambiental estabelecidas. Na prática, essas normas já existentes limitam a atividade de Buggy-Turismo na Capital.
O que diz o projeto?
A norma de autoria do vereador Gardel Rolim (PDT) começou a tramitar no dia 23 de novembro e foi aprovada pelo plenário na quarta-feira (1º), sete dias depois. Mas a redação final do texto da lei ainda será votada pelos parlamentares. Só depois desse trâmite, se aprovada, a lei seguirá para sanção do prefeito, que poderá vetá-la ou aceitá-la.
A proposição é genérica quanto às áreas que poderão ser percorridas pelos buggys em Fortaleza. Pois não traz definições das rotas em si.
O texto foca nos detalhes sobre as exigências que os condutores e os veículos envolvidos na atividade devem obedecer. Porém, os possíveis trajetos é o que mais tem chamado atenção no projeto, e gerado repercussão.
A proposição cria um serviço que já existe em outras cidades cearenses, como Caucaia, Aracati, Jijoca de Jericoacoara e Beberibe, mas nesses municípios a definição dos locais por onde os buggys podem trafegar é feita em conjunto por órgão de trânsito, meio ambiente e turismo, com base em legislações já existentes.
Há restrições de tráfego nessas áreas
A Secretaria de Turismo de Fortaleza diz que a Lei 8.002/1997 proíbe o tráfego de veículos automotivos nas praias de Fortaleza. No que se refere a dunas e lagoas, esclarece a pasta, tais áreas podem se enquadrar em diferentes categorias, sendo reconhecidas ou não como Unidade de Conservação (UC).
Nesse caso, há modalidades de UC nas que são Áreas de Proteção Ambiental (APAs) e devem ter um plano de manejo. É esse documento que determina as permissões ou proibições de diversas atividades.
Um exemplo dado pela Secretaria de Turismo é o do Plano de Manejo das Unidades de Conservação da Sabiaguaba, que inclui o Parque Natural Municipal das Dunas de Sabiaguaba e a Área de Proteção Ambiental de Sabiaguaba.
Nele, diz a pasta, “o tráfego de veículos é proibido de maneira geral, sendo permitido somente em situações específicas, como em ações de fiscalização e monitoramento realizadas pelos órgãos competentes objetivando a proteção da Unidade de Conservação”.
Quais são os trechos permitidos?
Pelo teor do projeto aprovado, em Fortaleza, só será possível saber em quais trechos de praias, dunas, lagoas e sítios arqueológicos os buggys poderão trafegar após a regulamentação feita pela própria Prefeitura, via Secretaria Municipal de Turismo.
Nas redes sociais, o Instituto Verdeluz, composto por pesquisadores e ativistas da área ambiental, levantou o debate sobre a autorização do trânsito de buggys em áreas protegidas. Em nota, a organização aponta ainda que “o projeto de lei não passou pela Comissão do Meio Ambiente no legislativo” e tampouco envolveu “a discussão necessária com a sociedade civil”.
No trâmite na Câmara Municipal, o projeto passou pela Comissão de Constituição e Justiça e Comissão de Desenvolvimento Econômico, antes de ser votada em plenário. A assessoria da Câmara informou que quem determina qual comissão deve passar é o presidente do legislativo. A pauta em questão, diz: “passou por duas comissões. Portanto, tramitou de forma correta”.
Uma das biólogas voluntárias do Instituto, Alice Frota, e atual coordenadora do Gtar-Verdeluz - projeto de proteção às tartarugas marinhas em Fortaleza - também pondera que “é mais um atividade invasiva que não gera lucro para a comunidade local, pois os bugueiros não são de lá, e que prejudica a fauna e flora”.
Ela destaca que a diferença para outras cidades “é que Fortaleza é uma área urbana, altamente ocupada, que já estrangulou seus últimos remanescentes de áreas naturais”.
“No contexto de Fortaleza, todas essas áreas de praias, dunas, lagoas e sítios arqueológicos já sofrem inúmeros impactos, e em quase sua totalidade estão em Unidades de Conservação de Proteção Integral, inviabilizando trânsito de veículos”.
O Diário do Nordeste entrou em contato também com a Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) e com a Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC) sobre o assunto, e aguarda um retorno desses órgãos.
Necessidade de diálogo
A nota emitida pelo Instituto Verdeluz reforça que todas essas áreas são protegidas por legislação federal, caso do Código Florestal, e resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
Além disso, relembra, “os últimos remanescentes de dunas, praias e lagoas preservadas e sítios arqueológicos estão localizados nas nossas Unidades de Conservação, a exemplo do Parque Natural Municipal das Dunas da Sabiaguaba e Parque Estadual do Cocó. Nessas Unidades de Conservação é proibido o trânsito de veículos nas dunas, praias e lagoas pelo Plano de Manejo”.
Outro ponto destacado como preocupação é “o impacto potencial nos ninhos da tartaruga-de-pente, espécie criticamente ameaçada de extinção que desova nas nossas praias do Futuro e Sabiaguaba".
A bióloga Alice Frota ressalta que em outras áreas, fora de Fortaleza, é possível fazer o ordenamento do Buggy Turismo.
“Fomentando um ecoturismo sustentável e responsável, mas que isso seja dialogado com a sociedade civil e os órgãos ambientais responsáveis, através de consulta pública, diálogo com as OSC ambientais e os órgãos públicos de fiscalização e proteção ambiental”.
A Secretaria Municipal de Turismo também ressaltou que “no momento, não há estudos específicos, no que diz respeito à esfera ambiental, para implementação de roteiros turísticos com a utilização de veículos automotivos em áreas geridas pela Secretaria Municipal do Urbanismo e Meio Ambiente, nem tampouco de parte da Secretaria do Turismo de Fortaleza”.
Obrigações dos condutores de veículos
O projeto também estabelece que a outorga das autorizações para exploração do serviço é de competência da Secretaria Municipal de Turismo. Essa autorização, dada aos motoristas, terá validade de 6 anos e deve ser fixada na parte interna do veículo em local visível
Já o Certificado de Registro de Veículo Credenciado, documento que autoriza o veículo a realizar o serviço de "Buggy-Turismo", será válido por 1 ano. A credencial está vinculada à data de renovação do licenciamento do veículo junto ao Departamento Estadual de Transito (Detran).
O projeto diz que são dever do bugueiro:
- Possuir Carteira Nacional de Habilitação, categoria “b” ou superior, com autorização para exercer atividade remunerada;
- Submeter o veículo à vistoria da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor);
- Apresentar comprovante de regularidade com as Receitas federal, estadual e municipal;
- Apresentar certidões negativas de antecedentes criminais expedidas pela Polícia Civil, Polícia Federal, Justiça Estadual e Justiça Federal;
- Comprovar a contratação de Seguro de Acidentes Pessoais a Passageiros (APP) e do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT);
- Ter cadastro junto à SEFIN para recolhimento de ISS;
- Apresentar o Certificado de Segurança Veicular – CSV se houver alguma modificação nas características originais do veículo;
- Utilizar logotipo “Buggy-turismo” padronizado nas laterais e capuz.