Nas últimas semanas, pessoas que utilizam o medicamento Ozempic, que tem como princípio ativo a semaglutida, lidaram com uma surpresa: a dificuldade para encontrar o medicamento em farmácias pelo Brasil. Indicado no tratamento de diabetes tipo 2, ele tem sido usado, em muitos casos, para emagrecimento, um dos efeitos colaterais previsto em bula.
O sumiço do remédio virou notícia em portais e jornais pelo país após alerta da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), que orientou a pacientes diagnosticados a procurar um médico com o objetivo substituir o medicamento caso o Ozempic não seja encontrado.
Por trás de tudo isso, no entanto, o problema acabou expondo uma realidade: a do uso do medicamento de forma indiscriminada, sem acompanhamento médico. Apesar do custo elevado - uma caixa pode ser comprada por cerca de R$ 800 -, os relatos de como utilizar mesmo sem orientação de profissionais de saúde têm se multiplicado nas redes sociais.
Acompanhamento médico
Assim, nutrólogos e nutricionistas têm alertado para a importância de entender a finalidade do Ozempic, com os devidos cuidados que só são possíveis diante da ajuda profissional. Segundo o médico nutrólogo Fernando Guanabara, é necessário saber como o medicamento age, de fato, no corpo.
"O Ozempic está sendo utilizado para ajudar no processo de emagrecimento, mas é importante ressaltar que nesse quesito é uma medicação off label. Não há na bula informação de que ele pode ser usado para emagrecimento, mas as pessoas que o utilizam emagrecem porque ele é um análogo GLP-1, que é um peptídeo intestinal que acaba aumentando a saciedade e modulando a fome", explica ele, ressaltando que, consequentemente, a sensação de saciedade faz com que o paciente coma menos.
A comercialização no Brasil foi concedida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), indicando que não há problemas na utilização do fármaco. Entretanto, a ressalta está no fato de que o uso para perder peso não está previsto em bula e, portanto, não existe recomendação para tal atualmente.
Enquanto isso, ainda no início de março, em meio à repercussão, a Novo Nordisk, fabricante do medicamento, divulgou comunicado alertando que não endossa a utilização do remédio de forma off label.
"O Ozempic, aprovado e comercializado no Brasil para diabetes tipo 2, não possui indicação aprovada pelas agências regulatórias nacionais e internacionais para obesidade", declarou a fabricante.
A compra, inclusive, só é possível mediante apresentação de receita médica, o que expõe ainda mais fortemente a necessidade de acompanhamento profissional no uso.
"É uma prática muito perigosa. O processo de emagrecimento precisa ser acompanhado por um médico nutrólogo para justamente evitar deficiências nutricionais, para impedir que o paciente perca massa muscular, por exemplo", comenta Fernando Guanabara.
O que é o Ozempic?
Em pessoas com diabetes tipo 2, o Ozempic age estimulando a insulina a controlar a glicemia, consequentemente a hemoglobina glicada, controlando os níveis de açúcar no sangue. O efeito do emagrecimento, portanto, não é a finalidade oficial do remédio.
"Mas vale lembrar que esse uso não é proibido. Não só o Ozempic, mas outras medicações podem ser utilizadas de forma off label para o emagrecimento, não é nada irregular ou ilegal se o médico tem o conhecimento para isso", reforça o nutrólogo.
A semaglutida é aprovada para obesidade em diversos países no mundo na dose de 2,4 mg/semana. No Brasil, apesar de aprovada desde 2 de janeiro, apenas a formulação com dose máxima de 1,0 mg está disponível.
Processo de emagrecimento
Exatamente por isso, a importância de lembrar que o emagrecimento é um processo longo tem se tornado ainda mais necessária entre os profissionais de saúde. O alerta foi feito até mesmo pelo Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
Em nota conjunta com a Associação Brasileira para o estudo da Obesidade (ABESO), a SBEM publicou diversas orientações à população sobre o uso da semaglutida, incluindo a indicação de, apesar de que o medicamento não deve ser condenado, o tratamento para obesidade deve ocorrer em diversas frentes.
"O tratamento medicamentoso da obesidade, sempre em conjunto com estratégias de estilo de vida, é recomendado em diversas diretrizes de tratamento ao redor do mundo por aumentar a eficácia dessas estratégias. Como qualquer outra doença crônica, a manutenção da eficácia dependerá da manutenção do tratamento e é esperado que a recuperação de peso ocorra caso o tratamento medicamentoso seja abandonado", informou o comunicado.
A perda de peso, lembra Fernando Guanabara, não ocorre de forma simples e rápida, resumindo o processo a "dois ou três meses". "O processo de emagrecimento é dividido em fases. A primeira fase consiste na perda de peso, mas a segunda é de manutenção, que é super importante para não perder esse avanço", diz o médico.
Reabastecimento do medicamento
Por conta do desaparecimento do Ozempic das farmácias, a Novo Nordisk explicou, junto ao comunicado sobre o uso, as ações possíveis para quem utiliza o medicamento para diabetes.
"Pacientes com diabete tipo 2 afetados têm a opção de mudar o tratamento para outros medicamentos da mesma classe (análogos de GLP-1). Para isso, eles devem consultar o seu médico e seguir estritamente as suas orientações", diz a nota.
Conforme balanço da empresa, o reabastecimento de distribuidores, atacadistas e farmácias no País deve ser normalizado durante o segundo trimestre de 2023, logo após o aumento da capacidade de produção anual da empresa.