Dormir com a chuva no telhado de casa não é um som reconfortante para as 21 mil famílias que moram nas 89 áreas de risco de Fortaleza. A água traz consigo uma ameaça real de alagamentos e, com eles, prejuízos, como os que atingiram 3.110 pessoas cadastradas junto à Coordenadoria Municipal de Proteção e Defesa Civil. Do montante, 1.229 famílias foram autorizadas a receber um valor de aproximadamente mil reais, mas 336 ainda aguardam o auxílio da Prefeitura.
É o caso da moradora do Barroso I, Olga Rafaelly Gonçalves da Silva, 32, que teve a casa invadida pelas águas no dia 24 de janeiro. O recurso chegaria para substituir alguns dos bens perdidos no alagamento. Em nota, a coordenadoria especial explicou que 1.881 pedidos foram arquivados por "estarem fora da poligonal (de alagamento) ou não atenderem aos critérios". Há ainda dez sob análise.
Desde a visita dos agentes da Prefeitura, no Conjunto Nova Assunção, há cerca de quatro meses, Olga Rafaelly não tem notícias sobre o andamento do auxílio. Desempregada, ela viu cômodas e armário serem destruídos pela água. "Quando dá uma chuvinha, a gente não dorme à noite, preocupada e com medo de amanhecer o dia com a casa cheia d'água. A gente também fica preocupada com as crianças que não tem para onde ir", lamenta Olga.
A mesma tensão cerca toda a vizinhança ultimamente. As sete pessoas que moravam na casa da estudante de direito Flávia Cavalcante Queiroz, 29, tiveram que se mudar para a residência dos avós. Parte das coisas está em cima de mesas e a outra armazenada no vizinho. "Perdi tudo. Esse ano já foram quatro alagamentos em que a água subiu mais de um metro e meio", relata.
Flávia acrescenta que também há riscos à segurança. "Na última (grande chuva), morreu uma criança eletrocutada porque a água subiu no nível da tomada. Ele estava deitado na rede, desceu e morreu. Então é um caso muito sério", narra.
Insuficiente
A moradora do São Cristóvão, Ana Lúcia, 45, enfrenta uma situação crítica por estar desempregada e cuidar sozinha de quatro filhos. Sofrendo com enchentes desde o dia 11 de janeiro, a família perdeu vestuário, fogão, ventilador, alimentos, armário, cama, três colchões e outros bens importantes na moradia.
Mesmo estando entre os 883 cadastros que já receberam o auxílio, a mulher fala que o valor de mil reais não foi suficiente para repor os utensílios danificados, apenas os colchões e o ventilador. "Não cobriu o que eu perdi", lamenta.
Sem condições de reestruturar a casa onde, Ana Lúcia relembra a agonia que viveu. "Quando começou a dar uma chuva pesada, eu imaginava: 'Meu Deus, quantos anos eu passei gastando com tudo o que tenho e estou perdendo num piscar de olhos?'. Eu chorava que nem uma criança e minha filha (falava), 'mãe, tenha calma, vai dar certo'.