Saudade da Fortaleza acesa em mim

Hoje, de tanto viajar pela janela, já desconheço algumas rotas

A saudade que sinto da cidade acesa e aberta a mim fez-me encontrar, entre janelas, ângulos tantos que me mostram os muitos mundos possíveis (ou não) virarem cenas em minha tela de vida. Paisagens que são verdadeiros espaços de existência, de experimentos. Ainda mais agora, em tempos de sucessivas quarentenas.  

Isolada na maior parte dos dias, quantas vezes fecho os olhos pra imaginar o Centro da Cidade de Fortaleza perder-se entre meus passos, e vice-versa. As praças com cenários que se fazem braços entregues a mim. Ruas e galerias que atravessam-me desde menina transformam meus horizontes a céus abertos.  

Descanso da saudade entre longas caminhadas que faço por avenidas como Bezerra de Menezes, Dom Manuel e Heráclito Graça. Ora estou a pé, ora dirijo entre uma e outra viela que nasce feito becos de resistência. Desconheço um e outro muro pintado, bodega refeita, e percebo a falta de um ou outro telefone público escasso aqui e ali. 

Dia desses, peguei um ônibus e vaguei entre três terminais que me levaram a bairros que, há tempos, fazem parte do itinerário de minhas memórias: Mondubim, Siqueira, Parangaba e Benfica. Logo, abri os olhos para reencontrar-me com a paisagem de casa. De dentro. 

Ando sentindo falta de painéis grafitados com corpos-imagens e frases de amor e protesto (tudo é revolução) que me emocionaram no meio das ruas. A moça deitada no mar já não mais está na Duque de Caxias e Greta Thunberg - com ares de xilogravura - agora são (apenas?) marcas de para sempre mim.

Hoje, de tanto viajar pela janela, já desconheço algumas rotas, pois andei sabendo de ruas invertidas, semáforos trocados, calçadas ocupadas, asfaltos coloridos, que agora erguem aos passantes novos trajetos. Não sei mais o quanto sei dos meus próprios caminhos. 

De longe, mantenho na mente-memória os rascunhos dos passos tantas vezes ensaiados até os meus variados rumos, como a Praça da Estação, a Igreja do Rosário, a eterna feira dos livros ou a imortal Galeria Pedro Jorge. São inenarráveis, e também incontáveis, os destinos das minhas saudades. Em alguns, cheguei porque me perdi. Em outros, vou - para sempre - apenas encontrar-me.