Quinze entidades nacionais de comércio, indústria, consumo e varejo divulgaram nessa quinta-feira (19) um manifesto sobre o crescimento das apostas eletrônicas e consequências sociais, econômicas e de saúde pública apontadas por esses setores.
As entidades signatárias dizem que passarão a atuar de forma conjunta para promover regulamentação à comunicação publicitária e patrocínios, bem como impedir de forma imediata o uso do cartão de crédito para pagamento das apostas, o que só ocorreria em 2025 pela legislação aprovada.
O documento afirma que há um aumento exponencial do faturamento dessas apostas, que, para os setores representados no texto, tem atraído recursos da população, especialmente das classes mais baixas, o que geraria comportamento compulsivo. O manifesto diz ainda que há, inclusive, uso de recursos dos programas sociais, como o Bolsa Família, com redução do consumo até de alimentos.
Os signatários também intentam impor responsabilidade às empresas de apostas para que se tornem corresponsáveis por tratamentos envolvendo saúde mental causados pelo vício com jogos nessas modalidades, bem como rever a tributação prevista na lei 14 790/2023, de modo que ela seja maior na operação de apostas online, tanto para a empresa de apostas, quanto para o apostador.
Impactos no consumo do brasileiro
O manifesto foi divulgado ao fim do Latam Retail Show, evento organizado pela consultoria Gouvêa Ecosystem. Um estudo da Mosaiclab divulgado no primeiro dia do evento, porém, mostrou que as empresas de apostas virtuais não são a única razão para frear o consumo no País.
Para 63% dos brasileiros, os gastos com alimentação são os mais pesados em seu orçamento, seguidos por energia elétrica (50%), água (34%) e impostos (34%). Os gastos com jogos e apostas aparecem na lista com 9% dos pesquisados apontando esse fator como pressão de renda.
Ainda segundo a pesquisa, os gastos com jogos e apostas aparecem impactando todos os perfis com ênfase maior na Classe A, que tem maior renda disponível para gastos extras além do consumo básico.
A sócia diretora da Mosaiclab, Karen Cavalcanti, explica que há uma teia de mudanças nos hábitos dos consumidores e que, apesar do crescimento das apostas, para as classes mais baixas, a inflação de alimentos ainda é o mais pesado — para 55% dos pesquisados das classes D e E — enquanto 9% indicam as apostas.
Quem assina o manifesto?
Assinam o documento:
- Associação Brasileira de Franchising (ABF);
- Associação Brasileira da Indústria de Equipamentos e Serviços para o Varejo (Abiesv);
- Associação Brasileira das Indústrias Ópticas (Abióptica);
- Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT);
- Associação Brasileira de Marcas Próprias e Terceirização (Abmapro);
- Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel);
- Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX);
- Associação Brasileira de Empresas de Vendas Diretas (ABEVD);
- Associação Brasileira de Tecnologia para o Comércio e Serviços (Afrac);
- Associação Nacional de Restaurantes (ANR);
- Associação Brasileira de Strip Malls (Abmalls);
- Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB);
- Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL);
- Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV);
- Instituto Foodservice Brasil (IFB).
Leia a íntegra do manifesto
"As entidades nacionais que assinam este Manifesto representam os mais importantes setores ligados ao consumo, comércio e varejo do Brasil, os maiores empregadores privados do país, e não podem se omitir ante o crescimento dos jogos e de tudo que está relacionado aos seus mecanismos, conhecidos como 'Bets' ou jogos de apostas eletrônicas.
Eis os principais pontos para reflexão e ação:
1. Essas modalidades de jogos estão crescendo seu faturamento de forma exponencial, atraindo recursos da população de diversos segmentos e faixas etárias, mas de forma mais marcante nas classes mais baixas e entre os mais jovens, redirecionando renda destinada ao consumo pessoal, inclusive de alimentos;
2. Esse crescimento também tem desviado recursos direcionados pelos programas Bolsa Família/Auxílio Brasil para as famílias mais carentes, originalmente destinados às condições mínimas de sustentação familiar;
3. O crescimento exponencial dos jogos e apostas traz consequências sérias para famílias e indivíduos, pela componente viciante, criando transtornos mentais e físicos e gerando problemas psicossociais que vão sobrecarregar o já sobrecarregado sistema público de saúde;
4. O crescimento descontrolado das 'Bets' gera vício e amplia o vínculo com jogos de azar, promovendo comportamento compulsivo, especialmente entre os mais jovens e vulneráveis emocionalmente, com graves implicações psicológicas devido ao aumento do endividamento dos apostadores e suas famílias;
5. O cenário atual já mostra a deterioração das relações pessoais e emocionais com empregadores públicos e privados, que precisam atuar para dar apoio ao crescente número de casos crônicos que afetam o desempenho profissional, em um processo em visível escalada.
Por essas e outras razões, as entidades signatárias se integram e passam a atuar de forma conjunta para:
a. Promover uma maior e mais ampla sensibilização sobre o potencial de problemas sociais que advirão dessa expansão;
b. Regulamentar a comunicação publicitária, patrocínios e outras modalidades convencionais ou digitais de estímulo às apostas;
c. Impedir, de forma imediata, o uso do cartão de crédito para pagamento das apostas, o que só ocorreria em 2025 pela legislação aprovada;
d. Impor responsabilidade às empresas de apostas para que se tornem co-responsáveis pelos tratamentos envolvendo saúde mental causados pelo vício em jogos nessas modalidades;
e. Rever a tributação prevista na lei 14.790/2023, de modo que ela seja mais gravosa na operação de apostas online, tanto para as empresas de apostas quanto para os apostadores.
Existem circunstâncias em que é preciso ir contra a correnteza representada pelo amplo engajamento em prol das apostas eletrônicas, levando em conta o que é mais importante, saudável e responsável em prol da nação."