Obrigados por decreto estadual a entrar em isolamento social rígido a partir deste sábado (13), os municípios de Juazeiro do Norte, Caucaia, Maracanaú e Fortaleza tentam acelerar a inclusão de igrejas e academias entre as atividades essenciais na fase mais crítica da pandemia no Estado. As medidas atendem parcelas significativas de apoiadores políticos, apesar de impasses jurídicos entre decretos estaduais e municipais.
No ano passado, o primeiro lockdown gerou desgastes principalmente entre gestores e líderes religiosos com mandato político. O fechamento das igrejas foi alvo de críticas e mobilizações partidárias nas redes sociais e, para evitar novos embates, antes mesmo do decreto de lockdown neste ano, lideranças avançaram com as propostas principalmente nas Câmaras Municipais.
“Os prefeitos não querem pagar o custo político de decretar o lockdown, mas o govenador também está sendo muito pressionado”, observa Raulino Pessoa, professor da Universidade Estadual do Ceará (UECE), do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas (PPGPP).
Especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste consideram que existem pressões de diferentes setores, desde empresários a representantes religiosos, no que diz respeito a tornar uma atividade exceção no fechamento das atividades, sejam elas indústria, comércio ou igrejas.
“Quem tem poder de pressão não são os empregados, são os lobbys privados, unem a fome com a vontade de comer. O povo mais pobre, sem trabalho, está numa sinuca de bico, os grupos empresariais e da igreja buscam uma base social para pressionar o lockdown”, analisa Edir Veiga, mestre em Ciência Política e professor da Universidade Federal do Pará analisa o professor Edir Veiga
Para afrouxar as regras, os prefeitos se valem de mensagens próprias do Executivo ou de projetos de lei propostos por vereadores. Em alguns casos, os gestores registram e deixam público através de redes sociais o momento em que sancionam os textos.
Há, no entanto, a necessidade de regulamentação dessas regras antes de serem postas em prática.
Capital
É o caso de Fortaleza, onde o prefeito José Sarto (PDT), sancionou nesta quinta-feira (11), dois projetos assinados por vereadores que fazem parte do grupo de oposição. A regulamentação das medidas por demorar cerca de um mês ainda, após discussão técnica sobre os formatos de funcionamento.
O vereador e pastor Ronaldo Martins (Republicanos), autor do projeto que inclui igrejas, diz que o setor é essencial para acompanhar pessoas em situação de vulnerabilidade "Por conta de pais de família que ficam desempregados, as igrejas arrecadam alimentos. Pessoas viciadas em fase de acompanhamento. Se as igrejas fecharem essas pessoas poderão voltar para a vida do crime”, afirma.
Apesar do acordo com o Poder Executivo, a matéria será regulamentada junto a técnicos da Prefeitura e das áreas específicas.
Caucaia
A Câmara Municipal de Caucaia também entrou na discussão e aprovou proposta que inclui academias entre as atividades essenciais. A medida já sancionada pelo prefeito Vitor Valim (Pros). A expectativa é que a lei, proposta pela vereadora Camila Cavalcante (DEM), seja publicada no Diário Oficial do Município na próxima segunda-feira (15), segundo a prefeitura.
Através de redes sociais, a parlamentar agradeceu ao prefeito pela sanção da norma. "Quero agradecer ao prefeito Vitor pela atenção e, principalmente, pela sensibilidade ao compreender a importância do funcionamento das academias, claro, obedecendo rigorosamente a todos os protocolos sanitários recomendados pelos órgãos de saúde", escreveu.
“O grande problema é a possibilidade de contaminação, igrejas e academias de ginástica são dois lugares muito propensos para que o vírus se espalhe, seria prudente que isso fosse regulamentado, e que não funcionasse nesse período”, pondera ainda o professor Raulino.
O especialista alerta ainda que não há, nos dois setores, uma mobilização da população. “São os empresários que pressionam. Nas cidades maiores, há uma ação de empresários mais organizada que conseguem ter voz. Muito diferente das cidades pequenas. Mas nas maiores cidades é onde o vírus está mais disseminado”, pontua.
Juazeiro do Norte
Em Juazeiro do Norte, o prefeito Glêdson Bezerra (Podemos) revogou na sexta-feira (12) decreto municipal que proibia a venda de bebidas alcoólicas na cidade, diante do decreto estadual. “O nosso decreto perde a razão porque queríamos medidas mais restritivas para evitar o lockdown”, justificou.
Em paralelo, Glêdson sancionou duas leis aprovadas na Câmara que também classificam igrejas e academias como essenciais no município. As matérias foram apresentadas pelos vereadores Jacqueline Gouveia (Republicanos), no caso das igrejas, e Márcio Joias (PTB), em defesa das academias.
“Inegavelmente líderes religiosos e igrejas exercem influência positiva na vida das pessoas. Muitas pessoas largam vícios de modo geral através da orientação dos líderes religiosos, convivendo com a sociedade mais harmônica [...] E as atividades físicas, é inquestionável os efeitos de uma atividade bem supervisionada com o devido acompanhamento de profissionais, elas ajudam a manter taxas equilibradas e a condição física e mental”, defendeu o prefeito.
Maracanaú
No caso de Maracanaú, o prefeito Roberto Pessoa (PSDB) afirmou que “é sensível ao tema, apoia integralmente a atividade e está em vias de enviar um projeto para a Câmara Municipal neste sentido”.
A expectativa é que a mensagem do Executivo chegue à Casa Legislativa na próxima segunda-feira (15), onde será apreciada pelos vereadores.
Normas podem gerar impasses jurídicos
Considerar academias e igrejas como essenciais em apenas determinados municípios pode gerar conflito com a legislação Estadual. Como não há a mesma previsão no âmbito do Ceará, a medida pode ser alvo de questionamentos jurídicos.
O decreto estadual prevê que "no combate à COVID-19, os municípios não poderão adotar medidas de isolamento social menos restritivas ou liberar o funcionamento de atividades de forma diferente do estabelecido no Decreto n.º 33.965, de 04 de março de 2021".
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Na Capital, a lei já sancionada pelo prefeito Sarto Nogueira (PDT), e que passará por regulamentação, estabelece "igrejas e templos de qualquer culto como atividade essencial em períodos de calamidade pública no município de Fortaleza, sendo vedada a determinação de fechamento total de tais locais".