O trágico episódio envolvendo três adolescentes de 15 anos baleados por um colega dentro da escola onde estudavam, em Sobral, no norte do Ceará, é um daqueles casos que nos faz pensar onde erramos como sociedade. Por mais que saibamos todos os fatos ocorridos na manhã da última quarta-feira (5), compreender as circunstâncias do ocorrido não é nada trivial.
O que leva um jovem a cometer tal ato contra a vida de estudantes que conviviam com ele, todos da mesma idade? Qual o contexto familiar, considerando que o pai responde criminalmente por violência doméstica e familiar contra a mulher, desacato e furto, entre outros delitos? E como este mesmo pai tinha em casa uma arma de fogo registrada em nome de outra pessoa, um atirador esportivo?
Além da investigação criminal do caso, essas respostas envolvem análises sociológicas e psicológicas, abrangem os desafios atuais para segurança pública e a educação, dentre tantas outras esferas da vida em sociedade.
Objetivamente, fica o trauma para as vítimas e seus familiares. Para o infrator e sua família, há as consequências de um ato análogo à tentativa de homicídio, que é como a Polícia Civil apura o ocorrido.
Em depoimento, o adolescente que atentou contra os colegas premeditou o ato, segundo a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). Após os supostos episódios de bullying praticados pelas vítimas, o jovem entrou na escola com a arma, atirou e deixou a unidade de ensino. Ele já estava em casa quando foi apreendido por policiais do Comando de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (CPRaio), que também encontraram a pistola utilizada para ferir os colegas.
A responsabilização de adolescentes em conflito com a lei
Como se trata de uma infração cometida por um menor de 18 anos, o caso envolve o sistema socioeducativo e as formas de responsabilização dos adolescentes em conflito com a lei, explica a advogada Julianne Melo, presidente da Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-CE.
Ela explica que em casos assim, o jovem suspeito de cometer infração, depois de ser levado para a delegacia, onde é instaurada uma investigação preliminar, é submetido ao juiz da Infância e da Juventude. No caso, no juizado de Sobral.
Nesse primeiro momento tem a audiência de apresentação, em que o juiz decide sobre a internação provisória, que inicialmente é de 45 dias”
Caso seja responsabilizado pela infração análoga a crime violento, "ele vai entrar em cumprimento de medidas socioeducativas de internação por sentença”, revisadas a cada seis meses, mas que pode durar até que o jovem complete 21 anos, que “é a idade máxima para o cumprimento da medida socioeducativa”.
Julianne Melo ressalta ainda que o adolescente infrator é submetido ao Tribunal do Júri, procedimento para julgar crimes violentos contra a vida, mas apenas de crimes cometidos por adultos.
Quem mais pode ser responsabilizado
“Do ponto de vista cível, tanto a família do rapaz quanto o Estado podem responder em razão de ações ou omissões que culminaram nessa tragédia”, explica a advogada. “Especialmente o Estado, porque a situação ocorreu dentro da escola”, acrescenta.
Segundo ela, como o fato se deu em uma sala de aula da Escola de Ensino Médio de Tempo Integral Professora Carmosina Ferreira Gomes, a unidade de ensino pode ser responsabilizada caso fique evidente que “alguma falha de segurança, de segurança pública, que gerou esse incidente”.
Criminalmente, Julianne Melo aponta que o acesso do jovem à pistola pode levar à responsabilização da família ou do responsável, conforme a participação. “Ou pela falha na custódia da arma ou por uma participação mesmo, dependendo da relação dele com o adolescente, com o que ele sabia que o adolescente iria fazer”, conclui.
Estado de saúde das vítimas
Dos três adolescentes baleados, um deles segue internado em estado grave, de acordo com boletim médico divulgado na tarde desta sexta-feira (7) pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral. Ele está intubado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) desde a última quarta (5), após ser atingido na cabeça.
O jovem passa por exames "para se chegar ao diagnóstico final", informou o hospital. A equipe médica iniciou os exames obrigatórios para confirmar ou não a morte encefálica, quando há perda total e irreversível das funções cerebrais.
Outro adolescente foi atingido de raspão na nuca e voltou para casa ainda na quarta. O terceiro, alvejado na perna, recebeu alta hospitalar na quinta (6).
Comoção e repercussão do caso
Com a imediata repercussão do ocorrido, a governadora Izolda Cela se manifestou ainda na manhã de quarta-feira, lamentando a tragédia.
“Recebi com muita tristeza e preocupação o caso ocorrido na EEMTI Professora Carmosina Ferreira Gomes, em Sobral, onde três alunos foram baleados durante discussão entre estudantes na unidade de ensino. Determinei resposta rápida das nossas forças de segurança, inclusive sobre a origem da arma utilizada no crime", declarou Izolda Cela.
A Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) também se manifestou sobre o assunto em nota divulgada no início da mesma tarde. "A Seduc lamenta profundamente o ocorrido na EEMTI Profa. Carmosina Ferreira Gomes, em Sobral. E informa que, por meio da Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação (Crede) 6, adotou imediatamente as providências necessárias para socorro das vítimas e acionamento do trabalho policial".
O adolescente de 15 anos atingido na cabeça por um tiro disparado por um colega de escola dentro de sala de aula, em Sobral, permanece internado em estado grave, de acordo com novo boletim médico divulgado na tarde desta sexta-feira (7). Ele está intubado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) desde a última quarta (5).