Fortaleza é uma cidade com edificações de alturas diversas, mas assim como outros grandes centros urbanos, tem áreas bastante verticalizadas. A construção de grandes prédios ocorre há décadas e os efeitos têm aspectos positivos e negativos. Enquanto algumas áreas têm edifícios de mais de 100 metros de altura, em outras eles são proibidos. Mas, afinal, o que define esse limite? Quais áreas são mais verticalizadas? Por que em alguns territórios há imóveis bem mais altos do que em outros, e qual o impacto disto?
O Diário do Nordeste veicula, a partir desta segunda-feira (4), uma série de matérias acerca dos processos de verticalização de imóveis em Fortaleza, respondendo a algumas questões sobre o que é permitido perante a legislação vigente, e discutindo ainda os impactos no cenário estrutural e social da cidade.
Uma das principais discussões é sobre a elevação dos imóveis. A demarcação sobre o limite da estatura de um prédio não é uma equação tão simples. A altura (ou gabarito) máxima das edificações permitida em Fortaleza varia conforme a zona de ocupação na qual o prédio está inserido.
Logo, o limite não é o mesmo para a cidade inteira. Esse é o primeiro ponto.
Pelo Plano Diretor de Fortaleza, trechos do Centro e da Aldeota têm o maior limite de altura dos prédios: 95 metros, o que equivale a 32 andares. Mas, esse parâmetro é uma espécie de “exceção” e existe desde 2017, quando entrou em vigor a nova Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (Luos).
A norma estabeleceu 22 Zonas Especiais de Dinamização Urbanística e Socioeconômica (Zedus) e trechos do Centro e da Aldeota são classificados nessa zona.
Nas demais zonas da cidade em que o Plano prevê incentivos à verticalização o limite máximo de altura é de 72 metros (cerca de 24 andares). Mas, nem sempre as áreas em que o poder público estimula a verticalização são as mesmas nas quais o mercado imobiliário deseja construir.
Fortaleza tem ainda outros limites de altura a depender do zoneamento que são 48, 36, 24 e 15 metros.
Confira as zonas de Fortaleza e os bairros com os maiores limites de altura do prédios
- Zonas Especiais de Dinamização Urbanística e Socioeconômica (Zedus) - 95 metros
Centro (parte do bairro) e Aldeota - Zona de Ocupação Consolidada - 72 metros
Meireles, Aldeota e Dionísio Torres (parte do bairro). - Zona de Ocupação Preferencial 1 - 72 metros
Centro, Jacarecanga, Carlito Pamplona, Álvaro Weyne (parte), Bairro Ellery, Presidente Kennedy (parte do bairro), São Gerardo, Parquelândia, Parque Araxá, Amadeu Furtado, Rodolfo Teófilo, Bela Vista (parte do bairro), Damas, Jardim América, Bom Futuro, Benfica e Parreão. - Zona de Ocupação Preferencial 2 - 72 metros
Fátima, José Bonifácio, Joaquim Távora, Dionísio Torres (parte do bairro). - Zona de Ocupação Moderada 1 - 72 metros
Guararapes, Jardim das Oliveiras, Luciano Cavalcante, Cidade dos Funcionários e Edson Queiroz (parte do bairro).
Para definir os parâmetros de verticalização, o poder público considera uma série de elementos técnicos, como:
- O cálculo da altura em si;
- O índice de aproveitamento do terreno (quantas vezes é possível construir - em m² - acima de um terreno);
- A zona de localização do prédio (que é distinta da divisão dos bairros);
- Os recuos na área e;
- A permeabilidade do solo.
Outros aspectos limitadores de altura também precisam ser observados, explica o arquiteto e vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) do Ceará, Henrique Alves, são:
- O cone de aproximação das aeronaves - há normas estabelecidas pelo Comando Aéreo Regional (Comar);
- As áreas com sítios históricos;
- E critérios relacionados à paisagem.
O Plano Diretor (lei municipal atualizada a cada 10 anos) é o instrumento que organiza e orienta como as cidades devem crescer. No de Fortaleza, (em vigor desde 2009 e que está em processo de revisão) a cidade é dividida em zonas. O limite de altura das edificações nos 121 bairros é estabelecido a partir delas.
O que é o zoneamento e como os bairros são enquadrados?
Na prática, o zoneamento tenta organizar a cidade e divide os bairros em áreas conforme as características urbanísticas, de uso e ocupação. Essa divisão, feita pelo poder público, serve para, dentre outros pontos, estabelecer a densidade da cidade, ou seja, como as áreas devem ser habitadas, a partir da quantidade de pessoas e atividade desejáveis nelas.
O estabelecimento dessas regras pode gerar maior ou menor concentração de pessoas, habitações e atividades em determinados territórios.
Por exemplo, a chamada Zona de Ocupação Consolidada (na qual constam bairros como Meireles e Aldeota) é aquela que já é bastante ocupada e tem infraestrutura. Já a de Ocupação Preferencial (nas quais estão, dentre outros, o Bairro de Fátima, Jacarecanga e Benfica) é aquela que há disponibilidade parcial de infraestrutura e serviços urbanos.
Essas diferenças demarcam se haverá ou não incentivo à verticalização.
A própria orla de Fortaleza ilustra essas distinções de permissão. Embora bairros que vão da Barra do Ceará à Praia do Futuro estejam todos enquadrados na chamada Zona da Orla, o limite permitido de altura se diferencia ao longo dos trechos: indo de 15 a 72 metros a variação do limite.
Outro ponto a ser considerado é que há bairros nas quais parte do território fica em uma zona e parte em outra. Logo, dentro do mesmo bairro pode haver variação do limite máximo da altura das edificações. São exemplos dessa situação, dentre outros: o Mucuripe, o José Walter, o Montese e o Dionísio Torres.
Áreas com limites menores
As áreas com o menor limite (15 metros, o equivalente a 5 andares) têm zoneamento diverso também, são: Zona de Ocupação Restrita; Zona de Recuperação Ambiental, trecho de Zona da Orla, Zona de Interesse Ambiental e incluem bairros (ou trechos) como: Barra do Ceará, Cristo Redentor, Pirambu, Coaçu, Paupina, Sabiaguaba. Neles, a verticalização não é desejável ou incentivada.
“A verticalização pode ser muito positiva quando eu tenho uma área muito suprida de infraestrutura. Áreas onde eu não tenho essa construção, não são o ideal. Verticalizar é, por exemplo, sobrecarregar os transportes”.
Mas, esses parâmetros são orientações gerais, e o limite de altura por si só não é considerado de forma isolada no incentivo à verticalização. Assim, se um bairro está em uma zona cuja altura máxima é de até 72 metros, isso não significa obrigatoriamente que toda e qualquer construção nele vai pode atingir esse limite, somente por estar nessa zona.
Do mesmo modo ocorre com o limite de 15 metros. Outros parâmetros urbanísticos precisam ser atendidos.
É possível ultrapassar o limite de altura?
Apesar desses parâmetros, a cidade tem edificações mais altas que os 95 metros. A maior delas tem 170 metros. Por que isso ocorre? Porque nas normas urbanísticas há alguns mecanismos, previstos no Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/2001) que asseguram, por exemplo, a permissão para construções ultrapassarem esse parâmetro.
Cidades como São Paulo, Natal e Fortaleza regulamentam dispositivos como a chamada Outorga Onerosa. Esse mecanismo é um instrumento previsto no Estatuto da Cidade. Em Fortaleza, que regulamentou o instrumento em 2015, áreas como o Mucuripe, Meireles, Centro e o São Gerardo têm edificações com mais de 95 metros.
Questionada sobre as edificações mais altas de Fortaleza, a Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) reitera que “para se identificar os prédios mais altos é necessário, antes de tudo, levar em consideração a área na qual as edificações estão inseridas, pois para cada zona da capital existe um gabarito máximo estabelecido”.
Em relação aos bairros mais verticalizados, a Seuma indica a Aldeota e o Meireles. Em outros bairros como a Varjota, Fátima, Mucuripe e Dionísio Torres, conforme a pasta, “também se observa esse processo de verticalização”.
Efeitos da verticalização
O arquiteto e professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (UFC), Renan Cid Varela, reforça o porquê de o plano diretor se preocupar em limitar a altura.
“Quando falamos em verticalizar, por um lado tem aspectos positivos, por outro negativos. Estamos adensando. Construindo mais unidades habitacionais em uma mesma localização. Isso evita algo que é negativo em relação aos recursos disponíveis. Recursos para viabilizar infraestrutura, transporte, abastecimento, esgotamento e rede de circulação”.
Contudo, pondera Renan, a verticalização também traz aspectos negativos. “Quando a gente verticaliza de um jeito que não seja dentro do planejado, estamos exercendo uma pressão na localidade. Pressão sonora, poluição do ar, agravamento sobre o esgotamento e abastecimento”, acrescenta. Por isso, destaca, “há que se falar em certos limites para essa verticalização”.
Ele também destaca que, “para além da necessidade de barrar o crescimento para áreas mais distantes”, é preciso coordenar a verticalização para trechos da cidade que a infraestrutura possa acomodar e isso não pode comprometer os parâmetros ambientais necessários para a qualidade urbana, como a ventilação, o acesso a luz natural e a diminuição dos focos de pressão das infraestruturas instaladas.
“Uma cidade sustentável é uma cidade de poucos deslocamentos. Para isso a verticalização é bem vista. Por outro lado, não estamos falando apenas de crescer indiscriminadamente. Há limites para que a gente possa ter condições ambientais favoráveis”.