Como Auri Moura Costa impulsionou a força feminina no Judiciário cearense

"As pioneiras do poder no Ceará": a desembargadora foi a primeira mulher juíza do Brasil e a primeira em um alto cargo do Tribunal de Justiça do Estado

Há 83 anos, no dia 31 de maio de 1939, uma mulher cearense foi nomeada a primeira juíza do Brasil. Desde esse feito, que se deu entre preconceitos e especulações, Auri Moura Costa, natural de Redenção, no interior do Ceará, abriu uma série de caminhos para que outras mulheres pudessem integrar e ajudar a construir os rumos do poder que assegura os direitos individuais, coletivos e sociais

Concorrendo com homens que historicamente ocupavam todos os espaços de comando, Auri foi, ainda, por mérito próprio, a primeira mulher presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE), a primeira vice-presidente do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) e diretora do Fórum Clóvis Beviláqua, na Capital, um dos prédios mais importantes que abrigam a Justiça cearense. 

Nesta reportagem, que é a primeira da série “As pioneiras do poder no Ceará”, o Diário do Nordeste conta como a história de Auri Moura Costa se entrelaça às das mulheres que vieram depois dela e como, juntas, elas fortalecem a representatividade feminina no Judiciário cearense. 

Os caminhos abertos por Auri 


Quando, em 1939, recém-formada em Direito, Auri passou em um concurso público e foi nomeada a primeira juíza do País em meio a uma Corte controlada por homens, houve quem reduzisse seu feito à possibilidade de terem confundido seu nome com um “masculino”.  

Essa especulação foi desmentida ao longo do tempo. No entanto, o boato revelou ali um machismo estrutural que acompanhou a trajetória de Auri no Judiciário e que reverberou na história do TJCE.  

Na galeria de ex-presidentes do Tribunal, de uma lista de mais de 50 homens, se sobressaem apenas duas mulheres que conseguiram chegar aos cargos mais altos: Águeda Passos Martins e Maria Iracema do Vale. Fora a desembargadora Nailde Pinheiro Nogueira, que atualmente preside o TJCE, Águeda e Iracema foram as únicas desembargadoras, em 148 anos de história da Corte cearense, eleitas para comandar o principal órgão de Justiça do Estado. 

“A nomeação da desembargadora Auri Moura Costa representou um marco histórico no Judiciário cearense por ter rompido paradigmas. Até então, predominava na Corte de Justiça a figura masculina”, lembra a desembargadora Iracema do Vale, segunda mulher a chegar ao cargo de presidente do Tribunal. Sua gestão foi entre os anos de 2015 e 2017. 

Para Iracema, Auri inspira mulheres a se afirmarem profissionalmente e a galgarem posições de destaque “não só no Judiciário, mas em todas as áreas políticas e administrativas”, uma vez que gênero não define competências e habilidades, especialmente de líderes.

Contudo, uma vez que mulheres chegam ao poder e têm consciência de sua representatividade, as discussões sobre gênero se tornam cada vez mais frequentes e são debatidas políticas internas para tentar tornar menos árduos não só os caminhos das que as vão susceder no poder como de todas as outras.

Iracema, por exemplo, se destacou por ter ajudado a implementar, em sua gestão, a Casa da Mulher Brasileira, um dos principais equipamentos públicos de defesa da mulher vítima de violência.

Nailde, por sua vez, criou o Programa de Desenvolvimento de Mulheres Líderes para promover a ascenção de mulheres no Judiciário.

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Representatividade 


Atualmente, no Tribunal de Justiça do Estado, 16 mulheres atuam como desembargadoras, o que representa 37,2% do total da Corte.  

Mas, apesar dos avanços, que foram impulsionados, também, pelas gestões de Águeda Passos, Iracema do Vale e Nailde Pinheiro, muito precisa ser feito para alcançar a paridade de gênero no Judiciário. 

Recentemente, a juíza Joriza Magalhães foi eleita, por merecimento, a nova desembargadora do TJCE. Na disputa, cinco mulheres se destacaram nas primeiras colocações da lista que definem o novo nome para o cargo, um acontecimento inédito na história do Tribunal e que demonstra que as mulheres do Judiciário estão cada vez mais competitivas. 

“Isso significa um avanço profissional feminino que inspira outras mulheres a sonharem e conquistarem cada vez mais patamares mais altos. A presença feminina dá à Justiça coragem, força e sensibilidade para cumprir a fiel missão de servir à sociedade”, compreende Joriza.  

Artigo de opinião


Leia, abaixo, um artigo de opinião da desembargadora Nailde Pinheiro sobre o pioneirismo e o protagonismo de mulheres no poder Judiciário.

Mulheres protagonistas: na Corte e na vida, um caminho sem retorno


Mesmo com todas as conquistas que as mulheres vêm obtendo ao longo da história, ainda há muito o que avançar para obtermos uma sociedade mais igualitária em todas as esferas, inclusive na de gênero.

Há tempos, está mais do que comprovado que as mulheres podem executar as funções ocupacionais e exercer os mesmos cargos de gestão que os homens, pois não é essa condição que deve determinar o lugar onde a pessoa quer chegar e o que ela deseja fazer, mas, sim, a capacidade, o esforço, o compromisso e a dedicação que desempenha diariamente.

Assim como em toda a sociedade, no âmbito do Judiciário, a força feminina vem se destacando cada vez mais. Hoje, em 148 anos de história da Corte, sou a terceira mulher a ocupar o mais alto cargo da Justiça estadual: o de presidente do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE).

Fui antecedida pelas ilustres desembargadoras Águeda Passos Rodrigues Martins, primeira mulher a presidir o Tribunal, no biênio 1999-2000, e Maria Iracema Martins do Vale, que esteve à frente no biênio 2015-2017. Suas histórias e de outras mulheres marcantes no nosso Judiciário que serão contadas, a propósito, em livro, produzido por nossa equipe de comunicação a ser lançado neste 8 de março.

Três é um número ainda singelo, mas representa muito, especialmente porque nossas conquistas ainda são graduais, mas têm se revelado irrevogáveis. Atualmente, temos 16 mulheres atuando como desembargadoras, o que representa 37,20% do total da Corte. No 1º Grau, nas varas e juizados, são 151 juízas, representando 36,03% do total.

Junto a elas, bem como a todas as outras, tendo a Justiça a trabalhar por políticas que as promovam e as protejam, assumi o compromisso de buscar sacramentar, de modo peremptório, nossos compromissos mais urgentes. Dentre estes, o de garantir que venham ainda muitas sucessoras, nesta e em outras funções de liderança e de grande relevância.

Seguindo esse norte, em minha gestão foi implantado o Programa de Desenvolvimento de Mulheres Líderes, iniciativa que visa a valorização e a capacitação continuada de nossas irmãs. Um curso que, uma vez assegurados os seus direitos, há de ser sem retorno.

Desembargadora Maria Nailde Pinheiro Nogueira
Presidente do Tribunal de Justiça do Ceará
E-mail: presidencia@tjce.jus.br