Por dia, em média, quatro mulheres denunciam serem vítimas de crimes sexuais no Ceará. Por trás da estatística da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) há informações que os abusos vêm de diversos lados, seja por parte dos próprios familiares, desconhecidos ou até mesmo profissionais da área da saúde, nos quais elas depositam confiança para se manterem a sós no consultório.
Nos últimos dias, mais um caso envolvendo médico na condição de abusador foi registrado no Estado. A Polícia Civil investiga um homem de 71 anos que teria vitimizado sexualmente, pelo menos, seis mulheres, em Orós, no Interior. A partir do registro recente se rememora que em menos de três anos foram a público outros episódios envolvendo mais três médicos, todos eles homens, e que teriam se valido da profissão para cometer abusos.
Dentre os casos com maior repercussão estão o de José Hilson de Paiva, que passou a ser conhecido nacionalmente como Dr. Assédio, e Cícero Valdizébio Pereira Agra. Juntos, eles somam quase 40 vítimas que decidiram denunciá-los às autoridades.
José Hilson cumpre medida cautelar, sendo monitorado por tornozeleira eletrônica. Cícero Valdizébio sequer foi levado ao presídio. Já o suspeito dos casos mais recentes em Orós foi detido, mas foi solto ao pagar fiança de R$ 30 mil. Com a continuidade da investigação, o médico foi novamente preso nessa sexta-feira (1º).
A reportagem questionou o Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (Cremec) sobre interdição cautelar destes médicos. Até a edição desta matéria, o Conselho não emitiu resposta se eles estão autorizados ou não a exercer a Medicina atualmente.
CASO VALDIBÉZIO
No fim do ano passado, o Ministério Público do Ceará (MPCE) denunciou o médico Cícero Valdizébio Pereira Agra por crime sexual mediante fraude. Cícero passou a ser investigado pela Polícia Civil desde que pacientes contaram sobre abusos sofridos dentro do consultório na região do Cariri, Interior do Estado.
Dentre os relatos, as mulheres dizem que tiveram os "seios massageados", "cabelos puxados" e a "calça tirada" durante as sessões, enquanto o médico afirmava que as atitudes eram parte do tratamento. Já no início de 2022, uma terceira vítima o denunciou.
Acontece no próximo dia 13 abril a primeira audiência para ouvir uma das vítimas e o acusado. Uma segunda sessão, para outra mulher prestar depoimento, está agendada para o mês de junho. As pacientes de Valdizébio disseram aos policiais que durante as consultas o homem agia de forma constrangedora e teria abusado delas na maca, dentro do consultório da clínica onde atendia.
Consta em documentos que a reportagem teve acesso que, uma das vítimas estranhou a atitude do médico quando ele fez perguntas de cunho sexual, "como se ela estava namorando, e como estava a rotina sexual dela, o que a deixou profundamente constrangida e sem reação, visto que em nenhuma outra consulta com médico algum, a autora já havia sido submetida a tais indagações".
"Assim, a autora, já espantada desde o início da consulta, deitou-se sobre a maca, constrangida e quieta, mas ainda sem entender muito bem, pois, jamais, em sua cabeça, mesmo após tais perguntas, a autora imaginava que no decorrer daquele procedimento médico, iria ser abusada sexualmente, até porque por óbvio, se assim imaginasse, teria saído do consultório no mesmo momento".
O assistente de acusação, Aécio Mota, pondera "que não pode uma pessoa acusada dos atos a ele imputados, caso seja considerado culpado, receber somente uma censura. Acrescento que uma justiça tardia, não é justiça".
DR. ASSÉDIO
Em 2019, o Sistema Verdes Mares teve acesso a 63 vídeos, feitos entre 2009 e 2012 com, pelo menos, 23 mulheres, além de dezenas de fotos de partes íntimas de pacientes tiradas pelo ginecologista José Hilson, durante exames em Uruburetama e Cruz.
Hilson foi denunciado por abuso sexual a pacientes. Alguns dos atos, inclusive, foram gravados pelo próprio prefeito, durante consultas nas cidades de Uruburetama e Cruz. Pelo menos 17 mulheres foram assediadas.
Em 46 gravações, ele foi visto protagonizando atendimentos invasivos e com clara conotação sexual. Um dos vídeos mostra, inclusive, imagens em VHS, o que deixa claro o quanto a prática era antiga. Em muitos casos, os abusos aconteciam sem que a paciente sequer percebesse a violência.
O médico se apresentou espontaneamente à Polícia no dia 19 de julho de 2010 e foi detido. Em abril de 2020 ele saiu da prisão, diante à pandemia. A defesa do réu, representada por Leandro Vasques, argumentou pela liberdade dele destacando que José Hilson se enquadra no grupo de risco do novo coronavírus.
Na ação penal a que respondeu na Comarca de Cruz, Hilson foi condenado a 12 anos de reclusão. A defesa informa que este caso permanece em grau de recurso, aguardando julgamento perante o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. Já a ação penal da Comarca de Uruburetama aguarda apenas a sentença.
CASO EM BATURITÉ
O outro caso de abuso sexual envolvendo médico em exercício da profissão foi em Baturité. No início do ano 2020, um médico foi preso em flagrante suspeito de praticar violência sexual contra um paciente da Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) da cidade.
O profissional foi autuado em flagrante por violação sexual mediante fraude. Na época, o secretário de Saúde do município se pronunciou sobre o caso dizendo tomar as devidas providências e que ele foi demitido.