Nos últimos 45 dias, houve anúncio de ampliação de voos da Air France no Nordeste, algo que não acontecia desde o 2º semestre de 2017, quando a francesa anunciou a chegada em Fortaleza.
Ainda mais, a empresa anunciou sua segunda base no Nordeste: Salvador.
Por todos esses quase 7 anos, o sucesso precoce dos voos em Fortaleza criava a esperança que rapidamente novas operações poderiam surgir. Nos últimos anos, porém, nós, observadores da cena aeronáutica, muito nos perguntamos: quando a Air France ampliaria os voos no Ceará?
Assim, dada a demora nos incrementos, passamos a compartilhar o que pensávamos serem as limitações e, com o olhar de hoje, entendemos o que, na verdade, havia.
Não havia slots suficientes para novos voos?
Tínhamos em mente que haveria alguma limitação institucional de rotas que impedisse a Air France de incrementar frequências em Fortaleza. Isso porque mesmo após a pandemia, os voos operavam com elevadíssima ocupação, mas o ‘ponteiro’ de frequências não se movia.
Observando o direito lateral de rotas entre Brasil e França, a Anac mostra:
Pensávamos que as limitações de voos da Air France poderiam ter relação com as baixas quantidades de frequências (02) entre pontos na Franca e na região Nordeste do Brasil, ou ainda, pontos (03) fora de Rio de Janeiro e do Terminal São Paulo (03).
Quando pedimos melhor orientação à Anac, a autoridade aeronáutica respondeu-nos:
“O que o acordo estabelece é que todas as 36 frequências (28+2+3+3) podem ser operadas em Fortaleza, caso a empresa aérea assim o desejar. Na realidade, as restrições são aplicáveis para pontos que não contemplam Fortaleza”, informou a agência.
Restrições de voos, portanto, ocorrem para pontos fora da região Nordeste e Rio de Janeiro e Terminal São Paulo.
Ainda mais, então, perguntei como seria possível incrementar voos com apenas 36 frequências semanais, dado que se somássemos os voos comerciais entre Brasil e França de Guarulhos e Galeão, 4 partidas diárias (Air France + Latam), 28 frequências; 3 de Fortaleza, são 31. Se eu contabilizar a ligação entre Viracopos e Orly (Azul Linhas Aéreas) são 6 por semana, totalizando 37 ligações, retornando mais que as 36.
Seria esse o motivo do não incremento da Air France, a Azul teria pedido os voos à França primeiramente?
“Cabe também esclarecer que as 36 frequências são para cada país - ou seja, 36 frequências operadas por empresas francesas e 36 frequências operadas por empresas brasileiras”, disse a Anac.
Assim, ainda haveria disponíveis mais 35 frequências semanais para serem trabalhadas. Apenas 5 extras estão sendo pedidas, de forma que serão atingidas 42 (37 + 5) frequências semanais apenas, diante de 72 possíveis.
Definitivamente, não havia nenhuma limitação institucional para a Air France não ter incrementado voos antes em Fortaleza.
Com as 5 frequências extras da Air France a partir de outubro, cai por terra o mito de qualquer limitação de slots nessa causa.
Não havia nada pensado para a Bahia?
E pensar que, em abril, perguntamos à Air France sobre boatos de que a companhia abriria uma base em Salvador. A companhia negou veementemente:
“Não há notícias sobre isso para agora, uma nova base envolveria os altos escalões da companhia”, cravou Manuel Flahault, diretor-geral da Air France-KLM na América do Sul.
O Nordeste comporta duas bases de Air France-KLM?
A resposta é: sim. Conforme já escrevemos, o incremento de assentos da Air France para 2024 no Nordeste será de “apenas” 12.000 assentos por mês, o que equivale a um crescimento de apenas 6% em assentos Nordeste-Europa, se comparamos com a quantidade de 2019.
É um incremento sustentável, arrojado em frequências adicionais, mas não de todo em assentos globais. A demanda está muito forte. Os números são muito encorajadores.
Ademais, os voos se complementarão, dias que a francesa não opera em Fortaleza, o viajante partirá por Salvador e vice-versa.
Consigo observar uma estratégia bem construída.
Ainda, Fortaleza e Salvador terão perfis diferentes de bases: Fortaleza tem alimentado os voos praticamente sozinha.
Já em Salvador, de partida, a aposta é na pujança de conexões domésticas da Gol para alimentar suas frequências, até nisso haverá complementaridade. O raio de captação doméstica da Gol é fortíssimo e deverá rivalizar com o raio de captação de Gol-Air France – KLM em Guarulhos e Rio de Janeiro.
KLM não volta para Fortaleza porque se mudará para Salvador?
Nesse tempo todo pós-pandemia, teria a KLM “desprezado” Fortaleza porque se mudaria para Salvador? Teria tido a KLM maus resultados em Fortaleza?
Terminantemente, não! Já comentamos que a KLM teve excelentes resultados em Fortaleza em 2018, 2019 e nos poucos meses antes da pandemia de 2020. Os resultados eram até melhores que os da Air France.
De fato, então, a KLM estava enfrentando problemas internos para retomar as rotas de Fortaleza como problemas de aeronaves e/ou slots em Amsterdã.
A Air France inclusive comentou que uma das dificuldades para aprovar a base Salvador era garantir aeronaves disponíveis.
Para corroborar com a derrubada desse mito, quando a 2ª base Nordeste de Air France-KLM é anunciada, não é a KLM que chegará em Salvador, mas, novamente, a Air France.
Air France é premium demais para o Nordeste?
Uma das dúvidas sobre o incremento de bases Air France era relacionado à capacidade de o público garantir pagando tickets reconhecidamente altos, como os que marcam a Air France em Fortaleza.
Mais uma vez, porém, a empresa apostará na aeronave mais moderna do mundo no Nordeste, na base Salvador, o Airbus-350, com até 34 assentos-cama e alta gastronomia francesa. Tudo de melhor que a Air France oferece para clientes do mundo inteiro, estará disponível também para o Nordeste brasileiro.
Pensar que, quando a Air France chegou em Fortaleza, na verdade, esta iniciou como sua subsidiária “low cost” que já não mais existe, a Joon. Rapidamente, porém, Fortaleza mostrou o valor do Nordeste para a francesa que passou a operar com a “grife” aérea prestigiada no mundo todo.
Há quem diga: só Rio e São Paulo possuem voos high yield (alto ticket). Estão cada vez mais enganados. A Air France investirá forte no Brasil a partir de 2024.
TAP e, principalmente, Air Europa, que empilha 300 passageiros numa aeronave menor (Boeing 787-800), precisarão se preparar melhor para lutar pelo cliente nordestino.
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*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.