Por que o preço da gasolina subiu R$ 0,79 em duas semanas em Fortaleza? Procon registra reclamações

Valor do litro da gasolina passou de R$ 5,19 para R$ 5,98; Órgãos de defesa do consumidor acompanham situação

O preço da gasolina em Fortaleza subiu R$ 0,79 em duas semanas, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). O aumento é desproporcional ao retorno dos impostos federais (PIS/Cofins) - de cerca de R$ 0,34 - das últimas semanas. 

No período de 2 a 8 de julho, o litro do combustível sofreu um aumento médio de R$ 0,63, saltando de R$ 5,35 para R$ 5,98, mais de 12%. 

Os números ficam ainda mais discrepantes quando são analisados os dados de duas semanas atrás. Entre 17 e 23 de junho, a média da gasolina comum em Fortaleza foi de R$ 5,19 - o valor mais baixo do ano na Capital. Entre 24 de junho e 1º de junho, o aumento foi para R$ 5,35, até saltar para a atual média semanal de R$ 5,98 - o maior preço de 2023.

Os números colocam Fortaleza como a capital do Nordeste com o valor mais caro de gasolina comum e a 5ª do Brasil. A cidade cearense fica atrás apenas de Rio Branco (R$ 6,30), Manaus (R$ 6,28), Porto Velho (R$ 6,24) e Palmas (R$ 6,03), todas da Região Norte e com o maior preço do combustível nos postos.

A média também muda a perspectiva no que diz respeito à média nacional. No mesmo período, o valor do combustível nos postos de todo o Brasil subiu R$ 0,31, colocando Fortaleza com um aumento de 103% na comparação com o País. A ANP pesquisou os preços em 45 postos da cidade, com variação entre R$ 5,89 e R$ 5,99 o litro do produto. 

Confira a evolução do preço da gasolina comum em Fortaleza em 15 dias:

  • 17 - 23 de junho: R$ 5,19
  • 24 de junho - 1º de julho: R$ 5,35
  • 2 - 8 de julho: R$ 5,98

Mas que razões foram determinantes para o aumento significativo em Fortaleza em um curto espaço de tempo? O Diário do Nordeste ouviu especialistas em direito do consumidor e representantes de postos de combustível para entender.

RETOMADA DE IMPOSTOS FEDERAIS E ALTERAÇÃO NO ICMS

Os especialistas ouvidos pela reportagem foram unânimes em determinar que o aumento do preço da gasolina comum está diretamente atrelado com o retorno da cobrança de PIS/Cofins, impostos federais.

Ambos os tributos foram retirados pelo governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo semestre de 2022 e retomados em junho pela gestão Lula (PT). Com isso, a expectativa de órgãos especializados era de que o combustível aumentasse em torno de R$ 0,34 durante o mês de junho.

Além disso, a mudança do ICMS, com padronização de R$ 1,22 por cada estado na cobrança da gasolina comum, também era outro fator preponderante. No caso do Ceará, o reajuste foi de R$ 0,08, uma vez que o imposto cobrado era de R$ 1,14. 

Mesmo com os aumentos, a Petrobras repassou uma redução de 5,3% (R$ 0,14 por litro) no combustível nas suas refinarias, suavizando a alta. O valor excedente para completar os R$ 0,63 de aumento de uma semana, no entanto, passa por outros fatores.

AJUSTE DE LUCRO E PREÇO EM REFINARIAS PRIVADAS

Para além da justificativa tributária, as fontes ouvidas pelo Diário do Nordeste usam outras questões para explicar o aumento do combustível.

Em nota, o Sindipostos-CE (Sindicato dos Postos do Ceará) informou que o aumento era esperado, e os preços fazem parte da prática do livre mercado, em que cada distribuidor marca os preços de acordo com os custos e concorrência.

Ainda segundo o Sindipostos-CE, mesmo com a Petrobras sendo a maior fornecedora da gasolina comum para o Ceará, o combustível que chega ao Estado vem, em parte, de refinarias privadas no Norte e Nordeste do País, regiões que estão entre os preços mais altos do Brasil.

"O mercado é abastecido por diversas fontes, dentre elas a Petrobras. Salientamos que a estatal é o maior e mais importante fornecedor, mas, no caso do nosso estado, entre 35% e 40% vêm do exterior. As refinarias de Manaus, Bahia e Rio Grande do Norte são privadas. Diante disso a variação e preços é explicada por um mercado livre com diversidade de fornecedores fazendo com que o sobe e desce independam de preços da Petrobras", informou o sindicato.

Na visão de Carla Ferreira, pesquisadora do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), no entanto, o motivo mais plausível para a alta significativa foi o reajuste no lucro feito por distribuidoras e postos. Segundo ela, não há aumento nos custos de refino, tampouco em outros componentes da gasolina comum.

"A partir dos dados de preços praticados nas refinarias, tanto do sistema Petrobras quanto a refinaria baiana privatizada (Acelen), não é possível inferir que o incremento adicional tenha sido ocasionado por aumento de preços no refino, assim como não foi verificada alteração significativa nos preços do etanol anidro (que entra na composição da gasolina) que justificasse o impacto. Desta forma, o que parece ter contribuído de forma adicional para a elevação do preço foi uma possível recuperação de margens de lucro das distribuidoras e dos postos revendedores locais", ressalta a pesquisadora.

DIREITOS DO CONSUMIDOR E FISCALIZAÇÃO

O aumento de R$ 0,79 no valor da gasolina comum em duas semanas vem sendo acompanhado de perto por órgãos de defesa do consumidor. O presidente da Acedecon (Associação Cearense de Defesa do Consumidor), Thiago Fujita, diz que é necessário que o consumidor denuncie, junto a órgãos de defesa, caso sinta que a alta possa ser enquadra nos chamados preços abusivos. 

"O aumento está bem acima do valor impactado pelos tributos, então os órgãos de fiscalização têm condições de verificar se há um aumento de preços fora do aumento de custos para os postos. (...) Caso o posto não comprove qual foi a justificativa para o aumento de preços, para a proporção desses R$ 0,63, ele poderá ser autuado pelos órgãos de defesa do consumidor em uma possível fiscalização", aponta Fujita.

Em nota, o Procon Fortaleza revelou que tem recebido reclamações de consumidores em virtude dos chamados preços abusivos praticados pelos postos.

Ainda segundo o Procon, "o Código de Defesa do Consumidor proíbe a elevação de preços sem justa causa. Segundo o órgão, identificar abusividade nos preços não é uma tarefa fácil, pois é preciso reunir uma vasta documentação, como notas fiscais de compra e de venda para analisar cada denúncia. Caso seja identificada a elevação de preços sem justa causa, os estabelecimentos podem sofrer diversas penalidades, como interdição do local e multa que passa dos R$ 16 milhões".