Evitar circular e ter contato com outras pessoas é medida recomendada desde o início da pandemia, e reforçada pelas barreiras sanitárias no Ceará. Com o avanço da variante Delta do coronavírus, porém, especialistas apontam falhas que prejudicam a eficácia dos bloqueios.
Daniele Queiroz, epidemiologista e doutora em Saúde Coletiva, avalia que as barreiras são medidas “muito importantes nesse momento no Ceará, já que houve introdução da cepa Delta em alguns municípios e em outros não”.
Delimitar áreas com circulação da variante, bloquear a entrada e a saída das pessoas, realizar testes e aferir temperatura são formas de identificar as pessoas doentes.
A especialista relembra que, em outro momento da pandemia, foram instaladas barreiras sanitárias nos municípios cearenses, “mas o acesso aos exames era muito restrito, diferente de hoje”. “Dependendo do local, o próprio município pode realizar o teste. Temos testes rápidos excelentes”, pontua Daniele.
Os cuidados, aliás, devem ser os mesmos de sempre: usar máscara, higienizar as mãos com frequência, evitar tocar olhos, boca e nariz; e evitar ambientes sem circulação de ar. “Uma pessoa isolada com a Delta representa 5 novos doentes a menos. É preciso atenção”, alerta.
“Barreiras não reduzem casos e óbitos”
Para Caroline Gurgel, virologista, epidemiologista e professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), as barreiras não têm impacto comprovado em estudos na redução dos indicadores de casos e óbitos no Estado.
“Toda estratégia na epidemiologia requer comparação do antes e depois. Com a vacinação, por exemplo, houve redução comprovada de casos e óbitos. Com as barreiras sanitárias, não temos o que afirmar. Muitos burlaram, viajando, indo e vindo”, lamenta.
A virologista pontua que é necessário um trabalho educativo com a população que realmente necessita transitar dentro da própria cidade ou migrar a outras, todos os dias, “para que usem máscara sempre e evitem ao máximo o contato com outras nas regiões”.
A principal medida sanitária, então, como Caroline indica, é “reduzir o máximo possível do fluxo de pessoas para o Ceará. O correto seria barrar a entrada, mesmo após o teste, que pode dar falso negativo e a pessoa passar a ter sintomas já dentro do Estado”.
“Com teste falso negativo, a pessoa acredita ter segurança para entrar em contato com outras, com familiares, e aí vem a explosão de casos. Esse é o perigo. A formação de uma nova onda começa dessa forma”, explica a epidemiologista.
A Secretaria Estadual da Saúde (Sesa) reforça que "ter um exame negativo não afasta a possibilidade de ter Covid-19", uma vez que o paciente "pode levar até 14 dias para manifestar a doença", período em que estará transmitindo.
“Bloqueio só funciona se for 100%”
País que se tornou referência mundial no combate ao coronavírus, a Nova Zelândia adotou o bloqueio total de entrada e saída de pessoas, além da coleta de exames, rastreamento e isolamento de casos. Para a epidemiologista Lígia Kerr, só assim a medida é, de fato, eficaz.
O bloqueio não tem eficácia 100%: reduz a velocidade de disseminação, mas precisaria ser total. O rastreamento no aeroporto de Fortaleza, por exemplo, identificou pessoas com a Delta só 10 dias depois.
A nível local, a médica e também professora da UFC menciona o período do primeiro lockdown em Fortaleza, “quando houve realmente um bloqueio e acabou funcionando melhor”. De outra forma, “estudos avaliam que as barreiras raramente são efetivas”.
A aposta, então, aliada aos protocolos sanitários amplamente divulgados no Ceará há 17 meses, é uma só: ampliar a vacinação.
“O aumento da imunização é importantíssimo, porque protege a população de formas graves e óbitos. Mas é preciso lembrar de que uma pessoa vacinada pode, com pouco ou nenhum sintoma, estar transmitindo o Sars-CoV-2. E a cepa Delta chega a ter carga viral 1.200 vezes maior do que a original”, pontua a médica.