Cerca de 40% dos idosos que vivem em abrigos foram contaminados pela Covid-19, no Ceará

Também foram registrados 68 óbitos causados pelo novo coronavírus em lares de longa permanência no Estado.

Pelo menos 671 idosos foram contaminados pelo novo coronavírus dentro das instituições de longa permanência no Ceará. O número de infectados representa 40.8% dos 1.644 anciãos que vivem nesses lares em todo o Estado. Os dados, coletados até quarta-feira (7), foram fornecidos pelo Ministério Público do Ceará (MPCE).

Ainda de acordo com o MPCE, já foram contabilizados 603 idosos recuperados e 68 óbitos em decorrência da Covid-19 nas Instituições de Longa Permanência (ILPIs) cearenses. Outras 38 mortes continuam em investigação.  

Para o coordenador da área do idoso do Grupo Especial de Combate à Pandemia do Novo Coronavírus do MPCE, o promotor de Justiça Hugo Porto, o número foi abaixo do esperado. “Na verdade a gente teve, aqui no Ceará, uma incidência muito importante, muito elevada, e as ILPIs são residências que abrigam pessoas que estão nesse grupo de risco. Os números foram, para a quantidade de recursos e de protocolos, menores do que a gente esperava”, aponta.

O resultado, segundo o promotor, vem da corrente de parceria entre Estado do Ceará, Conselho Regional da Pessoa Idoso, as secretarias de saúde municipais e estadual. “Isso criou uma rede de apoio onde os protocolos foram cumpridos, desde o começo foram solicitados a produção de planos de contingência, com protocolos bem definidos vindos do poder público e também da sociedade civil e do próprio voluntariado. A gente sabe que ninguém faz nada só, e a gente precisa dessa ação articulada”, explica.  

Com a baixa no número de casos nas ILPIs, seguindo a curva móvel do Estado, o MPCE já pensa em iniciar o plano de flexibilização para visitas nesses locais. “Na sexta-feira (9) nos sentamos com a Secretaria de Saúde do Estado (Sesa), com a Secretaria de Saúde do Município, com as próprias ILPIs em representação, para começarmos a discutir um plano de flexibilização condizente com a fragilidade do momento e também contando que trata-se de um grupo de risco”, conta. A principal motivação para a ação, é a falta que os idosos têm sentido desse contato, por quase sete meses.

“A gente sabe que já é um prazo que os idosos estão sem ter o contato físico com seus parentes, seus entes queridos, e a gente compreende que essa abertura seja oportuna, desde que seja cuidadosa e prudente, seguindo todas as normas técnicas”, enfatiza o promotor Hugo Porto. 

Para a coordenadora da Casa de Amparo ao Idoso Lar Três Irmãs, Thaynara Almeida, o contato com os entes queridos é o que tem feito mais falta aos idosos. “No início foi muito difícil adaptar essa rotina para eles e foi muito difícil a aceitação deles, ainda hoje eles sentem muita falta das visitas, do contato, do calor humano”, conta. “Está se aproximando o período festivo, de confraternização, então vai ser muito gratificante  receberem algum tipo de visita. Claro, com todo o cuidado, com todo o protocolo de segurança possível, para poupar a saúde deles. Eu acho um momento importante e creio eu, que logo poderá ser realizado”. 

Impacto

O Lar Três Irmãs, localizado no Montese, em Fortaleza, apesar de ter começado as restrições para conter a disseminação da Covid-19 antes do decreto do Governo do Estado, ainda teve perdas. A instituição que abrigava 32 idosos no início da pandemia, hoje abriga 28, e registrou 23 contaminados, quatro óbitos e apenas cinco idosos não tiveram contato com o vírus. 

“A Covid veio de supetão para todo mundo, e para gente, de uma forma mais intensa por sermos o grupo de risco. Então todos os nossos idosos estavam expostos. Quando começou a pandemia, antes mesmo do decreto a gente já teve a precaução de cancelar as visitas, o decreto veio para fortalecer isso, mas infelizmente nós não tivemos como fugir do vírus”, conta Thaynara. 

Além disso, mesmo os idosos recuperados, ainda sentem os efeitos da doença. “Estamos com quatro meses do auge da infecção na instituição, e percebemos que alguns dos infectados ainda não se recuperaram 100% do quadro. Não possuem mais o vírus no corpo, mas [por exemplo] aqueles que possuem demência, a gente percebeu um avanço na demência, uma maior debilitação, uma maior necessidade de ajuda. Alguns pós Covid tiveram pneumonia, tiveram gripe um pouco mais forte, [isso] por conta da fragilidade dos pulmões”, explica. 

Em Fortaleza, as 20 instituições ativas contemplm 666 idosos. Até o dia dois de outubro, a capital registrou 265 recuperados e total de 36 óbitos confirmados por Covid-19, outros 23 são suspeitos. Em dados atualizados da última semana, todas as instituições responderam e registram somente um caso suspeito e 27 confirmados.

Lembrança de quem se foi

Dona Iete Sales, de 85 anos, está entre os idosos que pedeu a batalha para o novo coronavírus. A professora Tacivanda Sampaio, 55, ainda lida com a saudade da tia de seu esposo, Kleber, 56. “Todo dia ela ajeitava o cabelo, só vivia arrumada. Podia ser na hora que fosse, fazendo faxina. Jurava que ia para algum lugar”, relembra. 

Após colocá-la em um lar para idosos em Caucaia, familiares combinaram de estar presentes apesar dessa distância. No entanto, as visitas semanais foram suspensas com a pandemia da Covid-19. “Foi tudo muito rápido”, comenta Tacivanda. A alegre idosa morreu em maio e, para evitar o contágio da doença, os familiares não tiveram condições para uma despedida. 

“A maior perda foi saber que a gente não viu. Pegou o corpo confiando na palavra do hospital. Foi tudo em questão de uma hora e o sepultamento”, relembra. Na época, sentiu uma sensação “esquisita” por isso, a sensação da falta do adeus.

Apesar da despedida em outros moldes, Tacivania tenta focar em todas as coisas boas e vivências compartilhadas por mais de 32 anos. “A gente sente muita falta, sempre está compartilhando foto, sempre está falando dela. A perda em si é meio complicada, mas a gente mantém a lembrança”, finaliza.