O acesso ao crédito deverá ser um dos principais pilares para a expansão do setor de carcinicultura no Ceará. No entanto, o baixo nível de formalização e legalização ambiental de pequenos e médios criadores — apenas 20% dos 1.300 no Estado estão devidamente regularizados — pode atrapalhar uma das metas do setor de dobrar a produção de camarão nos próximos 10 anos.
Segundo dados da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), 80% dos produtores de camarão no Ceará não possuem licenciamento ambiental, ficando impossibilitados de acessar linhas de créditos em bancos públicos ou privados.
Com os entraves relacionados aos recursos, muitos dos produtores acabam perdendo oportunidades de expandir áreas de produção e números de venda e faturamento, segurando a evolução do setor no Estado.
Para Italo Rocha, vice-presidente da Associação dos Produtores de Camarão do Ceará (APCC) e engenheiro de pesca, a maior barreira para a regularização de pequenos e médios ainda é a falta de conhecimento sobre o assunto, além da burocracia e os custos do processo.
"Os médios e grandes são licenciados. os pequenos produtores têm uma herança das outras culturas como arroz, gado, feijão, de não ser formalizados e trazem um processo bem artesanal. E quando a pessoa migra pra carcinicultura, eles não desenvolvem essa vontade de regularizar o licenciamento. Eles não vão atrás do licenciamento ambiental, da Adagri (Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Ceará), da Sefaz (Secretaria da Fazenda) para tirar nota, e isso atrapalha", disse.
"E tem produtores que não têm o conhecimento mesmo, achando que isso é invenção. Os que tem mais organização entendem que eles precisam da regularização, e quando fazem isso eles veem que conseguem acessar as linhas de créditos para desafogar os custos durante os períodos de baixa do camarão no mercado", completou.
Ganhos de produtividade
Rocha, também professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) em Morada Nova, defendeu que seria difícil medir os ganhos de produtividade da carcinicultura a partir da regularização dos pequenos e médios no curto prazo. Contudo, a movimentação impulsionaria tanto as fazendas individualmente quanto o ecossistemas em várias regiões do Estado.
"Só em ser um gargalo para acesso ao crédito nos bancos, o licenciamento limita a expansão da atividade, melhoria do nível tecnológico, de equipar a fazenda com itens novos. E quando você não tem o licenciamento você não consegue mandar um camarão para as unidades de beneficiamento e aí não entra no supermercado, não se tem rastreabilidade", disse Rocha.
"E quando um produtor se regulariza e começa a acessar os benefícios, como as linhas de crédito, outros ao redor vão olhando o crescimento e acabam buscando essa formalização. Ter esse crescimento seria positivo porque a gente acredita que o Ceará produz muito mais camarão do que é anunciado", completou.
Complexidade do processo
O professor do IFCE também destacou que o processo de licenciamento ambiental ainda exige muitas etapas e documentos, dificultando a vida dos pequenos produtores, que não possuem assistências técnicas especializadas ou têm recursos para pagar consultorias de auxílio.
"Para licenciar uma atividade de carcinicultura, eu preciso da escritura do terreno, que demanda um processo de cartório. Ele tem de pedir a anuência da Prefeitura, mas precisa contratar um engenheiro ou técnico. Depois precisa de um alvará, cadastrar na Adagri, fazer uma outorga de uso da água na Cogerh (Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos). Depois é certidão negativa da Sefaz. É um protocolo muito grande, e o pequeno produtor nem tem um nível de escolaridade elevado", explicou.
Iniciativas para a solução
Para tentar impulsionar o setor da carcinicultura e alcançar a meta de dobrar a produção nos próximos 10 anos, a Faec construiu uma parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para criar uma consultoria coletiva e de financiamento do processo de licenciamento para 100 produtores de camarão no Estado.
Segundo o presidente da instituição, Amílcar Silveira, o Sebrae irá arcar com 85% dos custos dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental, enquanto os outros 15% deverão ser pagos pelos produtores, como incentivo à regularização.
Após a entrega das licenças ambientais, a Faec ainda deverá promover um feirão de crédito com as principais instituições financeiras atuando no Estado para garantir as melhores opções aos empreendedores. O objetivo é conectar os produtores ao maior número de possibilidades e garantir descontos e redução de custos através das negociações.
"Estamos financiando 100 licenças ambientais, e depois vamos fazer um feirão de crédito para incentivar a competição e os descontos. Foi assinado o convênio, já estamos recebendo os contatos para entregarmos em 60 dias as licenças para os produtores", disse.
"Temos 16 mil hectares de camarão, e a nossa meta é dobrar em 10 anos. E como vamos preparar isso? É com crédito e ajudando na licença. No passado exportávamos US$ 30 milhões e o Equador US$ 90 milhões de dólares. Hoje, o Equador US$ 5 bilhões em camarão e o Ceará US$ 0", completou Amílcar.
Impacto ao mercado de trabalho
O crescimento da produção da carcinicultura no Ceará ainda poderia ser um fator importante para evolução do mercado de trabalho no agronegócio cearense. Segundo dados levantados pela Faec com pesquisas realizadas entre 2003 e 204 sobre o Nordeste brasileiro, a geração de empregos diretos por hectare do segmento é de 1,89. As comparações com outros mercados inclui a uva (1,44 empregos/ha), manga (0,42), cana-de-açúcar (0,35), e o coco (0,16).
Em relação aos empregos indiretos, a carcinicultura também aparece na frente, com 1,86 empregos/ha. Os outros itens apareceram empatados, com uma faixa de 0,7.