Depoimentos emocionados de sobreviventes marcam primeira semana de júri da boate Kiss

Os quatro réus devem ser ouvidos nos próximos dias

O júri sobre o incêndio na boate Kiss, que acontece em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, completa uma semana nesta quarta-feira (8). O período foi marcado pelas declarações emocionadas dos sobreviventes da tragédia.

Os quatro réus devem ser ouvidos nos próximos dias. Em seguida, acusação e defesas iniciam os debates que antecedem a definição da sentença, que pode ser de absolvição ou condenação dos acusados, definida pelos jurados.

Ao todo, o incêndio na boate Kiss deixou 636 feridos e 242 mortos na noite do dia 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria.

Os réus do caso são: Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, sócios da boate Kiss; Marcelo de Jesus dos Santos, vocalista da Banda Gurizada Fandangueira, e Luciano Bonilha Leão, produtor musical.

Kiss era um 'labirinto'

No primeiro dia de julgamento, a sobrevivente Kelen Giovana Leite Ferreira relatou, emocionada, que chegou a cair na tentativa de fugir da festa em chamas.

A mulher teve parte da perna amputada em razão dos ferimentos sofridos. Cerca de 18% do corpo dela foi queimado na ocasião. 

A promotoria questionou se Kelen Giovana tinha a mesma percepção de outros depoentes de que a "Kiss era um labirinto". Ela respondeu que "sim". 

Além dela, a ex-funcionária da boate, Kátia Giane Pacheco Siqueira, foi ouvida pelo juiz, pelos representantes do Ministério Público e pelos advogados dos réus. A sobrevivente teve 40% do corpo queimado e, durante o júri recordou os momentos de sofrimento e dor.

A depoente afirmou que as mudanças realizadas durante a reforma do local contribuíram para o incêndio.

"Com todas as coisas que eles fizeram [na reforma], com a elevação do palco e a colocação de espuma, eles [os donos] tentaram matar a gente", declarou.

'Não sou assassino'

Ainda na última quarta-feira (1º), o réu, Luciano Bonilha Leão, chegou aos prantos ao Foro Central de Porto Alegre. 

Sobrevivente passa mal

No segundo dia de júri, a sobrevivente Jéssica Montardo Rosado precisou de atendimento médico. Na tragédia, ela perdeu o irmão, Vinícius Montardo Rosado, na época com 26 anos.

 

Segundo o Correio do Povo, a vítima chorou várias vezes ao relembrar a morte do irmão, que, conforme relatou, ajudou mais de dez pessoas a sair da boate.

Atitude 'apelativa e desnecessária', diz juiz

O juiz responsável pelo julgamento, Orlando Faccini Neto, chamou atenção no terceiro dia de sessão. O magistrado, que possui um tom de voz tranquilo, interveio em algumas declarações dos advogados de defesa dos réus e dos promotores, responsáveis pela acusação. 

O magistrado interferiu durante uma ação da defesa do réu Elissandro Spohr, em que o advogado Jader Marques chamou o cliente para o centro de auditório e, frente a uma sobrevivente da tragédia, questionou se ela odiava o acusado. Em resposta a atitude do jurista, o magistrado a tachou como "apelativa e desnecessária". 

Ainda no mesmo dia, um membro da defesa de um dos réus, Luciano Bonilha, levantou a voz com uma das testemunhas, o gerente da loja onde foram comprados os artefatos que causaram o incêndio, Daniel Rodrigues da Silva, provocando uma discussão. O juiz Faccini Neto precisou interferir.

Nomes duplicados em lista de sobreviventes 

Na segunda-feira (6), uma inconsistência na informação sobre a quantidade de vítimas do incêndio atrapalhou o julgamento.

O imbróglio começou quando Stenio Rodrigues Fernandes, apontado entre os 636 sobreviventes (pela lista oficial), afirmou ao júri que estava em Caçapava do Sul, a 100 quilômetros de Santa Maria, no momento do incêndio.

Segundo a Folha de S. Paulo, responsável pela informação, o relato de Stenio, ex-promoter da boate, levantou dúvidas no júri sobre a lista de vítimas que sobreviveram à tragédia, divulgada pelo Ministério Público.

'Errei'

O ex-técnico de som da banda Gurizada Fandangueira, Venâncio da Silva Anschau, admitiu, na terça-feira (7), que errou ao desligar o áudio do palco quando o fogo foi iniciado.

 

Anschau teve problemas respiratórios em decorrência da tragédia e precisou de internação.

Juiz eleva voz contra testemunha 

A postura do juiz Orlando Faccini Neto voltou a chamar a atenção dos espectadores que acompanhavam a sessão de terça-feira. Durante o depoimento do diretor do Departamento Administrativo do Corpo de Bombeiros Militar, Gerson da Rosa Pereira, o magistrado aumentou o tom de voz ao ser interrompido pela testemunha. 

A testemunha começou a responder os questionamentos do juiz antes das 15h. Ao ser indagado pelo Ministério Público, Gerson se mostrou incomodado com as perguntas, afirmando que as questões já eram objeto de inquérito policial e de processos judiciais, por isso não tinha "obrigação nenhuma de saber". 

Faccini Neto repreendeu o bombeiro e disse que ele não estava dando o mesmo tratamento à promotora Lúcia Helena Callergari, do MP.