PEC da Anistia: maioria dos deputados do Ceará silencia sobre mudanças na véspera da votação

A comissão especial agendou a votação da PEC da Anistia para a tarde desta terça-feira (26)

Prestes a ser votada em comissão especial na Câmara dos Deputados, a PEC da Anistia (9/23) deve conseguir maioria na Casa, apesar de boa parte dos deputados cearenses silenciarem sobre seus votos. A matéria tem adesão em legendas de quase todo o espectro ideológico, unindo base e oposição, que devem reforçar o aval à matéria em plenário.

O Diário do Nordeste contatou toda a bancada estadual na Câmara para comentar as impressões sobre o texto, incluindo os votos, mas só Eunício Oliveira (MDB) e Domingos Neto (PSD) demonstraram suas opiniões.

O emedebista afirma que é favorável à PEC, mas resiste a um tópico em específico. "Sou presidente estadual do partido, sou dirigente nacional do MDB, agora em relação à outra parte, é ajuste da lei. Para deixar claro, para não ficar numa resolução do TSE, e sim na Constituição, aí tudo bem. Agora, a anistia ampla, geral e irrestrita, já coloquei minha posição contrária", disse Eunício.

"Tem um parágrafo que perdoa, inclusive, quem já foi condenado. Eu não voto de jeito nenhum nisso. [...] Se tiver destaque no plenário sobre isso, eu votarei a favor do destaque, contra a anistia dos que já foram condenados", acrescentou.

Ele se refere ao parágrafo único do artigo 2º do substitutivo do relator Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP) liberado na segunda (25), que trata sobre o perdão a partidos que não cumpriram a cota mínima de candidatas mulheres nas eleições. O trecho diz o seguinte:

Não serão aplicadas sanções que resultem na perda do mandato ou que acarretem inelegibilidade de candidatas ou candidatos eleitos por partidos que não tenham preenchido a cota mínima de candidaturas do sexo feminino nas eleições de 2022, quando a decisão judicial implicar redução do número de candidatas eleitas.

Na prática, os deputados estaduais do PL Ceará, cassados em maio pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) por fraude à cota de gênero, podem ser beneficiados. Alcides Fernandes, Carmelo Neto, Marta Gonçalves e Dra. Silvana estão nesse grupo.

O primeiro é pai do deputado federal André Fernandes (PL), que compõe a comissão especial sobre a PEC da Anistia. A última é esposa do deputado federal Dr. Jaziel (PL), que deve depositar o seu voto no tema em plenário. Os dois foram procurados pelo Diário do Nordeste, mas não manifestaram suas posições até o momento.

"Não é contra o PL, eu sou contra esse absurdo que condenado possa ser anistiado sem nenhuma justificativa. Não é para o PL, é para quem tiver, inclusive o MDB, se tiver", concluiu Eunício.

Domingos Neto, assim como Eunício, afirmou que votará favoravelmente ao texto, posição embasada no prazo de implementação das regras eleitorais que a Casa tenta modificar. 

"O artigo 16 da Constituição prevê que alterações nas regras eleitorais só devem ser feitas um ano antes do pleito. As resoluções que sustentam as multas eleitorais foram feitas fora desse prazo constitucional. Os partidos não tiveram tempo hábil de cumpri-las. Portanto, há o entendimento que não devem ser aplicadas para o pleito em questão", declarou por meio de nota.

A deputada Eliane Braz (PSD) também foi contatada por telefone e por e-mail, mas a reportagem não recebeu resposta. Ao O Globo, contudo, ela informou que votará contra o texto. 

"O estímulo à participação feminina por meio da cota de gênero está previsto há 26 anos. Estamos em 2023 e muitos partidos seguem insistentemente buscando jeitinhos para não cumprir a legislação. Queremos avançar muito mais. Não aceitamos nenhum retrocesso", afirmou.

Já os deputados Danilo Forte (União) e Priscila Costa (PL) comunicaram que precisavam estudar o texto antes de falar à imprensa. Dr. Jaziel (PL) também declarou que não vai comentar a proposta por ora.

A assessoria de imprensa de Matheus Noronha (PL) informou que o deputado está em missão oficial na China e não se manifestou sobre o tema.

Procedimento

Os parlamentares foram contatados diretamente e via assessoria por ligações, aplicativo de mensagem e e-mail, mas não se pronunciaram. A reportagem tenta contato desde a segunda-feira (25).

O silêncio dos deputados lembra postura observada em boa parte da bancada às vésperas da votação da reforma eleitoral, em que poucos demonstraram suas posições sobre o texto ou responderam à reportagem, até mesmo para informar que ainda aguardavam a finalização da redação.

O último pacote de mudanças eleitorais aprovado na Casa teve aprovação de 15 de 4 deputados federais cearenses (três estavam ausentes) no primeiro projeto e de 16 a 3 (com três ausências) no segundo projeto.

Trâmite

A comissão especial agendou a votação da PEC da Anistia para a tarde de terça-feira (26), mas o relator pediu mais um dia para avaliar a inclusão de novas sugestões dos colegas. A expectativa é que o texto seja votado em sessão nesta quarta-feira (27). Se aprovado, segue para o plenário da Câmara.

Nesta etapa, precisa do aval de 308 deputados em dois turnos para passar. Assim, pode ser encaminhada para o Senado, onde passará por mais duas votações em plenário, com o mínimo de 49 votos favoráveis.

A discussão foi encerrada na comissão especial na semana passada, ainda que a votação tenha ficado pendente, adiada pela terceira vez. 

PEC da Anistia

A previsão é que o texto que vai à votação na comissão especial nesta quarta seja mais ameno que o original. O parecer disponibilizado no começo da semana ampliou o alcance das cotas raciais nas eleições. O relatório anterior previa um teto de 20% para a destinação de recursos a essas candidaturas. Agora, prevê um piso de 20%.

O percentual ainda não é satisfatório para organizações de direitos civis, já que, apesar de não estar na Constituição, há entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – validado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – de que os recursos a candidaturas negras devem ser proporcionais ao volume de pessoas pretas e pardas lançadas às urnas.

Assim, no ano passado, o índice ficou em pouco mais de 50%, atendendo à proporção de candidatos negros.

O relator também descartou um dispositivo que previa a incorporação da cota de gênero nesses valores. Ou seja, evitou que mulheres e negros recebessem o mesmo recurso, o que levaria à diminuição do volume destinado à promoção desses perfis na política.

Está fora do relatório, ainda, a exigência de que mulheres tenham 10% de quociente eleitoral (QE) – conforme previsão da reforma eleitoral, aprovada na última semana – para ocupar a vaga de um homem a partir de 2024 para as câmaras municipais.

Dessa forma, a candidata mais votada do partido, mesmo que não tenha atingido o QE, vai pegar a vaga do candidato homem conquistada na fase de sobras.

O texto anterior previa o deslocamento da vaga para outra sigla, caso o partido não tivesse uma candidata mulher com mais de 10% do QE para ocupar a cadeira. 

A última versão apresentada pelo relator prevê também a reserva de 20% das cadeiras do Legislativo a mulheres a partir de 2026. Isso será feito de forma escalonada, com 15% para as eleições de 2024, se passar no Congresso até a primeira semana de outubro.