São poucos metros entre os apartamentos de alto padrão no bairro Aldeota, em Fortaleza, e a casa de vão único e telhado baixo onde vive Sandra Holanda, de 57 anos - presente na cena em que a fome impôs a busca por comida em caminhão de lixo. Enquanto a vida acontece, a ex-diarista é uma das milhões de pessoas que mantêm o hábito de sonhar.
“O meu sonho é ajeitar essa casa, passar um cimentinho, porque está muito distiorada”, compartilha. A esperança de um futuro melhor também vem pelo desejo de algo que pode passar despercebido entre as rotinas. “Perdi meus dentes todos. Colocar uma prótese também é meu sonho”, revela enquanto sorri com timidez para as fotos durante a entrevista.
Sem acesso aos serviços de saúde, a mulher inicialmente reluta, inclusive, em sorrir para a câmera
Sandra, assim como tantos, sobrevive sonhando. Nesta semana, ela se integra a um grupo de pessoas que revelam ao Diário do Nordeste conta, por meio do "Especial Eu Tenho um Sonho", histórias ligadas a esses desejos, mostrando que, possíveis ou não, são diversos, fortalecedores e funcionam como sustentação para o presente e o porvir. São íntimos, universais e coletivos. Estão em todos, ainda que no silêncio.
Na casa simples em que vive e sonha reformar, Sanda vivem sem o básico. Luz só entra pela porta da frente, no espaço de piso batido e paredes com tijolos à mostra. A pandemia agravou a situação financeira da familía. Eletricidade e água encanada foram cortadas no período. E o banheiro seuqer foi construído dentro da residência.
“A minha geladeira era cheia de coisa, tinha iogurte e verduras, mas agora se você abrir aí… No mercantil, eles não querem que a gente pegue mais nada. Está proibido. E o carro (do lixo) está passando 3h da madrugada”, frisa.
Desde que perdeu a renda das faxinas e das lavagens de roupa, por causa da pandemia da Covid-19, Sandra viu o cenário de vulnerabilidades se intensificar.
O lugar apertado onde vive com o esposo deficiente visual pertenceu ao irmão da mulher. Os dois moram no lugar há quatro anos, mas antes disso, Sandra viveu por 15 anos em situação de rua - “abrigada” em um prédio abandonado na região.
Em meio ao sufoco, voluntários e pessoas sensibilizadas com a história dela enviaram cestas básicas e pagaram o débito, em cerca de R$1.000, da soma entre as contas de água e de luz. “Eu vou ganhando e vou repartindo, porque eu não vou comer e deixar elas (filhas) com fome”.
Além dos filhos, a avó acompanha quatro netos mais próximos a quem ajuda como pode e com o pouco que consegue. “Ave Maria, minha família é tudo que eu tenho na minha vida”, resume sobre o significado das pessoas por quem se fortalece.
Isso porque compartilhar faz parte da rotina de Sandra, mas não sem antes esforço. No corredor lateral da casa fica o carrinho de mercantil usado para trazer os alimentos encontrados na rua ou frutos de doações.
Depois da repercussão nacional do vídeo, outra ferramenta sobre rodas entrou para a realidade: a mulher ganhou um carrinho de lanches e, agora, busca recursos para a compra o material para preparar cachorros-quentes.
Quero estar trabalhando nesse carrinho, ajeitar minha casa e ir levando a vida. Não tenho ambição não, sabe? Tendo minha barriga cheia e onde trabalhar eu pretendo botar minha vida para frente
Sandra pretende vender os lanches para conseguir ter o básico em casa. “Eu estava com Bolsa Família, mas cortaram não sei o porquê. Ainda recebi três parcelas do Auxílio Emergencial e comprei essa geladeira, comprei esse fogão de segunda mão, porque eu cozinhava com álcool”.