A Embraer foi mapeada pelo Banco Morgan Stanley, nas últimas semanas, como empresa “top pick”, algo como “escolha principal” no setor aeroespacial, numa tradução livre. O reporte do Banco aponta forte valorização para as ações da empresa brasileira fabricante de aviões.
Entre 19 de fevereiro e 18 de março, o valor da ação subiu de R$ 22,68 para R$ 29,63, quase 30% de crescimento de valor.
“Nós enxergamos a Embraer como um terceiro player aeroespacial comercial à altura da situação e forçando a entrada no duopólio da Boeing e da Airbus”, escreveram Kristine Liwag e equipe do Banco. “Após décadas de investimentos, a Embraer entra em período de colheita.”
Na segunda-feira (18), inclusive, no resultado do 4º trimestre de 2023, a Embraer teve lucro de R$ 973,7 milhões, quase 10 vezes mais que no período respectivo de 2023. Fechou 2023 com R$ 26,1 bilhões em receita.
Ainda, ano passado, a Embraer entregou um total de 181 jatos, sendo 64 foram aeronaves comerciais, 115 jatos executivos (74 leves e 41 médios) e 2 C-390 militares. As entregas da Embraer aumentaram 13% na comparação com os 160 jatos em 2022.
O valor de mercado da companhia superou os R$ 21 bilhões de reais, algo construído há mais de 50 anos na aposta da pesquisa, e desenvolvimento de tecnologias nacionais. Já falamos sobre a origem da empresa e de como ela possui ligações com o querido Instituto Tecnológico de Aeronáutica-ITA.
O CEO da Embraer, Francisco Gomes Neto, compartilhou em suas redes sociais: “tenho orgulho de dizer que 2023 foi um ano marcante para a Embraer. Ele representou o início de um novo ciclo para a empresa. Nossa atividade comercial se intensificou em todas as unidades de negócios, com sólida demanda nos principais mercados da empresa. Vamos comemorar os 55 anos da Embraer neste ano em ótima forma.”
A empresa é tão boa que a Boeing desejou comprá-la, porém, resistiu bravamente e continua pertencente, em essência, ao estado brasileiro.
Lembremo-nos que nossa coluna não é sobre mercado financeiro, mas sobre aviação. Assim, vamos nos debruçar sobre fatores que têm feito a Embraer demonstrar tanto valor ao mundo.
Excelentes aviões
A Embraer não cansa de demonstrar seu grande dom para fazer ótimos aviões e de todos os tipos. Já comentamos sobre como a Empresa é devotada a fazer o que faz com excelência e essa é uma das razões do sucesso da Embraer.
Da década de 90 para cá, quando a companhia foi privatizada (algo crucial para o crescimento da empresa), a companhia conseguiu emplacar, como um compositor de grandes hits, aviões atrás de aviões no mundo todo.
De aviões agrícolas a aeronaves militares, a Embraer fabrica e os fabrica muito bem. A Embraer de fato colhe o que plantou entre 2007 e 2017, quando gestou os programas Legacy 500 (atual Praetor), C-390 e 175 com ponta
Aviões comerciais
Podemos apontar a construção dos jatos comerciais Embraer-135 e 145 como de grande sucesso mundo a fora. O projeto começou a se desenvolver ainda nos 80 e foram construídas mais de 1.000 aeronaves, voando em mais de 36 países. As aeronaves são a base da aviação regional dos EUA voando em grandes companhias americanas como a American Eagle (subsidiária American Airlines) e United Express (United Airlines).
Logo após, no início dos anos 2000, o programa EJET culminou com mais de 1.700 aeronaves fabricadas até hoje e mais de 270 pedidos na carteira. Os EJETs que contam já com 1ª e 2ª gerações (E1 e E2) estão presentes em 49 países, demonstrando a robustez dos produtos.
Os E175 (1ª geração) para até 76 assentos são o 2º avião mais voado na American Airlines, maior empresa aérea norte-americana, atrás apenas do Boeing 737. A American Eagle voa mais de 100 aeronaves do tipo e, semana passada, confirmou pedidos firmes para mais 90 aeronaves E175, única que se enquadra em regras de peso e número de assentos máximos para aviação regional americanas: scope clause.
“O E175 é a verdadeira espinha dorsal da aviação regional dos Estados Unidos, conectando todos os cantos do país. O E175 é uma das aeronaves de maior sucesso do mundo e foi aperfeiçoado com uma série de modificações que melhoraram o consumo de combustível em 6,5%”, afirmou Arjan Meijer, Presidente e CEO da Embraer Aviação Comercial.”
Reportes da companhia brasileira já apontam para números que levam a crer que outro excelente avião começou a “pegar”. É que da geração 2 dos EJETs, o E2 195 cresceu bastante em entregas: “As entregas do E2 mais que dobraram e foram o destaque do ano, passando de 19 aeronaves entregues em 2022 para 39 em 2023.
A geração dos E2 teve o seu desenvolvimento feito em toda a década de 2010, com as primeiras aeronaves entregues em 2019. As aeronaves vieram com maior capacidade de passageiros (maiores), com motores muito mais eficientes (elevada razão de by-pass) e menos ruidosos e com eletrônicos de cabine (aviônicos) tão modernos quanto os da europeia Airbus.
Há mais de 189 pedidos de aeronaves do programa E2 para serem entregues. O resultado na unidade de aviação comercial é ainda melhor, segundo a Embraer: O backlog (pedidos em carteira) da unidade de negócios chegou a 298 aviões no 4T23 em um total de US$8,8 bilhões, uma alta de US$200 milhões na comparação anual.”
O E2 é voado no Brasil pela Azul Linhas Aéreas que já demonstrou ao mercado que, só em 2024, receberá mais de 14 novos E2-195, o maior do programa, com capacidade para até 136 aeronaves. A Azul já voa, pelo menos, 18 Embraer 195-E2.
Serão 31 até o final de 2024 segundo a Azul.
A EMBRAER demonstra o sucesso da aeronave em termos de custo por assentos:
“O E2 é a aeronave de corredor único mais eficiente em termos de combustível por assento, além de ter uma baixa emissão de ruídos. Tudo isso aliado ao conforto para os passageiros e a baixos custos de manutenção”
Fontes da companhia nos dão input que a aeronave 195-E2 será cada vez mais importantes para a Azul. Em Fortaleza e no Nordeste, por exemplo, pela sua menor capacidade de passageiros e menores custos de operação, já se vê com frequência o E2 substituir o poderoso Airbus 320-NEO em rotas nacionais, para Confins e para Campinas, por exemplo.
Um EJET em empresas como a Latam e Gol faria mais comuns rotas comerciais intra-nordeste, por exemplo. Lembrando que uma rota como Fortaleza e Maceió, descontinuada pela Latam, movimentava praticamente 120 passageiros por dia por trecho, números que mais que encheriam um E195 e fariam com que a ocupação média de um E2 fosse de quase 90%. Que falta faz!
O EJET salvou até aqui a rota Fortaleza-Juazeiro do Norte de deixar de operar desde abril de 2023, quando a Azul assumiu a rota, ou seja, o EJET é capaz de desenvolver muitos mercados.
Sobretudo o E2-195 já possui classe de assentos muito próxima a aviões Boeing e Airbus como o 737 Max 7 e o Airbus 319-Neo. O 1º está com atraso de entregas, o 2º não caiu no gosto dos clientes e têm pouquíssimas entregas realizadas, ao contrário do grande A320 NEO.
Assim, a Embraer encosta sim, nesse duopólio.
Aviões executivos
Outro pilar forte de aeronaves para a Embraer é o segmento de aeronaves executivas. A brasileira possui jatos executivos para 4 passageiros como o Phenom 100, até jatos médios baseados na própria frota dos EJETs como o Lineage 1000, para até 19 passageiros. O Lineage compartilha as dimensões e forma do Embraer 190.
Até aqui, o grande campeão de vendas mundo afora (acredite, jato executivo mais vendido do mundo) é o Embraer Phenom 300, bi jato leve mais vendido do mundo por 12 anos consecutivos. Falando de Embraer, estamos sempre falando de produtos diferenciados.
A Embraer é referência em construir aeronaves com menores custos associados e para o Phenom 300 não é diferente. Os menores custos associados são o segredo do modelo.
O sucesso do Phenom nos EUA é tão relevante que o modelo destronou jatos da poderosa americana Cessna como aeronaves mais voadas. Com mais de 2 milhões de horas de voo registradas, o Phenom 300 tornou-se recentemente o jato executivo mais voado nos Estados Unidos, com mais de 360 mil voos em um período de 12 meses. O Phenom 300, que tem capacidade para até 9 passageiros, ultrapassou o número de horas do Excelsior da Cessna.
O sucesso dos jatos executivos é tamanho nos EUA que há uma fábrica da Embraer nos EUA desde 2008 no estado da Flórida, cidade de Melbourne. Em 2016, uma nova linha de montagem foi inaugurada, permitindo a montagem de mais aeronaves executivas como as da linha Legacy, maior, com capacidade para até 12 passageiros.
Como resultado de avanços tecnológicos em aerodinâmica, desempenho (alcance e consumo), a Embraer lançou novos jatos plataformas oriundas das aeronaves Legacy.
Foram os Praetor 500 e 600, jatos com excelente alcance que passaram a permitir voos entre Nova Iorque e Londres, por exemplo.
Excelentes aeronaves militares
Ainda nos 1980, a Embraer se lançou no segmento de defesa. Lançou aeronaves militares como o jato AMX, projeto Brasil-Itália, e o excelente avião de manobras, Tucano, utilizado mundialmente como aeronave de ataque leve e treinamento.
A Academia da Força Aérea Brasileira forma seus pilotos em aeronaves como o T-27, Tucano.
Acreditem, o modelo foi primeiramente desenvolvido para a Força Aérea Inglesa pelos anos 1990. Da mesma forma, com a necessidade de desenvolver uma aeronave de ataque mais robusta para combater aeronaves ilícitas pelo Brasil, e que servisse de treinamento para jovens pilotos de caça, surgiu o Super Tucano, aeronave de ataque leve.
O A-29 Super Tucano é dito aeronave multimissão, presente em 16 Forças Aéreas ao redor do mundo, o que demonstra a confiabilidade da aeronave. São mais de 260 aeronaves produzidas: o produto de defesa (ainda) de maior sucesso da Embraer.
O Super Tucano é capaz de ser municiado com metralhadoras .50 com até 250 munições por arma, uma em cada semi-asa.
Além disso a aeronave pode ser carregada com bombas em geral, além de lançadores de foguetes.
Na Força Aérea Brasileira, a aeronave é presença em esquadrões de fronteira, atuando como interceptadores de aeronaves não-identificadas, geralmente ligadas a tráfico de drogas.
Comum ver vídeos pela internet de pequenas aeronaves invadindo espaço aéreo brasileiro e sendo interceptadas pelo A-29. Para garantir a segurança do espaço aéreo, a Aeronáutica tem o respaldo legal para derrubar aeronaves hostis ou suspeitas de tráfico de drogas.
C-390 Millennium (então KC-390)
A última joia projetada pela Embraer, pensando em segmento cargueiro militar, substituta para os C-130 Hércules, já com excelente reputação, aeronave reconhecida em várias partes do mundo.
A capacidade multimissão fornece às forças aéreas um desempenho da frota ideal gerado por alta disponibilidade. A aeronave foi projetada para operar em pista semipreparadas e ambientes de temperaturas extremas: desde a quente e úmida floresta amazônica, até o gélida Antártida.
A aeronave foi pensada para atender requisitos operacionais da Força Aérea Brasileira – FAB, priorizando transporte médio.
A aeronave consegue realizar abastecimento em voo de outros aviões, transporte e lançamento de cargas, busca e salvamento (SAR), apoio aeromédico com UTI, transporte de veículos médios e até combates florestais.
O C-390 pode ainda se valer de contramedidas eletrônicas que alterem a assinatura electromagnética ou acústica de um alvo, ou seja, que alterem o comportamento de detecção e seguimento de uma ameaça em aproximação (ex: míssil guiado) são designadas como medidas softkill.
A Força Aérea Brasileira já conta com até 8 C-390, além de exemplares vendidos à Hungria, Portugal, Áustria, República Tcheca e Holanda.
Já são 41 aeronaves com pedidos firmes. Em dezembro, a Embraer foi a vencedora em licitação pública da Coreia do Sul, que escolheu o C-390 para equipar a Força Aérea do país: 7º país a adotar a aeronave. É esperado um crescimento na unidade de negócios de defesa justamente por causa do C-390.
A percepção de quem toma conhecimento com o projeto do C-390 é de que é outro gol de placa da EMBRAER, de forma que, de fato a semeadura foi novamente de alta qualidade.
Pontos de atenção
Quem vive de fato próximo a Embraer chama a atenção para o fato de que, como a companhia não possui novos programas de aeronaves em lançamento, terá resultados ainda melhores nos próximos anos, devido a falta de novos investimentos: a empresa deverá faturar forte.
O outro lado da moeda é que faz mais de 10 anos que a Embraer não inicia novo programa de aeronaves:
1.E2 foi lançado em 2023,
2. C-390 em 2009
3. Legacy 500 em 2007
4. Phenom em 2005.
Como já escrevemos aqui, a Embraer perderá a concorrência para aeronave de até 19 assentos, bem como “perdeu” sua aviação turboélice de transporte como os lendários Bandeirante (Emb-110) e Brasília (Bem-120).