Nenhum deputado federal do Ceará enviou verba de emenda para ser aplicada neste ano na Política Nacional sobre Mudança do Clima. Em todo o País, a medida foi abordada por apenas um dos 513 parlamentares da Câmara dos Deputados: a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG). Ela destinou R$ 1 milhão para a implementação e monitoramento da política.
As mudanças climáticas e impactos ambientais têm sido reverberados no Parlamento Federal diante dos episódios de inundação que assolam o Rio Grande do Sul. Cerca de 70% dos municípios do estado gaúcho foram atingidos pelas fortes chuvas, registrando mortes, alagamentos e deixando milhares de pessoas desabrigadas.
Apesar de não terem destinados recursos especificamente para o tema, três dos 22 parlamentares cearenses na Câmara dos Deputados abordaram agendas ambientais na indicação de emendas individuais. São eles: Luizianne Lins (PT), José Guimarães (PT) e Célio Studart (PSD).
No ano passado, cada parlamentar teve direito a aproximadamente R$ 37 milhões em emendas individuais para indicar no orçamento deste ano.
Os dados sobre a alocação de emendas individuais dos deputados federais foram retirados do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento, referentes ao orçamento de 2024. Para verificação, foram consideradas todas as ações vinculadas ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
Indicações
A petista Luizianne Lins foi a que mais indicou recursos de emendas para agenda ambiental. Ao todo, foram R$ 3,2 milhões para implementação de ações de Cidadania e Educação Ambiental.
Procurada, ela destacou, por meio da assessoria de imprensa, que as ações envolvem capacitação de servidores, qualificação de gestores e produtores rurais e disseminação de técnicas de fomento e preservação do meio ambiente, com prevenção de incêndios, em municípios cearenses. O recurso deve contemplar 84 prefeituras.
"Na área da fauna, ações de educação ambiental de conscientização da sociedade quanto à proteção dos animais silvestres e ações de enfrentamento à caça ilegal, por meio do Cetas — Centro de Triagem de Animais Silvestres. As ações serão realizadas em 84 municípios e estão sendo alinhadas entre o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e o Ministério do Meio Ambiente", destacou a nota da parlamentar.
Líder do Governo Lula na Câmara, José Guimarães destinou R$ 547 mil para ações de prevenção e controle de incêndios florestais em áreas federais prioritárias. Ele frisou que todos os parlamentares têm o "dever tratar questões ambientais como prioritárias na destinação das emendas" e que seus recursos foram destinados para o Ibama.
"Nós parlamentares temos por dever tratar as questões ambientais como prioritárias na destinação das emendas, esse precisa ser um sentimento compartilhado. Por isso, destinei cerca de R$ 548 mil de emenda individual para o Ibama-CE em março de 2024", explicou.
À reportagem, ele ainda ressaltou que o Governo Lula (PT) está empenhado em ajudar as vítimas das enchentes e todo o setor produtivo do Rio Grande do Sul.
"O governo do presidente Lula está empenhado, com todos os seus ministérios, em ajudar as vítimas das enchentes, os empresários e todo o setor produtivo do Rio Grande do Sul. Foram destinados mais de R$ 50 bilhões para este fim, e é só o começo", afirmou por meio da assessoria.
O valor citado por Guimarães é referente ao que o Governo poderá movimentar de socorro à população gaúcha, autorizado por meio de Medida Provisória (MP) publicada na quinta-feira (9).
Já Célio Studart enviou R$ 400 mil para a implementação da Agenda Nacional de Proteção, Defesa, Bem-Estar e Direitos dos Animais. À reportagem, o parlamentar frisou, por meio da assessoria, que apresentou diversos projetos de lei sobre a preservação do meio ambiente, acrescido do combate às mudanças climáticas. Dentre eles, estão o PL 1995/2019, que cria o programa de compensação de fases do efeito estuda; o PL 4902/2020, que busca aumentar a pena por incêndios florestais; e o PL 4927/2020, que considera condenados por crimes ambientes inidôneos para obtenção de crédito rural.
Ele acrescentou que, durante a gestão de Ricardo Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente (2019-2021), seu mandato foi um dos mais presentes.
"Nosso mandato foi um dos mais presentes e objetivos no combate à passada de boiada, apresentando dezenas de projetos de decretos legislativos para sustar os atos do então ministro, bem como protocolo de requerimentos de informação questionando decisões do ministério e uma série de ações judiciais, como a que suspendeu a liberação de 63 agrotóxicos pelo MAPA, em novembro de 2019", ressaltou.
Célio, inclusive, anunciou nas redes sociais que estava indo ao Rio Grande do Sul para ajudar no salvamento de animais ilhados nas inundações.
O resto da bancada
Coordenador da bancada federal do Ceará, o deputado Eduardo Bismarck (PDT) alegou que a maioria dos parlamentares destinou recursos para pautas municipalistas, tendo em vista que representam municípios cearenses, e de combate à seca. Ele acrescenta que, indiretamente, algumas das medidas ajudam pautas ambientais.
"Nós não temos no Ceará uma destinação comum para questões climáticas, a gente tem muita (indicação de emenda) para o combate à seca. (...) Tem ações que ajudam contra a seca e ajudam questões climáticas. Uma coisa que serviria para os dois lados: uma passagem molhada, evita você ter um problema de inundação, assim como barragem, você retém a água... São esses tipos de ações que são mais comuns no Ceará, são ações mais voltadas para a gente sobreviver à seca e ajudar na agricultura e meio ambiente"
O deputado Yury do Paredão (MDB) foi um dos que destacou destinação com outros fins, mas que, indiretamente, protegem o meio ambiente.
"Destinei recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para captação, dessalinização, saneamento no interior do Estado. Essas ações estão vinculadas ao Ministério das Cidades, mas elas visam estruturar o acesso à água limpa, garantir o tratamento e reduzir o despejo de dejetos no meio ambiente", justificou.
Os deputados Mauro Filho (PDT) e Eunício Oliveira (MDB) informaram que a destinação de recursos de emendas para a política de mudança climática deve ser mais discutida nos próximos anos.
Após a publicação desta reportagem, o deputado federal Idilvan Alencar (PDT) procurou o Diário do Nordeste ressaltando também que há outras formas de investir recursos de emendas para ações ambientais. Ele citou como exemplo o envio de R$ 200 mil para limpeza e revitalização de uma lagoa no município de Acarape.
A destinação foi feita no formato de "emenda especial", onde o dinheiro vai diretamente para o caixa do ente, sem a informação da política pública estar vinculada ao Ministério do Meio Ambiente — critério utilizado pela reportagem.
"Em 2024, eu destinei R$ 200 mil para limpeza da lagoa do Acarape. É uma ação que tem todo o impacto ambiental na cidade. Já ajudei Pentecoste, já ajudei Russas, e, neste ano, Acarape (com ações de meio ambiente)", frisou Idilvan.
Demais parlamentares da bancada cearense também foram procurados, mas não se manifestaram até a publicação desta reportagem.
Mudança em destinação de emendas
Diante da situação de calamidade pública do Rio Grande do Sul em razão das fortes chuvas, o Congresso Nacional aprovou, na última quinta-feira, alterações no orçamento e na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) deste ano. A medida autoriza o remanejamento de emendas parlamentares para ações para ajudar na recuperação do estado, inclusive com abertura de créditos suplementares.
Já a mudança na LDO vai permitir que o Governo Federal execute com prioridade os recursos das emendas para cidades em situação de calamidade ou emergência em saúde pública — caso dos municípios afetados.
No mesmo dia, o Governo gaúcho estimou em cerca de R$ 19 bilhões o plano de recuperação do estado após as enchentes.
Outras medidas
Uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que tramita na Câmara dos Deputados desde o ano passado quer reservar 5% do valor das emendas dos congressistas para o enfrentamento de catástrofes e emergências naturais, se assim eles indicarem. A medida voltou a ganhar celeridade neste ano diante da tragédia no Rio Grande do Sul.
Ainda nesta semana, uma comissão temporária foi criada pelo Senado para centralizar os pedidos de projetos de lei e emendas constitucionais de interesse do estado gaúcho. Uma das prioridades do colegiado, inclusive, é uma PEC que busca autorizar o regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para atender necessidade diante de calamidade pública ambiental, seja ela regional ou local.
Além disso, o Governo Federal editou MP com iniciativas de socorro emergencial ao Rio Grande do Sul. São elas:
- Antecipação do pagamento do abono salarial de maio;
- Antecipação do pagamento do Bolsa Família e Auxílio-Gás de maio;
- Duas parcelas adicionais do seguro-desemprego, ao final, para quem já recebia o benefício;
- Prioridade na restituição do Imposto de Renda (IR) deste ano;
- Prorrogação por, no mínimo três meses, do recolhimento de tributos federais e do Simples Nacional;
- Força-tarefa para análise de créditos com aval da União destinado a 14 municípios;
- Dispensa nos bancos públicos de certidão negativa de débito para contratações e renegociações de crédito por empresas e produtores rurais;
- R$ 4,5 bilhões para garantia ou alavancagem de crédito no Fundo Garantidor de Operações (FGO) para micro e pequenas empresas;
- R$ 1 bilhão para desconto nos juros do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe);
- R$ 1 bilhão para desconto nos juros do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e do Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp);
- R$ 500 milhões para garantias de alavancagem, no Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (FGI-PEAC), para microempresários individuais, micro, pequenas e médias empresas; e
- R$ 200 milhões para financiamento nos bancos públicos de projetos de reconstrução da infraestrutura e reequilíbrio das empresas.
O impacto primário estimado pelo Ministério da Fazendo é de R$ 7,7 bilhões, mas a medida pode movimentar até R$ 50,9 bilhões.