O Tribunal de Justiça do Ceará decidiu na tarde desta quarta-feira (5) manter a ida do advogado Aldemir Pessoa Júnior ao Tribunal do Júri, pela morte da empresária Jamile Oliveira Correia. O caso considerado pela Justiça como feminicídio completa cinco anos em agosto de 2024.
De acordo com a decisão proferida em sessão ordinária da 2ª Câmara Criminal do TJCE, a materialidade está demonstrada a partir dos laudos periciais, depoimentos colhidos e cabe a corte popular apreciar o fato.
A relatoria do caso é do desembargador Francisco Eduardo Torquato Scorsafava, que não acolheu o recurso da defesa e disse que não há porquê para a nulidade da sentença de pronúncia.
"No que diz respeito aos elementos indiciários, há sim farta documentação a justificar o processamento e a pronúncia", afirmou o desembargador.
Outros dois desembargadores acompanharam o voto do relator.
Em novembro de 2023, o Diário do Nordeste divulgou que em 1º grau a decisão era de levar Aldemir ao Júri Popular. O processo acerca do caso tratado pela Poder Judiciário como feminicídio segue em segredo de Justiça.
Aldemir nunca chegou a ser preso pela morte da ex-namorada.
SUSTENTAÇÃO ORAL
Antes dos desembargadores votarem aconteceu a sustentação oral da defesa e da acusação. A defesa do acusado, representada pelo advogado Armando da Costa Júnior, pediu a 'despronúncia' e dividiu a tese em três partes, dentre elas alegando a nulidade da pronúncia pelo cerceamento da defesa.
O advogado apontou que teria solicitado prazo maior ao magistrado da 4ª Vara do Júri para apresentar as alegações finais, o que não foi considerado; que há informações que Jamile já tinha tentado suicídio anteriormente e questionando a veracidade do depoimento de uma ex-namorada do acusado, "que tem raiva de Aldemir".
O representa do Ministério Público do Ceará (MPCE), procurador Sávio Amorim, ponderou que "a argumentação da nulidade deve ser rejeitada" e destacou o resultado do laudo feito na arma usada na ação, apontando o sentido do disparo que seria incompatível com suicídio.
O assistente de acusação, advogado Flávio Jacinto complementou a fala acrescentando que a ex-namorada de Aldemir que depôs contra o réu só não foi vítima de feminicídio, assim como Jamile, devido à intervenção de um policial quando o acusado a espancava.
"Este caso é complexo e a gente precisa ter muita cautela. Sobre o cerceamento de defesa pelo juízo não ter apreciado as alegações finais, não vislumbro prejuízo"
O acusado chegou a ficar temporariamente suspenso de exercer a profissão, mas há meses segue em situação regular na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), conforme consulta da reportagem junto ao Cadastro Nacional de Advogados (CNA).
SOBRE O CRIME
A empresária foi baleada nos primeiros minutos da madrugada de 30 de agosto de 2019. Chegou a ser socorrida ao Instituto Doutor José Frota (IJF), passou por cirurgia, mas não resistiu aos ferimentos. A mulher morreu no dia seguinte.
Jamile morreu em agosto de 2019. De início, o caso foi tratado como suicídio, até que surgissem as primeiras suspeitas que o namorado da vítima poderia estar envolvido no crime de homicídio.
O caso foi comunicado à Polícia Civil, que passou a tratar o fato como feminicídio. A tese passou a ser considerada pelos investigadores comandados pela delegada Socorro Portela, e então adjunto da distrital, delegado Felipe Porto.
As primeiras imagens da vítima sendo socorrida intrigaram a família de Jamile. Nas cenas gravadas pelas câmeras de segurança do prédio da empresária, o adolescente está visivelmente desesperado, enquanto "chegando ao elevador, o acusado pegou o corpo da vítima por um braço e uma perna, tornando-a ao chão, não mostrando qualquer preocupação com situação", conforme o MP.
INVESTIGAÇÃO E DENÚNCIA
Em setembro de 2019, um dos laudos da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) apontou que amostras do DNA da empresária só foram encontradas na extremidade do cano da pistola calibre 380. Segundo o laudo, no restante da arma foram encontrados material genético de Aldemir e do policial civil responsável por apreender o objeto, parte da investigação.
No fim de setembro aconteceu a reprodução simulada dos fatos. O adolescente, filho de Jamile participou da reconstituição, mas Aldemir não. Para o Ministério Público, "levando-se em consideração tudo de apresentado na presente peça processual, bem como o comportamento do réu durante toda a investigação, a dúvida que resta é se, quando do novo ataque proferido por Aldemir, dentro do closet, ele agiu com dolo direto ou eventual em gerar a morte da vítima, não restando dúvida, pois, da existência do dolo".
Em maio de 2021, o órgão acusatório denunciou o advogado Aldemir Pessoa Júnior pelos crimes de feminicídio, lesão corporal, fraude processual e porte ilegal de arma de fogo.
A denúncia aconteceu após o caso passar por diversas varas do Poder Judiciário do Ceará, ir ao 2º Grau do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), retornar à 1ª instância e até mesmo motivar divergência de pareceres entre integrantes do MPCE.