Construtora abandona obra de parque solar em Milagres, demite trabalhadores e não paga salários e rescisões

Lightsource bp, dona da Usina Solar Milagres, diz que “foi surpreendida pela atitude da Motrice”, construtora brasileira contratada para a obra do parque

Promessa de empregos e desenvolvimento econômico para a região do Cariri, a Usina Solar Milagres, em Abaiara, está agora no centro de um problema: a empresa Motrice, construtora brasileira contratada para tocar a obra do empreendimento solar, abandonou o projeto inacabado e demitiu 126 trabalhadores sem o pagamento de salários e verbas rescisórias, como indenização de aviso prévio, multa de 40%, 13º proporcional e férias.

À coluna, cinco trabalhadores desligados reportaram dívidas entre R$ 10 mil e R$ 24 mil. Considerando que muitos dos demitidos tinham entre um e dois anos de carteira assinada, a dívida pode facilmente passar de R$ 1 milhão.

A Motrice foi contratada pela multinacional Lightsource bp para a construção do projeto. A coluna procurou a Motrice por ligações e por meio da caixa de mensagens que a empresa disponibiliza em seu site, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.

Também procurada pela coluna, a Lightsource disse que foi “surpreendida pela atitude da Motrice, construtora contratada, que abandonou a obra no último dia 9 de julho, deixando obrigações inacabadas”.

Questionada pela coluna se, em meio a situação, estaria procurando outra empresa para que a construção fosse concluída, a Lightsource bp informou que “está avaliando a extensão das obrigações deixadas pendentes pela Motrice para definir os próximos passos”.

A Lightsource bp reforçou que está “em dia com todas as obrigações contratuais para com seus fornecedores, parceiros e contratados”. “Para além dos prejuízos que a Motrice causou diretamente à usina, a mesma também foi recentemente informada do não cumprimento de obrigações salariais da construtora para com seus colaboradores. A empresa informa que está buscando contato com a Motrice para mais esclarecimentos e exigindo que a construtora regularize a situação de pagamento dos colaboradores”.

Desempregados e sem as verbas rescisórias, ex-funcionários atrasam contas e relatam aflição

Os trabalhadores desligados pela Motrice relataram à coluna as dificuldades que têm enfrentado sem o pagamento das verbas rescisórias. Um deles acabou de ser pai. Com o filho recém-nascido, ele conta que está difícil para pagar contas básicas, como água, aluguel e fazer a feira.

Outro ex-funcionário, servente de obras, também falou do que tem passado em casa com os recursos para a família acabando. “Com adiantamento do dia 15 atrasado, vale-alimentação atrasado, as coisas acabando e duas crianças dentro de casa para eu olhar e pensar no que vou fazer”, lamenta.

Diante da situação preocupante, um grupo de trabalhadores desligados se reuniu e foi para a frente da Lightsource bp cobrar algum posicionamento. “Eles chamaram a polícia pra gente. Os policiais chegaram educadamente e orientaram a gente a se retirar”, disseram os ex-funcionários da Motrice.

Sobre a situação, a Lightsource bp afirmou que a polícia foi chamada “apenas para liberação do acesso do local aos demais trabalhadores e toda a ocorrência seguiu de forma pacífica”.

Pedido de mediação junto ao MPT-CE

O coordenador de fiscalização do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção de Estradas, Pavimentação e Obras de Terraplanagem em Geral no Estado do Ceará (Sintepav-CE), Archimedes Fortes, disse à coluna que foi protocolado junto ao Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE) um pedido de mediação entre as empresas, Lightsource bp e Motrice, e os trabalhadores afetados.

Procurado, o Ministério Público do Trabalho no Estado disse que, “até o momento, não há procedimento nem pedido de mediação junto ao MPT sobre essas empresas”. A Lightsource disse que não foi acionada pelo Ministério Público do Trabalho do Ceará.

Em 2022, o Diário do Nordeste noticiou a construção do Complexo Solar Milagres, da Lightsource BP, com investimento de R$ 800 milhões. Na época, foi prevista a geração de 800 empregos na construção dos parques, com prioridade para mão de obra local.