Integrantes da Polícia Militar do Ceará (PMCE) enviaram áudios no WhatsApp se referindo pejorativamente a policiais mulheres da Corporação. Os comentários machistas resultaram na instauração de um Inquérito Policial Militar (IPM) por parte do Comando da PMCE.
Já a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD) informou ter tomado conhecimento do caso e adotado providências iniciais necessárias à apuração na seara administrativa disciplinar. Os áudios da conversa que o Sistema Verdes Mares teve acesso indica que, pelo menos, três militares fizeram comentários com teor machista.
A conversa entre PMs do 11º Batalhão da PMCE, em Itapipoca, teria acontecido na noite da última quarta-feira (15). Um primeiro servidor expressa sua opinião afirmando que as policiais do sexo feminino deviam permanecer no quartel, e não nas ruas, para que quando retornassem aos batalhões elas pudessem tirar o "estresse" deles.
"Eu tenho uma visão sobre essas Pfems. Sabe o que era para ser feito, no caso? Elas eram para estar no quartel para tirar o estresse da gente. Chegasse estressado e tal ela era para estar lá e resolver a parada, tá entendendo?" (sic), disse um agente. Outro policial concorda com a ideia e sugere que o Comando Geral deveria atender ao pedido. Já um terceiro envolvido no diálogo acrescenta que a tese é interessante: "Polícia sofre muito. É um estresse psicológico, pressão psicológica grande nas ruas".
Atuação feminina
Atualmente, de acordo com a PMCE, 4% do efetivo total é composto por militares mulheres. Dentre delas está a tenente Maria Aparecida de Freitas Moraes. A oficial é a primeira mulher a gerir o Comando de Policiamento de Choque (CPChoque) da Polícia Militar do Ceará. O anúncio do novo comando foi feito há uma semana. Ontem, após a PMCE divulgar em nota que rechaça comentários preconceituosos, a tenente comentou a infelicidade do fato.
"Infelizmente este comportamento aconteceu de forma velada. Nos ofende e atingiu a classe. Existem vários casos isolados. Eu, por estar em uma posição de oficial, talvez não sofra tanto. É bem mais com praças (soldados, cabos, sargentos e subtenentes). Há mulheres assumindo posições importantes na Polícia, chegamos aos poucos. O comando do coronel Alexandre deixou a mulher em uma posição visível de profissionalismo. Ele nos dá esta confiança", disse a tenente.
A coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Gênero, Idade e Família da Universidade Federal do Ceará (UFC), Celecina Sales, destaca que quando a mulher entra em um espaço historicamente composto por homens, o machismo é ainda mais escancarado. De acordo com a estudiosa, a cultura machista quer impor erroneamente que o local das mulheres não é nas ruas.
"Nós percebemos que as mulheres chegaram nestes espaços, mas a discriminação ainda é muito forte, inclusive pelos colegas de trabalho. Eles acreditam que aquele lugar não é dela, é como se fossem intrusas. É forte a questão do preconceito. São várias questões e que quando colocadas dentro de uma Corporação Militar, mais grave. A presença delas incomoda. Passam por concurso e quando entram esbarram com esse tipo de preconceito. A rua também é espaço das mulheres", ponderou Celecina.
A tenente Maria abordou também que a categoria como um todo sofre preconceito e as mulheres trabalham tão quanto os policiais homens: "Não estamos falando de uma pessoa qualquer que disse estas coisas, é de um homem que veste a farda. Meu pensamento desde que entrei na Polícia é o de somar. Comentários assim precisam deixar de ser engraçados", disse a oficial.
Repúdio
A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) divulgou nota dizendo repudiar "qualquer conduta patriarcal, que pregue o desrespeito à mulher, colocando-a como figura inferior ao gênero masculino, seja qual for o âmbito da sociedade". De acordo com a Pasta, os áudios estão sendo devidamente apurados. O secretário André Costa também publicou, ontem, em uma rede social que se solidariza "com as policiais que ouviram áudios depreciativos e repugnantes"